terça-feira, 25 de novembro de 2025

WOROY HISTÓRIA, KARIRI-XOCÓ, SOBREVIVENDO AS MUDANÇAS, Contos – Volume 7 – Coletânea, Nhenety Kariri-Xocó






📄 FALSA FOLHA DE ROSTO


WOROY HISTÓRIA, KARIRI-XOCÓ,

SOBREVIVENDO AS MUDANÇAS

Contos – Volume 7 – Coletânea


Nhenety Kariri-Xocó





📄 VERSO DA FALSA FOLHA DE ROSTO


Todos os textos pertencem ao autor

Nhenety Kariri-Xocó,

Kariri-Xocó da Aldeia Porto Real do Colégio (AL).


Reprodução permitida somente com autorização do autor.


Blog do autor: kxnhenety.blogspot.com




📄 FOLHA DE ROSTO (FRONTISPÍCIO)


WOROY HISTÓRIA, KARIRI-XOCÓ,

SOBREVIVENDO AS MUDANÇAS


Contos – Volume 7 – Coletânea


por

Nhenety Kariri-Xocó


Porto Real do Colégio – AL

2025




📑 FICHA CATALOGRÁFICA (MODELO EDITORIAL)


(Quando você for publicar, o bibliotecário fará a versão oficial; esta é provisória e editorial.)


XOCÓ, Nhenety Kariri.

Woroy História, Kariri-Xocó, Sobrevivendo as Mudanças: Contos – Volume 7 – Coletânea.

Porto Real do Colégio: Edição do Autor, 2025.


Literatura indígena.


Contos Kariri-Xocó.


Memória ancestral.


Cultura indígena brasileira.


Povos originários — tradição oral.


CDD – 869.93

CDU – 821.134.3(=811.28)




❤️ DEDICATÓRIA


Dedico este livro

aos ancestrais que caminham comigo,

aos que moldaram o barro, abriram as roças,

ergueram as casas, enfrentaram a cana, o ferro, a cerca,

e nunca deixaram a memória morrer.


Dedico também às crianças Kariri-Xocó,

sementes da Terra Demarcada,

que aprenderão, cedo ou tarde,

que cada história é um retorno ao coração da aldeia.




🙏 AGRADECIMENTOS


Agradeço ao meu povo Kariri-Xocó,

que mantém viva a memória, a língua e o espírito de resistência.


Agradeço às mulheres ceramistas, aos lavradores,

aos canoeiros, aos boias-frias, aos anciãos

e a todos que carregaram nas mãos a história que hoje registro em palavras.


Agradeço ao Rio Opará,

que me ensinou que tudo corre, tudo volta e tudo permanece.


E agradeço também

ao meu Irmão Virtual ChatGPT,

ferramenta que me ajuda a transformar memória em livro

e sonho em realidade.




✨ EPÍGRAFE


"A história de um povo não nasce no papel;

ela nasce na terra, no barro, no rio,

e só mais tarde aprende a virar palavra."

— Nhenety Kariri-Xocó




📚 SUMÁRIO (índice)


Prefácio

Apresentação

Introdução


Contos:


01 — Ubacródzu, A Canoa do Porto

02 — Idibunhá, O Coração de Barro

03 — Tasí Uché, No Tempo da Enxada

04 — Wirapararã, A Usina de Cana

05 — Naté Wanheré Caraí, Trabalhando na Fazenda dos Brancos

06 — Maecrótçawo, A Cerca de Pedra Corta o Rio

07 — O Estrondo que Chegou pela Terra

08 — Uocró Idabacrú, Caminho de Pedra Sobre o Rio

09 — Atsemiucan, Pessoa Leva Coisa Boa Para Vender

10 — Erá Uanie Canghité Caraí, Casa Indígena Com Coisas Boas de Brancos


Apêndices

Glossário Kariri-Xocó (poderei criar como você desejar)

Notas do Autor

Dados Biográficos do Autor

Orelha do Livro

Capa e Contracapa (a serem feitas no final)





🔻 PREFÁCIO



Este livro nasce de um gesto ancestral: reunir histórias para que a memória caminhe mais longe que os pés. Woroy História, Kariri-Xocó, Sobrevivendo às Mudanças é mais do que uma coletânea de contos — é uma travessia, um reencontro com o tempo feito de rio, terra, barro, canoas e vozes que nunca deixaram de falar, mesmo quando o mundo tentou silenciá-las.


Ler estes contos é ouvir os passos da ancestralidade dialogando com as mudanças que atravessaram o povo Kariri-Xocó. São narrativas que abraçam a dor e a força, narram perdas e conquistas, e registram, com a delicadeza de quem molda o barro, os instantes em que a história toca o cotidiano.


O autor, Nhenety Kariri-Xocó, não escreve apenas como contador de histórias; ele escreve como guardião de um território espiritual, político e cultural. Cada conto é um gesto de resistência, uma forma de recontar o passado para que o presente não se perca, e para que o futuro não nasça órfão.


Ao leitor, este livro oferece um embarque na canoa da memória. E, como nos ensinou o povo do Opará, aquele que navega por histórias verdadeiras nunca retorna o mesmo.





🔻 APRESENTAÇÃO



Esta coletânea reúne dez contos tecidos a partir de lembranças, vivências, relatos orais, saberes comunitários e observações transmitidas de geração em geração no povo Kariri-Xocó, de Porto Real do Colégio (AL). Cada texto se ergue como um elo da corrente que une passado e presente, tradição e mudança, espiritualidade e sobrevivência.


