sexta-feira, 11 de julho de 2025

TORÃKEMWA, Livro Fino de Imagens Coloridas






Um Conto Sobre as Revistas


Na aldeia onde o rio murmura segredos antigos e as folhas dançam ao sabor do vento, chegou um dia um objeto encantado. Tinha cheiro de tinta, papel liso, e cores que saltavam aos olhos. Era o Torãkemwa — o Livro Fino de Imagens Coloridas.


Diziam que, há muito tempo, bem longe dali, um homem chamado Gutemberg havia criado a mágica de imprimir palavras e desenhos em folhas brancas. Lá na Europa do século XV, os livros nasceram como se fossem sementes de sabedoria. Depois vieram as revistas, essas flores ligeiras, cheias de imagens, que se abriram no século XIX como um novo jeito de contar o mundo.


Mas para os Kariri-Xocó, a história começou com os passos dos capuchinhos, lá no século XVII. Eles chegaram com seus catecismos e gramáticas, tentando aprender e ensinar ao mesmo tempo. E deixaram a palavra Torarã – "livro" – plantada na terra do nosso idioma.


Foi só muito depois, quando os caminhos da aldeia se abriram para o mundo, que o Torãkemwa chegou de verdade. Era a década de 1970. As mãos curiosas das meninas e dos meninos seguravam com cuidado aquelas revistas brilhantes: Sétimo Céu, Veja, Placar, Cruzeiro, IstoÉ…


As moças sonhavam acordadas ao ver os rostos sorridentes dos galãs de novela. Os rapazes vibravam com os retratos dos craques do futebol. Havia quem colasse pôsteres nas paredes de barro, fazendo do seu canto um pedaço do mundo grande. Era festa ao redor das imagens — era encanto, era conversa, era sonho.


O nome nasceu da nossa língua: Torãkemwa, de Torarã (livro), Kempé (fino), Waruá (imagem). Um nome que guarda a alma do que se via e sentia.


Hoje, o tempo corre mais ligeiro. As imagens voam por telas de celular. Os ídolos brilham em vídeos que cabem na palma da mão. As revistas impressas dormem quietas nas prateleiras, com cheiro de passado bom.


Mas há, no fundo do coração do povo Kariri-Xocó, uma saudade que não se apaga. Uma saudade do tempo em que abrir uma revista era abrir um mundo. Um tempo em que o Torãkemwa fazia os olhos brilhar e os sonhos correrem soltos como o vento entre os coqueiros do sertão.




Autor: Nhenety Kariri-Xocó 





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