domingo, 11 de maio de 2025

O PRIMEIRO ENCONTRO – O Conto de Tarobá

 




Nas margens sagradas do grande rio Opara, onde as águas corriam com a força das histórias ancestrais, vivia o povo Natu. Seu cacique, Tarobá, era conhecido por sua sabedoria e por ouvir as vozes da mata, do vento e das águas. A aldeia prosperava na foz do rio, onde os peixes saltavam em abundância e as crianças cresciam ouvindo os ensinamentos dos mais velhos.


Certa manhã, quando o sol mal havia despertado no céu, Tarobá avistou algo estranho no horizonte. Era uma imensa canoa de panos, tão grande que parecia carregar nuvens. Os mais velhos disseram que era presságio, os jovens ficaram curiosos. Tarobá, atento, reuniu os guerreiros e observou.


A grande canoa ancorou ao longe, e dela partiram embarcações menores, que rasgavam o espelho do mar em direção à terra firme. Nelas vinham homens de pele clara, vestidos de forma estranha, com olhos de sede e mãos de posse.


Ao pisarem na areia, os homens se aproximaram com palavras desconhecidas, mas logo encontraram uma forma de se comunicar. Um deles, apontando para o rio, perguntou:


— Como se chama este rio?


Tarobá, com a firmeza de quem carrega o nome de seus ancestrais na alma, respondeu:


— Este é o Opara. É assim que o chamamos desde o princípio.


O homem branco fez um gesto e disse com voz autoritária:


— A mando de nosso rei, estamos nomeando os lugares conforme o santo do dia. Hoje é quatro de outubro, dia de São Francisco. Portanto, este rio agora se chamará Rio São Francisco.


Tarobá olhou fixamente nos olhos do forasteiro e, com serenidade e firmeza, respondeu:


— Para nós, será sempre Opara. Esse nome que vocês dizem será apenas para os brancos. Aqui, ele corre com o nome que os espíritos lhe deram.


Os homens brancos partiram em suas pequenas canoas, voltando à grande embarcação que logo desapareceu no mar. O tempo passou. Outros chegaram. Trocavam madeira por machados. Depois, vieram sem troca: apenas com a fome da terra, devastando florestas, queimando caminhos, massacrando os que resistiam.


Houve guerra. Os Natu, com poucos sobreviventes, fugiram rio acima, buscando abrigo nas matas do sertão. Foi ali, no coração do verde profundo, que os padres os encontraram. Uniram-nos a outros povos – Kariri, Karapotó, Aconã, Xocó – sob a sombra de um novo nome: Kariri-Xocó.


Mas os antigos sabiam: a primeira vez nunca se esquece.


O rio, a floresta, os animais, as serras, os peixes, o sol, a lua — tudo ainda guardava os nomes ancestrais. Tentaram apagar a memória, mas ela resistiu. E os filhos de Tarobá seguem vivos, lutando para existir, para lembrar, para contar.





Autor: Nhenety Kariri-Xocó 





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