Nas florestas e campos, os animais silvestres sempre viveram do que a natureza generosamente oferecia. Frutos, raízes, folhas, flores… e, às vezes, até outros animais. Assim também era com o meu povo, os Kariri-Xocó. Quinzenalmente, seguimos para a mata do Ouricuri, onde praticamos nossas tradições, renovamos o espírito e alimentamos o corpo com o que a terra nos oferece.
Mas o tempo passou… vieram os colonizadores, derrubaram as florestas para construir cidades, estradas, muros. A mata do Ouricuri foi a única que resistiu em nosso município de Porto Real do Colégio, Alagoas. Agora, seus produtos silvestres já não bastam para alimentar a todos. E assim, compramos arroz, macarrão, biscoitos e outros alimentos artificiais, embalados e empilhados nas prateleiras do comércio.
Certa vez, caminhava sozinho pelas redondezas, perto das casas onde moramos. O chão de terra batida, as folhas secas espalhadas… quando, de repente, parei. Meus olhos não acreditavam: ali, uma trilha apressada de formigas içá carregava grãos de arroz, pedaços de biscoito, fios quebrados de macarrão.
— Olha só… — falei em voz baixa, me agachando para observar melhor.
Nesse momento, meu avô, que vinha logo atrás com sua bengala de pau-ferro, se aproximou e, percebendo meu olhar curioso, perguntou:
— O que vês, meu neto?
— As içás… elas não carregam mais folhas e sementes… Olhe, vô! Agora levam arroz, biscoito… até macarrão!
Ele sorriu, ajeitou o chapéu de palha e disse com a sabedoria de quem guarda muitas histórias:
— Ah… Içamikaraí…
— Içamikaraí? — perguntei, sem entender.
— Sim… — ele respondeu, olhando para o horizonte como quem vê além do tempo. — "As comem como os brancos". Assim diziam nossos ancestrais, quando viam os costumes mudando, a mata diminuindo… As formigas, meu neto, estão apenas seguindo o que restou. Como nós também seguimos…
Fiquei em silêncio, olhando as pequenas içás que sumiam em suas tocas com os alimentos. Uma sensação estranha me invadiu: de admiração, de tristeza… e de respeito.
Meu avô, então, pousou a mão em meu ombro e completou:
— O mundo muda… mas a memória do nosso povo continua. E sempre que vires as içás carregando arroz e biscoito, lembra-te: elas são como espelhos da nossa história.
E assim seguimos, caminhando de volta para casa, com a certeza de que, mesmo diante das mudanças, nossa essência resiste, como a mata do Ouricuri, firme e viva.
Autor: Nhenety Kariri-Xocó
Consultado por meio da ferramenta ChatGPT (OpenAI), inteligência artificial como apoio para elaboração do trabalho da capa no dia 26 de maio de 2025
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