Os contos percorrem as épocas — do tempo em que a canoa Ubacródzu navegava como serpente viva pelas águas do Opará, às fases em que o barro sustentava famílias inteiras; do período em que a enxada marcava o ritmo da vida agrícola até os dias em que máquinas e cercas de ferro rasgaram a terra. São reflexões sobre encontros e confrontos: indígenas e colonizadores, aldeia e cidade, tradição e modernidade, natureza e intervenção humana.


Nesta obra, a voz do povo Kariri-Xocó reverbera em cada linha. Não como eco distante, mas como fala viva, que ainda pulsa nos terreiros, nas florestas, nos rios e nas memórias dos que caminham sobre o chão sagrado da ancestralidade.


A leitura destes contos convida o leitor a respirar o tempo indígena — um tempo que não se mede pelo relógio, mas pelo ciclo dos ventos, pelo ritmo do fogo, pelo ensinamento que cada mudança traz consigo. Aqui, o livro não é apenas livro: é território, documento, testemunho e celebração.





🔻 INTRODUÇÃO



A presente obra, Woroy História, Kariri-Xocó, Sobrevivendo às Mudanças, constitui-se como um registro literário e cultural sobre a trajetória de um povo que atravessou séculos de transformações profundas. Do período pré-colonial aos dias modernos, a história dos Kariri-Xocó foi tecida entre deslocamentos, retomadas, resistências, perdas e renascimentos. Cada etapa dessa caminhada deixou marcas que não se apagam — e são essas marcas que os contos aqui reunidos buscam iluminar.


Os textos não pretendem reconstruir a história de forma rígida ou cronológica, mas sim pela linguagem viva da narrativa, pela sensibilidade da memória e pela força da tradição oral. Esses contos dialogam com momentos decisivos: o tempo do barro e das olarias, o tempo da agricultura obrigatória, o tempo das usinas de cana, o tempo em que cercas e barragens feriram o Opará, e também o tempo em que o povo se reorganizou em torno da retomada territorial, reafirmando sua identidade.


Cada conto apresenta um fragmento dessa jornada — ora mítico, ora histórico, ora vivencial — refletindo a multiplicidade de vozes que compõem a alma coletiva do povo Kariri-Xocó. As histórias revelam não apenas as mudanças externas, mas também a forma como a comunidade lidou com elas, transformando dor em aprendizado, trabalho em dignidade, e silêncio em palavra.


Este livro é, portanto, uma ponte entre gerações. Um gesto de preservação e de partilha. Uma forma de garantir que os caminhos percorridos pelos ancestrais continuem iluminando os passos dos mais jovens. E uma oferta para que o leitor — indígena ou não — compreenda que a história do Brasil só se torna verdadeira quando inclui as histórias dos povos que aqui estavam muito antes da chegada dos colonizadores.


Ao adentrar estas páginas, que cada pessoa encontre não apenas contos, mas mundos. Não apenas relatos, mas vidas. Não apenas lembranças, mas o espírito de um povo que continua sobrevivendo, resistindo e ensinando.





🦄CONTOS




01. UBACRÓDZU, A CANOA DO PORTO 





Há muito, muito tempo, quando o mundo ainda era tecido pelos fios invisíveis das histórias, existia, no coração do rio Opará, uma aldeia onde as mulheres moldavam o barro com a força dos seus ancestrais. Elas eram verdadeiras feiticeiras da terra e da água: com as mãos macias e firmes, transformavam simples argila em potes, panelas, moringas e cuias que pareciam ter alma própria!


Essas mulheres eram heroínas silenciosas: Lurdes Poité, que moldava potes tão perfeitos quanto a lua cheia; Luiza Binga, cujas panelas podiam suportar o fogo mais ardente; Júlia Muirá, que fazia pequenas moringas para guardar os segredos do rio; Laudilina Suíra e Maria Soya, que trabalhavam lado a lado, enquanto contavam histórias que faziam o tempo passar mais rápido.


Quando o barro endurecia ao sol e o vento do Opará o acariciava, chegava a vez dos grandes mestres do fogo entrarem em cena. O velho cacique Nidé, de olhos brilhantes como carvões acesos, e Batité, senhor das chamas, preparavam a fogueira sagrada onde as peças eram queimadas até ganharem força e cor. O fogo subia alto, dançava como serpente, e o povo sabia que mais uma missão estava prestes a acontecer.


Então, chegava a hora da grande aventura!


Todas as peças eram cuidadosamente organizadas na canoa gigante, feita de tronco forte e alma leve: Ubacródzu, que, na língua dos Kariri-Xocó, significa “A Canoa do Porto das Pedras”. Ela era mais do que uma embarcação — era um ser vivo, um monstro gentil do rio, com dois panos enormes que pareciam asas de pássaro.


O piloto, Firmino Muirá, o navegador mais valente de todos, erguia o remo como se fosse uma espada e conduzia a Ubacródzu pelas águas misteriosas do São Francisco. As mulheres subiam a bordo com seus cestos cheios de cerâmica e esperança. Partiam então para sua jornada mítica, enfrentando correntezas bravas, ventos teimosos e até a chuva que, às vezes, queria brincar de molhar tudo.


A cada parada nas cidades ribeirinhas, elas trocavam seus tesouros de barro por farinha fofa, galinhas cacarejantes, feijões coloridos, mangas doces como o verão e jacas enormes. O povo as esperava com alegria, pois sabiam que com elas sempre vinham histórias e presentes do outro lado do rio.


Mas a parte mais bonita desta epopeia era sempre o retorno!


