domingo, 24 de agosto de 2025

GURIATÃ E MATINTAPERÊ, O Semeador e o Avisador






A Fábula das Aves Semeadora e a Anunciadora


No coração da mata, entre folhas verdes e frutos maduros, vivia o Guriatã, conhecido por Vim-vim pequenino e colorido. Seu peito dourado e seu dorso azul-escuro refletiam a alegria da floresta. Ele passava os dias levando sementes de um lado a outro, ajudando a terra a se renovar. Onde pousava, nascia esperança.


Mas ao cair da tarde, quando o sol se escondia e os ventos sopravam frios, ecoava o canto do Matintaperê, conhecido por Peitica. Seu som longo e misterioso fazia os animais se encolherem, pois todos diziam:

— “É o aviso dos espíritos, é o mensageiro do além.”


Um dia, os dois se encontraram no galho de uma samaumeira. O Guriatã, curioso, perguntou:

— “Por que cantas sempre trazendo medo? Teu canto não ajuda a floresta como o meu.”


O Matintaperê respondeu com voz grave:

— “Meu irmão pequeno, tu espalhas sementes na terra, mas eu espalho lembranças no coração. Meu canto não é só de medo, é aviso. Lembro aos vivos que a vida é breve e que devem caminhar com respeito, pois o mundo dos espíritos sempre está por perto.”


O Guriatã baixou os olhos e pensou. Depois, sorriu:

— “Então somos diferentes, mas necessários. Eu ensino a terra a renascer, e tu ensinas o coração a respeitar o invisível.”


Naquele instante, os dois cantaram juntos. O trinado alegre do Guriatã se misturou ao assobio profundo do Matintaperê, e a floresta inteira ouviu uma melodia nova — feita de vida e mistério, de sementes e espíritos.


E assim, desde esse dia, quem escuta com atenção entende que nenhum canto é em vão: na mata, tanto o Guriatã quanto o Matintaperê têm seu lugar.


👉 Essa fábula traz a mensagem do equilíbrio entre vida e morte, matéria e espírito, luz e sombra — ambos necessários para a harmonia do mundo.




Autor: Nhenety Kariri-Xocó 



GURIATÃ E MATINTAPERÊ, O Semeador e o Avisador

( Versão em Cordel  )


Na mata verde e sagrada

Brilhou o canto primeiro,

Do Guriatã dourado,

Pequenino e verdadeiro.

Leva a semente na asa,

Fazendo a vida em sua casa,

Semeador do mundo inteiro.


Mas quando a noite chegava

Com o vento a sussurrar,

O Matintaperê cantava

Seu aviso no ar.

Assobio de mistério,

Canto antigo e etéreo,

Que faz a alma escutar.


O pássaro pequenino

Perguntou sem hesitar:

— “Por que teu canto, vizinho,

Só faz o medo brotar?

Minha voz traz esperança,

Mas tua voz sem bonança

Só faz o bicho chorar.”


Respondeu o Avisador:

— “Eu não canto por maldade,

Sou lembrança do temor,

Sou aviso da verdade.

Tua semente é o caminho,

Mas sem o canto mesquinho,

Não há respeito à eternidade.”


Assim na mesma canção

Se uniram noite e dia,

Um levando a renovação,

Outro trazendo a vigia.

Na floresta encantada,

A vida é sempre ensinada

Entre a dor e a alegria.


👉 Esse cordel sintetiza a fábula em versos, para ser contado em roda, cantado ou declamado.



Autor: Nhenety Kariri-Xocó 





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