A Fábula das Aves da Mata e da Caatinga
Na beira da mata, onde a floresta abraça a caatinga, vivia o Zabelê, ave de canto forte, guardião dos segredos escondidos entre as árvores. Seu nome vinha de tempos antigos, e muitos diziam que significava “pássaro de canto poderoso”. Orgulhava-se de sua voz que ecoava em três ou quatro notas, sempre descendo e subindo como se fosse o sopro do vento chamando pela chuva.
O Zabelê era discreto, sua cauda parecia sempre oculta, como se fosse feito para viver nos mistérios da mata. Alimentava-se de sementes, frutos e insetos, mas o que mais prezava era a liberdade de caminhar entre árvores altas e sombras frescas. Tinha muitas companheiras, e isso fazia com que fosse vaidoso de sua natureza, acreditando ser o mais importante das aves da região.
Não muito longe dali, no chão aberto entre os arbustos da caatinga, vivia o Paruru, a rolinha-fogo-apagou. Pequena e ligeira, com penas escamadas que lembravam brasas que se apagavam na madrugada, ela era simples, mas cheia de coragem. Sempre voava em pares ou pequenos grupos, porque acreditava que a vida era melhor quando se partilhava o caminho.
O Paruru era chamado por muitos nomes: fogo-apagou, rolinha-cascavel, picuí-pinima... mas ele gostava mesmo era de ser chamado de Paruru, “a ave pardacenta”, porque era assim que o povo da terra o reconhecia.
Certa manhã, o Zabelê desceu para beber água num pequeno olho d’água que também servia ao Paruru. Ao ver a ave menor, o Zabelê riu com certo desdém:
— “Ó pequena ave cinzenta, como podes viver tão contente na caatinga seca, sem o canto forte que faz estremecer as árvores? Meu piado faz ecoar os vales, enquanto o teu voo se esconde entre galhos baixos.”
O Paruru, sem se abalar, respondeu com mansidão:
— “Grande Zabelê, tua voz é bela e poderosa, mas o canto sozinho não sustenta a vida. Eu canto baixinho, mas vivo em pares. Divido o alimento, aqueço meus filhotes, e nunca caminho só. A mata e a caatinga precisam de todas as vozes, grandes e pequenas. Cada uma guarda sua força.”
O Zabelê ficou em silêncio, pois pela primeira vez percebeu que sua vaidade o fazia esquecer que o valor das aves não estava apenas no canto, mas também no cuidado, na partilha e na humildade.
Naquele dia, o Zabelê e o Paruru beberam juntos da mesma fonte. O canto forte do primeiro se uniu ao canto discreto do segundo, e assim a floresta e a caatinga ouviram, pela primeira vez, a harmonia entre o poder e a simplicidade.
🌱 Moral da Fábula
Nem sempre a força está no mais alto canto ou na maior imponência. Às vezes, a verdadeira grandeza vive na partilha, na humildade e na união dos diferentes.
Autor: Nhenety KX
ZABELÊ E PARURU, As Aves da Floresta e da Caatinga
( Cordel em Sextilhas )
Na beira da mata densa,
Onde a Caatinga é vizinha,
Cantava o belo Zabelê,
Ave de voz cristalina.
Seu canto ecoava forte,
Como trovão que ilumina.
Vivia cheio de orgulho,
Se achando o mais altaneiro,
Com sua cauda escondida
Guardava um ar de mistério.
Era dono do seu canto,
Mas também muito vaidoso.
Na Caatinga, o Paruru
Andava leve e ligeiro,
Voando sempre em casal,
Feliz, simples e certeiro.
Chamavam-no fogo-apagou,
Rolinha do povo inteiro.
Certa vez num olho d’água
Se encontraram, por destino.
O Zabelê, com desprezo,
Disse em tom desatino:
“Pequena ave pardacenta,
Teu canto é tão pequenino!”
Paruru logo respondeu,
Com doçura e humildade:
“Eu não canto tão potente,
Mas divido a amizade.
Cuido bem da minha prole,
E vivo em comunidade.”
O Zabelê se calou,
Sentiu verdade no ar.
Percebeu que na floresta
Nem só o canto é que dá,
Pois viver em harmonia
É também força cantar.
Assim juntos beberam
Na fonte do mesmo chão.
O canto forte e o pequeno
Se uniram em união.
E a mata e a Caatinga
Vibraram em coração.
🌿 Moral do Cordel
Na grandeza da existência,
Não vale só quem é forte.
Também tem valor imenso
Quem vive simples e suporte.
Na partilha e na humildade,
É que a vida encontra o norte.
Autor: Nhenety Kariri-Xocó
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