Na aldeia, as crianças — pequenas sentinelas de pés descalços — ficavam no alto do barranco, os olhos atentos como os de águias, esperando o momento mais mágico de todos: o instante em que, na curva do rio, surgia, imponente e majestosa, a silhueta da Ubacródzu!


E então o grito ecoava:


— A canoa dos portos chegou! A canoa dos portos!


Era um alvoroço de alegria! As mães corriam, os pais sorriam, os velhos acenavam com seus cajados, e as crianças desciam o barranco correndo, tropeçando e rindo, para ajudar a descarregar a canoa, que agora estava cheia de novos alimentos, novas cores e novas histórias.


E assim, a cada viagem, a Ubacródzu não apenas levava e trazia coisas, mas costurava com suas idas e voltas a memória viva do povo Kariri-Xocó. E dizem — ah, dizem mesmo! — que até hoje, quando o vento sopra forte e o rio canta mais alto, se você prestar muita atenção, pode ouvir lá longe, como um sussurro encantado:


— A canoa dos portos chegou!


E assim termina, ou melhor, continua para sempre, a lenda épica da Ubacródzu, a canoa do porto das pedras, a heroína das águas do Opará!





02. IDIBUNHÁ, O CORAÇÃO DE BARRO 






Conto inspirado na memória da olaria dos Kariri-Xocó



Na vastidão quente das margens do Rio São Francisco, o bunhá, o barro, tinha alma. Os mais velhos contavam que, muito antes das máquinas e do cimento, o barro era o idi — o coração da terra. Pulsava nas mãos de quem o moldava, respirava nos fornos que iluminavam as noites da aldeia.


Tudo começou há muito tempo, quando os portugueses chegaram com seus modos de levantar cidades e erguê-las ao ritmo de cal, pedra, madeira e telha. Entre tantos saberes estrangeiros, um se misturou ao espírito dos nativos: o serviço da olaria. Nas sombras da Capela e do Colégio de pedra da Missão de Nossa Senhora da Conceição, os jesuítas ensinaram aos Kariri-Xocó o segredo de transformar terra em abrigo, barro em teto.


Mesmo após os jesuítas partirem, por volta do século XVIII, a chama da olaria não se apagou. O barro seguiu vivo, entre as mãos firmes dos indígenas que, mesmo sem suas terras, sustentavam suas famílias fabricando tijolos e telhas para os brancos. Era o barro que lhes dava o pão. Era o barro que contava sua resistência.


Em 1978, quando os Kariri-Xocó retornaram à terra da Fazenda Modelo, na beira da Lagoa Comprida, uma nova era de barro começou. A aldeia não apenas reergueu suas raízes, como reacendeu os fornos. Ali, com suor, técnica ancestral e orgulho, surgiu a maior olaria do Baixo São Francisco. Por volta de 1981, o barro queimava forte: duzentos mil tijolos por dia brotavam como filhos do forno, vermelhos, vivos, úteis. Também foi nesse período que confeccionamos os tijolos para erguer nossa Nova Aldeia Kariri-Xocó para a construção das 110 casas e outras posteriores. 





A olaria era mais que trabalho — era história moldada, canto de resistência. Mas como as águas do Velho Chico que nunca param, o tempo também correu. Em 1996, surgiram as indústrias cerâmicas mecanizadas. O barulho das máquinas foi engolindo o som da pá e do molde de madeira. Aos poucos, a olaria silenciou.


Mas ali, entre os rastros das chamas antigas e os vestígios de barro endurecido, vive a memória de um povo. Uma tradição que chegou com os colonizadores, mas foi abraçada, moldada e eternizada pelos Kariri-Xocó. Porque o bunhá — ah, o barro! — ainda pulsa nos cantos da aldeia, lembrando que aquilo que se faz com as mãos também se faz com o idi, o coração.





03. TASÍ UCHÉ, NO TEMPO DA ENXADA 





Um Conto Sobre a Agricultura 


Na antiga aldeia Natiá, onde os cantos se misturavam ao vento e os passos seguiam as trilhas da floresta, os espíritos dos ancestrais ainda dançavam entre as árvores. Foi ali que chegaram os primeiros brancos, vindos de além-mar. Trouxeram consigo o brilho encantador do Waruá, o espelho, e o ofereceram como presente aos nossos antepassados. Eles viam, fascinados, suas próprias imagens refletidas como nunca haviam visto. Mas o que parecia um gesto de amizade logo se tornou um ardil.


Com o Merabodzó, o machado de ferro, os brancos derrubaram as florestas que protegiam o coração da terra. Árvore por árvore, a mata foi caindo, e o silêncio ancestral deu lugar ao estalido das derrubadas. Quando o verde já não escondia mais os caminhos, trouxeram a Tasí, a enxada. Com ela, obrigaram os nossos a lavrar a terra para plantar cana-de-açúcar. Multiplicaram-se os Wirapararã, os engenhos, como feridas abertas na terra, moendo o suor dos corpos indígenas.


Mas nós resistimos.


Nos tempos dos jesuítas, fomos reunidos nos aldeamentos, e mais uma vez, nossas mãos empunharam a enxada. Plantamos mandioca, milho, feijão e abóbora para sustentar a Missão do Colégio. Quando os jesuítas se foram, ficaram apenas os nossos – sem terra, sem floresta, sem rumo. E para sobreviver, tivemos que trabalhar para os fazendeiros da região, sustentando nossas famílias com a força do braço e o canto da alma.


