sexta-feira, 30 de maio de 2025

CROTIDZÚ, A Dona das Fontes







Nas profundezas do semiárido nordestino, onde o calor resseca a terra e o céu parece arder em chamas eternas, o povo Kipeá vivia entre espinhos e sombras, na grande mata da caatinga. Mais ao sul, onde o Rio Opará — majestoso e sinuoso — cortava o chão, viviam os Dzubukuá, irmãos de sangue e espírito. Ambos descendiam dos Kariri, um povo antigo, forjado pela terra seca e pela água escondida.


Naquela terra rude e bela, corria uma história sagrada, contada pelas velhas à beira das fogueiras e sussurrada pelos pajés nos rituais do Toré: Dzutidzí, a “Mulher da Água”, espírito ancestral, dominava as correntes ocultas que corriam sob as pedras e raízes. De sua força e ternura nasceu Crotidzú — "A Dona das Fontes" — guardiã das nascentes, habitante silenciosa das pedras, onde o juazeiro lançava sua sombra fresca sobre a terra rachada.


As crianças cresciam ouvindo que, sempre que encontrassem um juazeiro forte e verde, poderiam ter certeza de que Crotidzú estava por perto, vigiando a nascente, protegendo a água e garantindo que o povo jamais tivesse sede.


Diziam que, nas noites de lua cheia, quando as estrelas tremeluziam na vastidão do céu e o vento silvava entre as folhas secas, era possível ouvir a voz de Crotidzú cantando baixinho, um canto de água e de pedra, de vida e de silêncio.


Certa vez, uma menina do povo Dzubukuá, chamada Inanté, quis ver com os próprios olhos a guardiã das fontes. Ao entardecer, guiada pelos conselhos de sua avó, seguiu até uma nascente escondida entre pedras brancas, onde um juazeiro velho e forte estendia seus galhos como braços protetores.


— Crotidzú… — sussurrou Inanté, ajoelhando-se junto à fonte. — Eu vim te agradecer pela água que bebo e pelo verde que ainda existe…


De repente, o vento cessou. A superfície da água ficou lisa como um espelho. E ali, entre a sombra do juazeiro e o brilho da lua, a menina viu: uma figura envolta em véus d'água, com olhos tão profundos quanto as nascentes escondidas e cabelos longos como as raízes das árvores.


Crotidzú sorriu, mas seus olhos estavam tristes.


— Meu povo me chama, minha filha — disse a guardiã, sua voz como o murmúrio de um riacho. — Mas sinto que minha morada corre perigo…


Inanté franziu a testa, sem compreender.


— Por que, Crotidzú?


A Dona das Fontes apontou para além da mata.


— Eles estão chegando... homens que derrubam árvores, que ferem a terra, que secam as fontes. Meu canto se cala, minhas águas secam, e o juazeiro chora…


Dias depois, as palavras de Crotidzú se confirmaram. Vieram os colonizadores, homens com armas e machados. Cortaram as árvores sagradas, derrubaram o juazeiro, abriram trilhas onde antes o mato era fechado e as nascentes protegidas. O barulho do machado soava como um trovão, e com cada golpe, Crotidzú se enfraquecia.


O povo Kariri-Xocó chorou a perda da floresta. Os anciãos reuniram-se, os pajés entoaram o Toré mais triste que já se ouviu, e as crianças, como Inanté, aprenderam desde cedo a dor da resistência.


Mas mesmo na tristeza, não se calaram. Um dia, um velho guerreiro subiu até a pedra mais alta e, olhando para o que restava do juazeiro caído, entoou em voz firme e rasgada:


“Á Toupparti juá erã, homoté pí pohá, á mará, aí pá!”

"Tu, adeus juazeiro verde, não é possível, pequeno, secar-se, tua cantiga de guerra."


E o povo repetiu em coro, enquanto as lágrimas corriam como pequenos riachos sobre seus rostos marcados.


Crotidzú, vendo a devastação, recolheu-se. Partiu para as pedras mais fundas e escondidas, onde os homens brancos não podiam alcançá-la. Mas não abandonou seu povo.


Quando a seca apertou e muitos partiram ou tombaram, os que resistiram ainda encontraram água, guiados pelos sinais de Crotidzú: uma folha verde entre o cinza da caatinga, um fio d’água sob uma pedra, um juazeiro que, milagrosamente, não secava.


E assim, geração após geração, a memória da Dona das Fontes permaneceu viva.


Dizem que, até hoje, quem se aproxima respeitosamente das pedras das nascentes e canta o Juá Erã com o coração limpo, pode ouvir ao longe, entre o vento e o som da água, a voz de Crotidzú:


— Resista… preserve… a água é a vida e a floresta é o espírito…


E os Kariri-Xocó, fiéis aos ensinamentos, seguem protegendo o que resta da mata, lutando como seus ancestrais, guiados pela força invisível, mas eterna, da Dona das Fontes.





Autor: Nhenety KX 




Consultado por meio da ferramenta ChatGPT (OpenAI), inteligência artificial como apoio para elaboração do trabalho da capa no dia 30 de maio de 2025.



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