A Fábula das Pombas Asa-branca e Arribaçã
No coração do sertão, onde o chão racha sob o sol e o vento canta canções de poeira, viviam duas aves amigas: Jacaçu, a altiva Pomba-asa-branca, e Parari, a ligeira Pomba-do-sertão, que os mais antigos chamavam de Arribaçã.
Certa vez, quando a seca apertou, o céu permaneceu fechado por muitos meses. O sertanejo plantava, mas nada vingava, e a fome rondava cada casebre.
Foi então que Parari, ouvindo o lamento do povo, reuniu seu bando e partiu em longas viagens, retornando com sementes, grãos e pequenos frutos. Ao pousarem nos campos, deixavam cair um banquete para as famílias necessitadas. Era o presente da Arribaçã, que trazia fartura mesmo no tempo mais cruel.
Já Jacaçu, silenciosa e firme, observava o horizonte. Ela sabia que seu voo anunciava outra esperança. Um dia, numa tarde de março, seu canto ecoou pelas veredas: era sinal de que a chuva viria. E assim foi. No dia de São José, o povo voltou a plantar a roça, e quando chegaram os dias de Santo Antônio, São João e São Pedro, as fogueiras acenderam-se, o milho verde virou pamonha, canjica e mugunzá, e o riso se espalhou como chuva no chão seco.
As duas aves compreenderam que cada uma tinha seu tempo e seu dom: Parari, a generosa que socorria no momento da fome; Jacaçu, a mensageira da água e da esperança.
Moral da história:
No sertão, como na vida, há quem traga o pão e há quem traga a chuva — ambos sustentam o coração de um povo.
Autor: Nhenety Kariri-Xocó
JACAÇU E PARARI
A Pomba-asa-branca e a Pomba-do-Sertão
Cordel de Nhenety Kariri-Xocó
No sertão quente e sem vento
Racha o chão sem piedade,
Mas a fé do povo é grande,
Guarda força e lealdade,
Pois espera a boa chuva
Pra plantar com liberdade.
Jacaçu, asa-branquinha,
Pomba firme e altaneira,
Quando canta no terreiro
Traz notícia verdadeira:
Que São José vem chegando
Com a chuva tão faceira.
Parari, ligeira e viva,
Também dita Arribaçã,
Voa em bando pelo céu
Sobre as roças do sertão,
Trazendo grão e fartura
Pra quem sofre na precisão.
Quando a seca é mais severa
E a fome se faz presente,
Parari vem com seus pares,
O banquete é de repente;
Mostra ao homem do sertão
Que o dividir é o mais crente.
Quando a chuva enfim desponta
No mês santo de março,
Jacaçu canta contente,
O sertão solta seu laço:
Pamonha, milho e canjica
No festejo e no abraço.
Santo Antônio abre o mês,
São João acende a chama,
São Pedro encerra a festa
Com o milho que se ama,
Tudo nasce do trabalho
E da chuva que derrama.
No sertão, cada uma ave
Cumpre o dom que Deus lhe deu:
Uma traz o pão na hora,
Outra avisa o que vem do céu,
Mostrando que a união
É a força que venceu.
Moral:
Seja chuva ou seja pão,
Todo bem tem seu momento;
No sertão e no coração
Voa livre o sentimento:
Quem reparte a sua parte
Traz a vida em todo tempo.
Autor: Nhenety Kariri-Xocó
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