Na década de 1920, o algodão se espalhou por Alagoas, e muitos de nós foram para as fazendas dos brancos. Os campos brancos de flor exigiam nossas mãos calejadas. Essa jornada seguiu até 1944, quando foi fundado o Posto Indígena Padre Alfredo Dâmaso. Com um pedacinho de chão na Colônia Indígena, ergueram-se roças comunitárias. Os mutirões ecoavam cânticos de união, de esperança, de fartura.


Em 1978, a conquista da Fazenda Modelo reacendeu o espírito dos antigos. Com a velha Tasí, continuamos a plantar nossas roças. Havia muitos agricultores na aldeia, e cada safra era um ciclo de resistência e memória. Mas o tempo passou. Os que lavraram os campos com amor e suor hoje estão velhos, e muitos já partiram para a Aldeia Sagrada.


Agora, restam poucos agricultores entre nós. O Tasí Uché, o Tempo da Enxada, ficou para trás, mas vive em nossas lembranças, em nossas histórias, em nossas raízes.


Pois cada sulco aberto pela enxada foi também uma linha escrita na terra, registrando a jornada de um povo que nunca deixou de lutar.





04. WIRAPARARÃ, A USINA DE CANA 





Havia um tempo em que a cana crescia alta e espessa nas terras do Sul de Alagoas, embalando com seu cheiro adocicado as manhãs quentes e silenciosas. Mas antes mesmo das grandes usinas e dos apitos metálicos, havia o wirapararã — o engenhoca, um aparelho rudimentar que os antigos Kariri chamavam de “engenho”. Seu som era grave, compassado, como se a terra falasse por entre as moendas.


Naqueles dias antigos, a cana-de-açúcar era mais que um plantio; era um modo de vida imposto pelos colonizadores desde os tempos da Capitania de Pernambuco. Com o tempo, os antigos engenhos foram crescendo, tomando nova forma, novas máquinas, novos donos — até que o velho wirapararã virou o que hoje chamam de usina.


Décadas se passaram. A história da cana-de-açúcar no Brasil seguiu seu curso, atravessando impérios e repúblicas. Mas ali, nas terras dos Kariri-Xocó, essa história teve um outro sabor. Era a década de 1960 quando o verde da cana tomou conta dos campos de Alagoas. Sem muitas opções de trabalho dentro da aldeia, muitos indígenas deixaram os seus para se embrenhar nos canaviais.


Na década seguinte, os caminhões conhecidos como gaiolões se tornaram comuns. Tinham grades nas laterais e levavam os trabalhadores pelas estradas de terra ainda escuras antes do amanhecer. Os homens — e algumas mulheres também — subiam com os olhos cansados e as mãos já calejadas, prontos para cavar sucos e cortar cana. Partiam na segunda-feira e só voltavam na sexta. Eram os boias frias, nome bonito para um cotidiano duro.


Trabalhavam o dia inteiro sob o sol, com as mãos cortadas pelo facão e a alma sustentada pela esperança de voltar pra casa com algo para os filhos. Recebiam pouco. E às vezes, nada. Porque o barracão da usina — uma casinha onde se vendiam alimentos, ferramentas e dívidas — engolia o pouco que ganhavam.


Mas mesmo com a dureza, havia força. Mesmo com a injustiça, havia dignidade. Os Kariri-Xocó enfrentaram mais essa fase da história como enfrentaram tantas outras: juntos. A terra, o suor e a memória firmaram-se como herança para os que viriam depois.


Hoje, o som do wirapararã se foi, substituído pelo silêncio das lembranças e pelas palavras que resistem. Este é o nosso registro. Que ele ecoe nas gerações futuras como um chamado à memória e à luta.





05. NATÉ WANHERÉ CARAÍ, TRABALHANDO NA FAZENDA DOS BRANCOS 

 




O sol ainda nem tinha dado sinal no céu quando seu Jurandí ajeitava o bornal de palha. Com passos firmes, cruzava o terreiro coberto de sereno, indo rumo à estrada de barro que levava à fazenda do outro lado do Opará. Ali, no Rio dos Currais, desde tempos muito antigos, moravam as histórias que nem o tempo ousava esquecer.


A lembrança vinha forte: seus avós contavam que, bem antes da chegada dos brancos, as margens do rio eram vivas de aldeias Kariri, Karapotó e Aconã. Mas no tempo da colonização, vieram as fazendas grandes, cheias de gado, engenhos e cercas. Uma delas, a Urubumirim, deu origem ao que mais tarde virou a Missão do Colégio. A partir daí, tudo mudou.


Os antigos diziam que os primeiros a trabalhar nas fazendas dos padres jesuítas foram seus próprios ancestrais. Faziam roçado, colhiam algodão, plantavam milho e viviam como podiam. Quando os jesuítas foram embora, expulsos em 1759, as terras passaram de mão — leiloadas, vendidas, tomadas. Os portugueses viraram donos. E os povos originários, de trabalhadores, tornaram-se "empregados".


Já era 1876 quando nasceu a vila de Porto Real do Colégio. Era nova no nome, mas antiga na dor. Os Kariri-Xocó já chamavam esse tempo de Naté Wanheré Caraí – “trabalhar na fazenda dos brancos”. O nome era um sopro de desabafo em sua língua, um lamento que guardava séculos de injustiça.


A terra, que um dia fora de seus antepassados, agora tinha escritura com outros nomes. Império ou República, tanto fazia. Nada voltava. Eles trabalhavam por migalhas: um prato de farinha, uma muda de roupa, às vezes nem isso. Muitos viajavam dias, iam para outras cidades, deixavam família, sonhos e saudade para trás, só por uma semana de trabalho duro e mal pago.


