A Fábula dos Peixes da Defesa e Fartura
Nas águas tranquilas do rio, onde as raízes das árvores mergulham para beber da correnteza, vivia o Acari, também chamado Cascudo. Ele passava os dias grudado nas pedras, protegido por sua couraça dura como lixa. Silencioso e paciente, acreditava que a vida era sobreviver aos perigos escondendo-se e defendendo-se.
— “Nada é mais sábio do que resistir. Quem se protege, vive.” — murmurava o Acari, enquanto raspava o fundo do rio em busca de alimento.
Mais acima, na luz do sol que entrava pelas águas claras, nadava a Manjuba. Ela nunca estava sozinha, sempre acompanhada de milhares de irmãs que cintilavam como fios dourados. Saltitante, acreditava que a vida era multiplicar-se e espalhar fartura para todos os seres.
— “Nada é mais sábio do que compartilhar. Quem se multiplica, sustenta a vida.” — dizia a Manjuba, dançando com seu cardume.
O Acari olhava para aquele movimento e balançava a cabeça:
— “Vocês se expõem demais. Vão servir de banquete para os grandes peixes e para as aves do rio.”
A Manjuba respondia rindo:
— “E você se esconde demais. Sua couraça protege o corpo, mas não alimenta ninguém. O rio precisa de abundância.”
Certo dia, após a primeira chuva forte, o rio encheu-se de vida. As aves mergulhavam, os peixes maiores caçavam, e a correnteza arrastava ovos e filhotes. Foi então que Acari e Manjuba compreenderam algo importante.
O Acari, mesmo protegido, via que sua força sozinha não sustentaria o rio. Já a Manjuba, mesmo em grande número, percebia que sua fartura não teria sentido se não houvesse quem resistisse e mantivesse o equilíbrio.
Assim, os dois peixes aprenderam a se respeitar. Um representava a defesa que garante a sobrevivência, o outro a abundância que garante a continuidade da vida.
Moral da fábula
Na grande correnteza da existência, há quem viva para resistir e há quem viva para multiplicar. A vida precisa tanto da força da defesa quanto da fartura da abundância.
Autor: Nhenety Kariri-Xocó
ACARI E MANJUBA: O Peixe da Defesa e o da Abundância
(versão em sextilhas de cordel)
No leito do rio sereno,
Morava o peixe Acari,
Coberto de couraçada,
Sempre calmo por ali.
Dizia em sua firmeza:
“Me protejo para existir.”
Lá nas águas mais de cima,
Brincava a leve Manjuba,
Saltando em cardume grande,
Na corrente que desluba.
“Compartilho vida e fartura,
Sou alegria da tuba.”
O Acari então falava:
“Vocês vivem se arriscando,
São presas de aves e peixes,
O perigo vai chegando.
Quem não tem defesa forte
Morre cedo se entregando.”
Mas a Manjuba sorria:
“Meu sentido é repartir,
Faço a festa da fartura,
Dou sustento pra existir.
Se me falta a multidão,
Não há rio pra fluir.”
Quando a chuva desce forte
E a piracema começa,
Cada um viu seu caminho
Ter valor na natureza.
O que resiste sustenta,
O que abunda é a riqueza.
Assim a vida mostrou
Na lição da correnteza:
É preciso defender,
É preciso a fortaleza.
Mas também multiplicar,
Pois fartura é a certeza.
Moral em cordel
Na corrente do viver,
Um defende, o outro dá,
A vida se equilibra
Se um ao outro completar.
Autor: Nhenety Kariri-Xocó
Nenhum comentário:
Postar um comentário