A Fábula do Lobo-guará e as Crianças
Em tempos antigos, quando os ventos ainda sussurravam segredos aos ouvidos atentos da mata, duas crianças da Aldeia Natiá — o menino Awbirã e sua irmã Anawí — partiram pela trilha da roça em busca de seu pai. Ambos eram inghéá, espíritos novos, curiosos e cheios de perguntas para o mundo.
Caminhavam entre árvores altas da Mata Atlântica, onde os cantos dos pássaros dançavam com o som do vento, quando, de repente, um ser de pelos avermelhados surgiu diante deles. Era o Guará, com seus longos membros e olhar manso.
Anawí, com os olhos arregalados e lembranças da escola na mente, perguntou sem medo:
— O senhor é o Lobo Mau? Aquele que come criancinhas, como na história que a professora contou?
O Guará sorriu com o canto da boca e respondeu com voz tranquila:
— Não, pequenos inghéá. Eu não sou o Lobo Mau. Sou o Lobo-guará, guardião desta terra que chamam de Brasil. Diferente do lobo das histórias da Europa, eu não como crianças. Na verdade, somos da mesma família, mas não do mesmo gênero.
Curioso, o menino Awbirã quis saber mais:
— E o senhor se alimenta de quê?
— Sou onívoro, respondeu o Guará com orgulho. Como pequenos mamíferos, aves, répteis, insetos e frutas como a lobeira, que adoro. Já o lobo da Europa é carnívoro, e caça alces, veados e javalis. Mas nenhum de nós, nem aqui nem lá, tem humanos no cardápio.
As crianças riram aliviadas. Mas o Guará, com sua sabedoria ancestral, fez um alerta:
— Mesmo que eu não represente perigo, a floresta é cheia de seres mais perigosos, como as onças e as serpentes venenosas. Crianças não devem andar sozinhas por estas trilhas. A mata é bela, mas exige respeito. Voltem sempre com seus pais.
Com um aceno de cauda e passos leves como o vento, o Guará desapareceu entre as folhas.
Awbirã e Anawí voltaram para casa com uma nova história para contar — uma história de verdade, onde o “lobo” era amigo, sábio e filho da terra como eles.
Moral da fábula: Nem tudo que aprendemos nos livros é igual em todas as partes do mundo. O saber da floresta ensina com respeito, convivência e verdade.
Autor: Nhenety Kariri-Xocó

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