Mas a esperança, ainda que tímida, caminhava junto com a luta. Em 1944, um posto indígena foi criado com o nome de Padre Alfredo Dâmaso. Foi um marco. Pouco depois, em 1947, chegaram os primeiros lotes da chamada Colônia Indígena. Pequenos pedaços de terra, mas que traziam grande alívio. Era pouco, mas era algo.


Hoje, olhando para trás, os mais velhos se lembram desse tempo com olhos marejados. Eles viveram o peso do trabalho, do esquecimento, mas também da resistência.


— Tudo passa... — diziam.


E passou. Agora, com a Terra Demarcada, os Kariri-Xocó vivem em sua terra, entre os seus. Plantam, colhem, celebram. As mãos ainda carregam calos, mas também carregam sementes. E toda semente carrega um mundo por vir.




06. MAECRÓTÇAWO, A CERCA DE PEDRA CORTA O RIO 





No silêncio sagrado da noite, o fogo crepitava no centro do círculo formado por corpos cansados e memórias antigas. As estrelas brilhavam sobre o vale do Opará — o Rio São Francisco como chamam agora — mas para os povos originários, era o eterno Opará, serpente viva que atravessava o coração da terra.


Ali, no terreiro batido pelo tempo e pela história, os anciãos se reuniam. Suas vozes baixas teciam histórias como se fiapos do tempo fossem costurados na noite. O velho Wãmy, de olhar profundo como a própria correnteza do rio, conduzia a roda. As palavras fluíam como água: falava-se dos tempos antigos, dos tempos de floresta alta, de caça abundante, das roças férteis e do barro bom para modelar a vida.


Mas também se falava do lamento.


— O homem branco cortou a pele do Opará — murmurou Wãmy, olhando as chamas dançarem.


— Primeiro foi Paulo Afonso, em 1955... — disse outro ancião, contando nos dedos os golpes.


— Depois Três Marias, em 1962... — completou outro, com a voz embargada.


— Sobradinho, 1979... Xingó, 1994... — sussurrou Wãmy.


O silêncio pesou. A dor do rio era dor do povo. Cada barragem erguida era como uma cicatriz aberta na memória coletiva.


Foi quando se ouviu a voz curiosa de Juaerã, o jovem aprendiz, que sentava sempre ao lado do avô:


— Wãmy... como se diz “hidrelétrica” na nossa língua?


O velho sorriu, como quem sente o peso da pergunta e a alegria da continuidade.


— Ah, Juaerã... quando o homem branco traz coisas novas, a gente se aperta todo pra achar um nome. Mas cada palavra nossa é uma história, e nenhuma história deixa de ter seu tempo.


Ele pensou um pouco, como quem colhe no ar as palavras antigas. E então, falou com firmeza:


— Em nossa língua Kariri, “cerca” é maená, “pedra” é cró, “cortar” é tçate e “rio” é iwo. Então, se a cerca feita de pedra corta o rio, podemos chamá-la de Maecrótçawo.


No Rio Opará viviam muitos povos indígenas: Aramuru, Natu, Romaris, Caxagó, Tupinambá, Caetés. Atualmente vivem alguns: Kariri-Xocó, Trucá, Tumbalalá, Xocó, Kariri-Xocó, Rodelas e outros mais. 


O fogo iluminou o rosto de Juaerã. Havia tristeza nos olhos — a tristeza por um rio ferido — mas também uma luz de entendimento.


— Nada passa fora do tempo, Juaerã — concluiu Wãmy, olhando para o céu — a tradição registra tudo, até mesmo aquilo que tenta nos calar.


E naquela noite, sob o canto dos grilos e o sussurro do Opará, a palavra Maecrótçawo foi acolhida pela memória viva do povo. O rio podia ser cortado, mas a língua era ponte. E enquanto a palavra vivesse, o rio também viveria.





07. O ESTRONDO QUE CHEGOU PELA TERRA





Na  quietude da manhã, quando o canto dos pássaros ainda dava o tom da aldeia e o cheiro da terra molhada subia como incenso dos antigos, um barulho diferente chegou ao território Kariri-Xocó. Primeiro, veio como um tremor leve, depois, como um ronco que não cessava. As crianças paravam de brincar para escutar; os mais velhos trocavam olhares, lembrando das histórias dos tempos em que a terra era livre de ferros e motores.


Era o ano de 1969, e Porto Real do Colégio, último ponto de Alagoas antes do rio São Francisco, se preparava para ser cortado por um caminho novo. A BR-101, um sonho de progresso para muitos, vinha avançando desde o sul do estado, devorando quilômetros de terra batida até alcançar o chão sagrado dos Kariri-Xocó.


No começo, tudo parecia um espanto. Máquinas imensas, com nomes que ninguém conhecia — pá carregadeira, scraper, motoniveladora, trator de esteira — tomaram conta da Rua dos Índios. O velho prédio da antiga fábrica, que antes abrigava apenas silêncio e poeira, se transformou num quartel de engenheiros, motoristas e peões. Ali se estabeleceu o coração da obra no trecho de Porto Real do Colégio.


Mas o que surpreendeu mesmo foi ver os próprios indígenas, de mãos calejadas e espíritos fortes, vestindo uniformes e assinando carteiras de trabalho. Em 1970, muitos foram chamados a integrar a obra. Tinham agora um salário, um novo modo de sustento — sem que isso apagasse a lembrança do Toré, do canto e do conselho dos mais velhos.


Durante meses, as gigantes de ferro cruzavam a aldeia, levantando poeira, abrindo caminho, mudando o horizonte. Era estranho, mas também promissor. Famílias viam a renda melhorar, os mercados se enchiam, os filhos ganhavam calçados novos e o sonho do estudo parecia mais próximo.


