domingo, 11 de maio de 2025

O CONTO DE INHINHO - O DEUS NATIVO KARIRI

 




No tempo antigo, quando ainda não havia caminhos no chão da terra e o silêncio era o idioma dos ventos, Nhinho ou Inhinho, o Deus Kariri, desceu sobre o vazio e começou a cantar. Seu canto era feito de toré, de vento e de luz. E de seu canto nasceu a Mãe Terra.


De sua palavra sagrada brotaram as montanhas, os rios, os mares, os bichos, os pássaros, as árvores e as estrelas. Tudo se moveu para compor o grande corpo da vida. Então, sob uma floresta cheia de verde e sopros de encantamento, Nhinho reuniu todos os seres que criou. Foi ali que ele moldou, do barro da terra e do sopro do espírito, Ninhó — o primeiro índio, feito à sua imagem.


Ninhó era um homem de fala doce, de corpo pintado e coração valente. Ele escutava os conselhos de Nhinho e aprendeu com Ele os segredos da pesca, da caça, da canoa, da oca e da vida em aldeia. O mundo então era jovem, e tudo que se fazia era em comunhão com os espíritos que habitavam cada canto do mato, do céu e da água.


Nhinho, o Deus Primordial, não se mostrou apenas ao povo Kariri. Ele caminhou pelos quatro círculos do horizonte, e a cada povo que encontrava, se vestia com um rosto diferente, com uma fala e um costume próprio. Para cada terra, uma cultura. Para cada cultura, uma forma de viver em harmonia com o ecossistema que a envolvia.


Assim cresceu o mundo: diverso, entrelaçado, cheio de cantos, ritos e saberes. Todos os povos, filhos da mesma Avó sagrada — a Mãe Terra. Tudo que era colhido, caçado ou usado pedia licença, fazia-se com respeito. Os Kariri sabiam que a vida era um fio sagrado que ligava todos os seres. E por isso o mundo respirava em paz.


Mas um dia, quando o sol estava triste e os animais calados, chegaram pelo mar grandes barcos com asas de pano. Eram os homens de além-mar. Eles não pediram licença. Cortaram as árvores, apagaram os cantos, rasgaram o chão e escravizaram os filhos da Terra.


Ninhó viu seu povo sendo destruído, viu sua floresta chorando, e clamou a Nhinho. O Deus, entristecido, recolheu-se no alto das serras, nos olhos dos pajés e nos corações das crianças indígenas.


Hoje, os filhos de Ninhó ainda vivem e cantam, ainda lutam e resistem. A Mãe Terra, porém, está doente. Vê seus filhos morrendo pelas mãos de seus próprios irmãos. Ela chora em silêncio, pedindo que se lembrem: a Terra é nossa casa, é sagrada, é viva.


E enquanto houver alguém que conte esta história, o canto de Nhinho continuará ecoando nos ventos.



Autor: Nhenety Kariri-Xocó 





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