segunda-feira, 16 de junho de 2025

IAƝATÉ ERA BUNHÁ — A Casa de Barro e Comunhão







Na aldeia banhada pelas águas do grande rio, quando o sol se deita no horizonte, o vento sopra histórias antigas nos ouvidos atentos dos mais novos. É nesse tempo que começa a se falar de Iaɲaté — o mutirão sagrado do povo Kariri-Xocó.


Zawã, um jovem de olhos atentos como os do gavião, havia pedido a mão de Nãmá, filha de um velho sábio das ervas. O casamento se aproximava, e como manda a tradição viva, era chegada a hora de construir a nova morada. Mas não seria apenas uma casa — seria um elo feito de barro, madeira e união.


Na língua Dzubukuá, falada pelos antigos e ensinada aos filhos, Iaɲaté quer dizer “juntar para trabalhar”. E quando a aldeia ouve essa palavra, o chamado é mais forte que o tambor: todos sabem que é tempo de juntar os corpos, os risos, os cantos e as mãos.


Logo ao amanhecer, a floresta foi saudada. Os homens seguiram mata adentro para buscar as madeiras retas e firmes. Com sabedoria antiga, cortaram os troncos certos, trançaram as paredes com cipó forte como laços de sangue. Não havia pressa, cada gesto tinha alma. Sobre a armação, cobriram com capim sapé. E onde não havia sapé, palha de arroz — pois a terra sempre oferece o que for preciso.


Chegada a hora do barro, foi feito o convite: "Venham todos. A casa vai ganhar paredes." As famílias vieram com alegria. Ao redor da futura morada, os homens pisavam no barro cantando, os jovens buscavam água nos potes de barro queimado, as crianças gargalhavam e moldavam pequenos punhados de lama como se fossem brinquedos sagrados.


As mulheres, donas do sabor e do cuidado, preparavam panelas fumegantes de comida, alimentando a força dos que trabalhavam. E os cantos de Iaɲaté ecoavam entre as árvores e as paredes em construção — melodias que contavam histórias de antepassados e anunciavam que ali o amor tomaria forma de lar.


À medida que a taipa subia, as mãos deixavam suas marcas: dedos grandes, finos, pequenos, fortes — impressões digitais de um povo unido. Era como se cada um assinasse ali: "Eu estive. Eu fiz. Eu pertenço."


Quando a casa ficou pronta, o sol se punha novamente. No barro úmido ainda fresco, as marcas eram visíveis como tatuagens da memória. A casa era mais que abrigo — era a história de um povo contada em silêncio, feita com suor, riso e cantoria.


E assim, a cada nova união, renasce o costume. Pois enquanto houver amor, floresta, barro e vontade de estar junto, Iaɲaté Era Bunhá continuará — eterno como o rio que segue.




Autor: Nhenety Kariri-Xocó 




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