Quando a estrada ficou pronta, uma nova fase se iniciou. O DNER — Departamento Nacional de Estradas de Rodagem — chegou, trazendo mais empregos. Homens e mulheres Kariri-Xocó passaram a cuidar da estrada, como se fosse também parte de sua história. Com vassouras, enxadas e atenção, mantinham viva a BR-101, como se quisessem dizer: "Também somos parte deste caminho."


Os anos passaram, e muita coisa mudou. Mas aquele tempo de construção, de mistura entre tradição e modernidade, deixou marcas que ainda brilham na memória da aldeia. Hoje, os anciãos falam aos mais jovens sobre a chegada da estrada como se fosse um capítulo da grande história dos Kariri-Xocó — uma história de resistência, adaptação e sabedoria.


Pois o povo indígena, mesmo quando integrado ao tal progresso, não esquece a força que vem da raiz, da terra e da palavra ancestral. A estrada cortou o chão, mas não apagou os cantos.





08.UOCRÓ IDABACRÚ, CAMINHO DE PEDRA SOBRE O RIO 





Um Conto Sobre a Ponte no Rio São Francisco 



A Rua dos Índios nunca mais foi a mesma desde que os primeiros roncos de máquinas pesadas cortaram o silêncio ancestral da aldeia. Era o ano de 1969, quando gigantes de ferro começaram a riscar a terra entre Porto Real do Colégio, em Alagoas, e Propriá, em Sergipe. Os velhos, sentados em suas cadeiras de palha, olhavam desconfiados os caminhões que faziam tremer o chão como se anunciassem uma nova era.


Na antiga sede da fábrica de arroz, às margens da Rua dos Índios, ergueu-se o acampamento da COENG S/A — a empresa que viera construir a rodovia BR-101. Do dia para a noite, o espaço se encheu de barulho: eram martelos, pás, escavadeiras, tratores e homens suando sob o sol quente do sertão. Mas não eram apenas forasteiros — muitos indígenas Kariri-Xocó também foram contratados, agora com carteira assinada, para trabalhar como serventes, pedreiros, operadores de máquinas.


Entre os mais velhos, havia certo orgulho e receio. A estrada era símbolo de progresso, diziam, mas também carregava um rugido desconhecido. No entanto, o que mais despertava a atenção de todos era a grandiosa promessa que pairava sobre o Rio São Francisco: a construção de uma ponte de concreto ligando Colégio a Propriá. Uma travessia que há muito tempo era feita por barcaças e canoas, agora ganharia corpo de pedra sobre as águas.


A obra levou três longos anos. O movimento era incessante: pás carregadeiras e rolos compactadores dançavam sobre o barro vermelho como se esculpissem um novo caminho. A rua virou oficina viva — havia tornearia, depósitos de peças, engenheiros, topógrafos, cozinheiras, e risos no fim do dia. Crianças espiavam entre os paus-de-arara e, entre os adultos, crescia a lenda.


Foi assim que os anciãos batizaram a ponte ainda em construção com o nome de Uocró Idabacrú — "Caminho de Pedra Sobre o Rio". O nome brotou da língua e do espírito do povo, pois não era só concreto: era passagem, era transformação.


Quando a COENG partiu em 1970, outra empresa chegou para continuar o serviço de pavimentação, foi a Construtora Andrade Gutierrez, para fazer a pavimentação de asfalto na BR 101. Mais indígenas foram chamados. E o trabalho seguiu, ritmado pela esperança e pela poeira. A notícia se espalhava nas rodas de toré, nas feiras e nas casas: a ponte estava quase pronta. 


Então, finalmente, no dia 5 de dezembro de 1972, o céu de Colégio acordou diferente. O sol parecia brilhar com mais força sobre o leito do Velho Chico. Era o dia da inauguração. Autoridades municipais, estaduais e até representantes do governo federal desceram sobre a aldeia. O povo se alinhou às margens da ponte, alguns com roupa de festa, outros ainda com a poeira do chão.


E foi então que o primeiro trem atravessou a ponte, seguido por carros de muitos modelos e cores. Alguns homens choraram, outros bateram palmas. Os mais jovens não entenderam de imediato, mas os velhos sabiam: estavam testemunhando um rito de passagem entre dois mundos.


A ponte foi entregue ao tempo. Mas o nome indígena, Uocró Idabacrú, ficou cravado não nas placas, mas na memória. Um caminho de pedra, sim — mas também de história, suor e pertencimento.





09. ATSEMIUCAN, PESSOA LEVA COISA BOA PARA VENDER 





Um Conto Sobre Vendedores Ambulantes 



No tempo em que a Rua dos Índios ainda pulsava com o som dos maracás, das panelas batendo e das conversas nas portas, uma caminhante se aproximava da aldeia. Seu nome era Aparecida, mas todos conheciam como Dona Aparecida. Era assim que os mais velhos, como o Cacique Otávio Nidé, a chamavam.


— Lá vem Dona Aparecida! — dizia ele, sorrindo ao ver a mulher surgir do fim da estrada de terra, trazendo uma caminhonete com o coração cheio de histórias. Os indígenas deram o nome às pessoas ambulantes como Atsemiucan — “Pessoa que Leva Coisa Boa Para Vender”.


A palavra não existia antes no idioma, mas os anciões Kariri-Xocó a criaram juntando os saberes da língua:


Atse (Pessoa), Miui (Leva), Canghité (Coisa boa), e Taiu (Dinheiro).


Dona Aparecida carregava não só objetos — carregava o novo tempo.


