sexta-feira, 22 de agosto de 2025

GÛYRÁ PÛRA PORANG, Aves de canto bonito






A Fábula das Aves de Cantos Bonitos


Conta-se que, em um tempo antigo, quando os homens ainda aprendiam a ouvir a voz da mata, os pássaros se reuniram para decidir qual seria o canto que guiaria o coração dos povos.


No alto de uma árvore de copa larga, pousou o Sabiá-laranjeira. Seu peito avermelhado brilhava ao sol, e sua voz ecoou doce e compassada:

— “Sou aquele que reza muito. Trago a melodia da esperança e da primavera. Quando canto, a terra floresce, e os homens se lembram de que o amor renasce a cada amanhecer.”

Os outros pássaros se emocionaram, pois seu canto parecia uma oração.


Logo depois, chegou o pequeno Curió, que se aproximou sem medo.

— “Sou amigo do homem, mensageiro da tradição. Minha voz é memória e sinal da natureza. Nas aldeias, sempre estive perto, lembrando aos povos que o espírito da floresta fala através de mim.”

Seu canto, breve e firme, parecia guardar segredos antigos.


Do outro lado, o Pitiguari interrompeu com sua voz insistente, repetindo como um tambor:

— “Gente-de-fora-vem! Gente-de-fora-vem!”

E completou:

— “Sou o guardião da mata. Aviso perigos, anuncio presenças. Onde estou, ninguém é pego de surpresa. Sou o vigia que não se cansa.”

Os pássaros concordaram que, sem ele, a floresta estaria vulnerável.


Quando o sol já se punha, o Azulão surgiu. Suas penas, da cor do céu profundo, fizeram silêncio entre todos.

— “Trago o vigor e a liberdade. Sou a alegria que voa e canta mesmo na prisão. Minha voz é a força que anuncia um novo começo, como o azul que desponta depois da tempestade.”

Seu canto encheu o ar de energia e esperança.


Por fim, com passos firmes e a cabeça coroada de vermelho, chegou o Cardeal-do-nordeste.

— “Sou a coragem e a bravura. Minha voz é como a de um líder que anima seu povo. Onde minha canção ecoa, o coração do guerreiro desperta.”

E sua melodia, forte e cadenciada, soou como o chamado para a luta e para a vida.


Os pássaros então perceberam que nenhum canto era maior que o outro. Cada voz trazia um dom: oração, memória, aviso, vigor e coragem. E assim decidiram:

— “A floresta será guiada por todos nós. Juntos, nossos cantos serão o coração do mundo.”


Desde então, quando o homem entra na mata e escuta a diversidade dos pássaros, aprende que cada voz carrega um ensinamento — esperança, tradição, vigilância, alegria e coragem.

E quem souber ouvir os cantos da floresta, jamais se perderá no caminho da vida.



Autor: Nhenety Kariri-Xocó 



A fábula em Versão de Cordel no formato clássico de sextilhas (estrofes de 6 versos, rimando preferencialmente em ABABCC ou ABABAB, típicas do cordel nordestino).


GÛYRÁ PÛRA PORANG, Aves de canto bonito



Na mata que é encantada,

Reuniu-se a passarada,

Cada ave com sua voz,

Queria ser escolhida,

Pra guiar na própria lida

Os caminhos de todos nós.


O sabiá-laranjeira,

Cantou como uma prece,

Seu canto trouxe esperança,

Na primavera florida,

Recorda a força da vida

Que a natureza enaltece.


O curió pequenino,

Com voz firme anunciou:

“Sou memória e tradição,

Sou amigo verdadeiro,

Carrego no meu canteiro

A lembrança da criação.”


O pitiguari vigia,

Com voz forte a repetir:

“Sou guardião da floresta,

Aviso o povo da aldeia,

Que a mata é sempre cheia

De segredos a ouvir.”


O azulão orgulhoso,

Com vigor se apresentou:

“Mesmo preso eu sou livre,

Canto alto e sem prisão,

Sou símbolo de emoção,

De alegria e de amor.”


O cardeal corajoso,

De vermelho coroado,

Cantou firme como um guia:

“Sou a força e a bravura,

Minha voz é voz segura,

Sou guerreiro consagrado.”


No fim todos entenderam:

Cada um tem seu valor.

Oração, coragem e aviso,

Alegria e tradição,

Se unem numa canção

Que nasce do mesmo amor.


🌿✨ Assim a fábula em sextilhas ganha o ritmo tradicional do cordel nordestino, pronto para ser contado, declamado ou até musicado.



Autor: Nhenety Kariri-Xocó 





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