A Fábula Festa de Acasalamento do Uirapuru
Na imensidão verde da Amazônia, morava o Uirapuru, o “músico da floresta”, pequeno no corpo, mas imenso no coração. Seu canto era tão belo que até o vento parava para escutá-lo.
Chegava o tempo do Jasyporundy, a Lua da Florada, quando as árvores se enfeitavam de flores. Logo viria o Jasypa, a Lua da Renovação, em que a vida se transformava em novos começos. Era neste período sagrado que o Uirapuru se preparava para o acasalamento e, como todo ano, anunciava a grande festa na floresta.
De todos os cantos das três Américas, aves migratórias viajavam milhares de léguas para testemunhar o canto divino. Nenhuma criatura ousava interromper, pois todos sabiam: quando o Uirapuru canta, a floresta silencia para ouvir os deuses.
Do Nordeste do Brasil vieram muitos convidados:
Jamacaí, o Corrupião, com sua plumagem dourada e apetite por lagartas;
Caburé, o pequeno corujão da mata, que guardava os segredos da noite;
Guyrá Pepyryká, o Limpa-folhas, que vasculhava o chão da mata em busca de insetos;
Guiratirica, o Galo-de-campina, trazendo no alto da cabeça um topete vermelho como brasa;
e Arara’i yobi, a Ararinha-azul, que brilhava como um pedacinho de céu.
Todos se reuniram na clareira onde o Takuara Ybytyrû Tyryvu, o Chefe das Aves, havia convocado o encontro.
— Hoje celebramos o canto que une a floresta — disse o Uirapuru, humilde, mas firme. — Nosso som é vida, e nossa vida é semear a floresta.
E assim começou o espetáculo. O Uirapuru entoou sua melodia, tão pura que parecia abrir caminhos entre as árvores. As aves se encantaram, os rios suspiraram, e até os frutos amadureceram mais rápido ao som daquela voz.
Na tradição, dizia-se que quem ouvisse o Uirapuru teria sorte e poderia realizar desejos. E, naquela noite, cada ave desejou não para si, mas para a floresta: sementes férteis, chuvas suaves, árvores altas e frutos abundantes.
Quando o último acorde ecoou, o silêncio sagrado pairou. Então o Takuara Ybytyrû Tyryvu proclamou:
— Que nunca nos esqueçamos: somos semeadores. Onde pousamos, deixamos vida. A floresta depende de nós, e nós dependemos dela.
E todas as aves, grandes e pequenas, bateram asas em concordância.
Desde então, conta-se que o canto do Uirapuru não é apenas um som, mas uma prece da floresta, lembrando que cada ser, por menor que seja, tem uma missão grandiosa no equilíbrio da vida.
📖 Moral da fábula:
Assim como o Uirapuru, cada um tem um dom que, quando partilhado, fortalece toda a comunidade. A verdadeira festa é aquela em que todos semeiam a vida.
Autor: Nhenety Kariri-Xocó
📖 TAKUARA YBYTYRÛ TYRYVU
( A Festa do Chefe das Aves )
Em versos de cordel por Nhenety Kariri-Xocó
🌿 Ao Leitor
Leitor amigo, atenção,
Trago em verso a tradição,
Na toada nordestina,
Com beleza e inspiração.
É a voz do Uirapuru,
Chefe da ave e da canção.
🌿 Dedicatória
Dedico esta cantoria
À floresta, mãe sagrada,
Aos cantores da esperança,
E à memória preservada.
Que o saber dos ancestrais
Siga sempre na jornada.
🌿 A História
Na Amazônia encantada
Canta o mestre Uirapuru,
Sua voz é tão divina,
É presente de Tupy.
Toda ave se reúne
Para a festa ouvir o tu.
Chega a Lua da Florada,
Logo a da Renovação,
O cantor da mata avisa:
“Vai haver celebração!”
E do Norte e do Nordeste
Vêm as aves em procissão.
Vem Jamacaí dourado,
Com Caburé do luar,
Guyrá Pepyryká,
Que só vive a revirar,
E o Galo-de-campina
Com seu topete a brilhar.
A Ararinha tão azul
Veio do céu se mostrar,
O Takuara convocou
Toda ave pra cantar.
“Somos filhos da floresta,
Nossa missão: semear.”
Quando o Uirapuru canta
Tudo para pra escutar,
O rio fica mais manso,
A fruta vem a brotar,
E quem ouve essa cantiga
Pode um desejo alcançar.
Mas as aves desejaram
Proteção e mais fartura,
Que a mata fosse sagrada,
Terra forte e sempre pura.
Pois quem cuida da floresta
Tem da vida a essência e cura.
🌿 Moral
No cordel fica a lição,
Pequeno também tem valor:
Quem defende a natureza
É guardião semeador.
Pois a vida só floresce
Com respeito e muito amor.
Autor: Nhenety Kariri-Xocó

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