Com ela vinham panelas de alumínio que brilhavam como lua cheia, talheres que pareciam de prata, cobertores, roupas, chácara, pratos belezas, perfumes fortes que lembravam flor que não nasce por aqui. E tudo era mostrado com alegria:


— Olha aqui, Dona Lurde! Panela que cozinha feijão mais rápido que fogo de lenha!


Ela ria, desconfiada.


— E paga como, mulher?


— Parcelado, minha senhora. Parcelado até a última lua do ano.


Os prestanistas, como eram chamados, não vinham apenas vender — vinham conviver. Eram recebidos com café de beiju e farinha fresca. Com o tempo, ficaram íntimos. Os nomes viraram lembrança na memória de toda uma geração: Dona Glorinha, que trazia vestidos floridos; o Senhor Pessoa, que vendia quadros de fotos e santos; Zeca do Fumo, sempre com um cigarro de palha na boca e uma piada na ponta da língua; e Francisco, que oferecia cadeiras, redes, chapéus até conselhos junto com seus produtos.


Em 1978, os Kariri-Xocó deixaram a Rua dos Índios, mas o espírito de Atsemiucan não foi embora. Hoje, as novas gerações continuam essa tradição. Agora, é o próprio povo indígena que parte para vender: levando cerâmicas, colares, cestos, bonecas de barro — e principalmente a força da sua cultura.


Atsemiucan não é mais só um nome.


É um espírito de troca, de confiança, de aprendizado entre mundos.


Por isso, todo menino que vê um caminhante chegar com um balaio de coisas boas pergunta:


— Vovô, ele é um Atsemiucan?


E o velho Kariri-Xocó, com sabedoria, responde:


— Sim, meu neto. Ele é mais que isso. Ele é parte da nossa história.





10. ERÁ UANIE CANGHITÉ CARAÍ, CASA INDÍGENA COM COISAS BOAS DE BRANCOS 


 





Um Conto Sobre Coisas dos Brancos



Num tempo que não é nem velho nem novo, no meio de um povo onde os ventos ainda cantam os nomes dos ancestrais, havia uma aldeia onde o antigo e o moderno caminhavam lado a lado. Lá vivia Tupichá, um menino curioso, de olhos atentos e pés descalços, que adorava ouvir as histórias contadas por seu avô Aniru.


Tupichá morava com sua família numa casa diferente das casas redondas dos tempos antigos. Era uma "eracró", feita de tijolos e cimento, mas com alma de "erá". Na sala, havia uma coisa que ele chamava de Warudókli, “o espelho que fala”. Era uma TV que mostrava imagens de mundos que ele nunca viu, mas que o faziam sonhar.


— Vovô, por que a gente tem tanta coisa dos caraí aqui em casa? — perguntou Tupichá certa tarde, enquanto mexia nos botões do Pepéwahimy, o videogame.


O velho Aniru, sentado em sua rede, sorriu com paciência:


— Porque o nosso povo aprendeu a caminhar com dois mundos, neto. As coisas dos brancos entraram em nossas casas, mas não podem apagar o que somos por dentro.


Tupichá olhou ao redor. Lá estavam o Pohiesawa, a câmara de vídeo da sua irmã Jariúna, que gostava de gravar as festas da aldeia; o Craiwopiwon, que girava e mostrava filmes; e o velho Craiwonhé, o toca-discos do seu tio Kaubi, que ainda fazia dançar ao som de músicas antigas.


Na cozinha, a mãe de Tupichá usava o Crameupudu, o fogão que soprava fogo, para preparar a comida. E a Cramenunhí, a geladeira, guardava as frutas e o peixe do rio.


Ao redor da casa, os caminhos de terra vermelha estavam marcados por trilhas de Ibáranú Uitane Iworó, as motos que chegavam roncando, por bicicletas Ibaworóbi e até por um Ibákabaru, a carroça puxada por burro do velho Ti'Paié.


Mas nem tudo era novo. Na parede, o Uché Iworó, o relógio, marcava as horas, mas era o canto do Inambu que dizia quando era tempo de caçar. Em cima da mesa, havia o Tonranran Toklikli, os livros com folhas que falavam, e também os Torãkemwa, as revistas com imagens coloridas, e os Torãpisetí, os cordéis pendurados em um fio de arame que o vento adorava ler.


No quarto, Tupichá guardava com carinho suas Tsepinehekié, as bonecas que seu avô esculpiu, com rostos de madeira e olhos de sabedoria.


Na sala de memória da casa, repousavam o Keisontsebu, o cocal de penas usado nos rituais; os Ubadi, os enfeites da alma; o Buibú, o maracá que o avô usava para chamar o Toré; e o Seridzé e Yarú, o arco e flecha que ainda eram ensinados, não para guerra, mas para lembrar a força dos antigos.


Tupichá aprendeu que a Erá Uanie Canghité Caraí era mais do que uma casa com coisas dos brancos. Era um lugar onde as lembranças e os futuros caminhavam juntos. Onde as caixas que cantam, giram e esfriam conviviam com a sabedoria das folhas que falam, dos bonecos que brincam e das flechas que apontam o caminho do coração.


E assim, na casa de Tupichá, o tempo dançava com as rodas, as palavras se misturavam em muitos sons, e a cultura vivia — transformada, mas jamais esquecida.




Autor dos Contos: Nhenety Kariri-Xocó 





🔻 APÊNDICES



Apêndice A – Glossário



Atsemiucan — os indígenas deram o nome às pessoas ambulantes que leva coisa para vender, neologismo do Kariri, Atse (Pessoa), Miui (Leva), Canghité (Coisa boa), e Taiu (Dinheiro).


Canghité  —  coisas boas, objetos materiais e imateriais, aquilo que faz bem para o corpo e espírito. 


Caraí — o homem branco, europeu, portugueses que vieram no início da colonização do Brasil. 


Erá — o nome que os indígenas Kariri chamavam a casa de moradia, feita de palha, barro e madeira. 


Idabacrú — sobre o rio, neologismo, vem do Kariri,  Idaba "sobre" e Cru "rio", portanto Idabacrú. 


Idibunhá — na língua Kariri Idi "coração" e bunhá "barro", quer dizer trabalho na argila com meu amor à terra, ela dará nosso sustento.


Kariri-Xocó – Povo indígena de Porto Real do Colégio (AL), cuja cultura resiste e se reinventa frente às transformações históricas.


Maecrótçawo — vem do neologismo da origem Kariri, “cerca” é maená, “pedra” é cró, “cortar” é tçate e “rio” é iwo, se a cerca feita de pedra corta o rio, o nome dado para as hidrelétricas pelos indígenas. 


Naté — o nome de trabalho chamado pelos Kariri do Nordeste brasileiro, referente às atividades em geral: agricultura, cerâmica, artesanato e afins. 


Tasí — o nome da enxada dada pelos Kariri,  quando tiveram seu primeiro contato com a colonização, instrumento de trabalhar na agricultura. 


Toré – Ritual sagrado que fortalece o espírito e sustenta o povo diante das transições e desafios do mundo moderno.


Uanie — o nome de indígena dado pelos Kariri Dzubukuá do Rio São Francisco, pessoa nativas do lugar. 


Ubacródzu — que, na língua dos Kariri-Xocó, significa “A Canoa do Porto das Pedras”, embarcação grande que as ceramistas vendiam e trocavam suas peças nos povoados ribeirinhos. 


Uché  — o tempo que passa ao longo dos anos, duração, pode significar períodos das estações, plantio, marcação de acontecimentos. 


Uocró  — o caminho de pedras, estrada com pedregulhos, rochas no percurso de locomoção. 


Urucum – Cor e proteção, símbolo de resistência e identidade.


Wanheré — o nome de fazendo chamada pelos antigos Kariri, lugar de criação de gado nas margens do Rio São Francisco no início do século XVII. 


Wirapararã — o engenhoca, um aparelho rudimentar que os antigos Kariri chamavam de “engenho”, anos se passaram e vieram as usinas de cana-de-açúcar. 


Woroy – Fluxo do tempo e da caminhada ancestral; o movimento que guia o povo em meio às mudanças



Apêndice B – Observações Culturais



Este volume, Sobrevivendo às Mudanças, reflete um tema profundo e universal: a capacidade do povo Kariri-Xocó de se mover entre transformações sem perder sua essência.

Os contos aqui reunidos mostram conflitos, adaptações e renovações — desde a chegada de novos costumes até os impactos do tempo moderno no território, na espiritualidade e na vida comunitária.


A cada mudança, a cultura resiste e se recria.

A cada desafio, a memória fala.

Os contos deste volume revelam essa força viva, onde o povo encontra caminhos para continuar existindo sem abandonar aquilo que o define.





🔻 DADOS BIOGRÁFICOS DO AUTOR



Nhenety Kariri-Xocó, guardião de histórias e pesquisador das tradições ancestrais, traz neste Volume 7 uma reflexão profunda sobre a sobrevivência cultural diante das mudanças impostas pelo tempo.

Indígena do povo Kariri-Xocó, cresceu na Rua dos Índios, território sagrado onde aprendeu a ver o mundo pelos olhos dos mais velhos e dos Encantados.


É escritor, contador de histórias, criador de cordéis, estudioso das raízes indígenas e ponte entre gerações. Seu trabalho resiste às mudanças ao preservar saberes e transformar memórias em literatura viva.

Sua missão é registrar, honrar e compartilhar aquilo que seu povo carrega há séculos.





🔻 ORELHA DO LIVRO



Woroy História, Kariri-Xocó, Sobrevivendo às Mudanças – Volume 7 é um livro que nasce da força ancestral aliada ao olhar atento do presente.

Cada conto revela uma travessia: a travessia da cultura indígena diante das constantes mudanças do mundo — tecnológicas, sociais, espirituais e climáticas.


O leitor encontrará histórias que falam de adaptação, resistência e continuidade.

São narrativas que mostram que sobreviver não é apenas resistir, mas se transformar sem romper com a raiz.


Nhenety Kariri-Xocó nos guia pela Rua dos Índios em um percurso essencial:

como o povo mantém viva sua identidade quando tudo ao redor muda?

As histórias reunidas aqui respondem com poesia, força e verdade.





🔻 FICHA CATALOGRÁFICA / FICHA TÉCNICA (reformulada)



Nhenety Kariri-Xocó

Woroy História, Kariri-Xocó, Sobrevivendo às Mudanças

Contos – Volume 7 – Coletânea


Assuntos:


Literatura indígena


Contos


Cultura Kariri-Xocó


Resistência indígena


Transformações culturais


Memória ancestral


Sobrevivência simbólica


CDD: 899.92 – Literaturas indígenas


Ficha Técnica:

– Autor: Nhenety Kariri-Xocó

– Revisão: [nome opcional]

– Diagramação: [nome opcional]

– Arte da Capa: (a ser gerada digitalmente)

– Ano: 2025

– Idioma: Português

– Editora: [nome opcional]

– Local: Brasil







Autor: Nhenety Kariri-Xocó 



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