A relação do Império Romano com a Península Ibérica entre 70 d.C. e 476 d.C. envolve a presença de romanos, cristãos e judeus sob diferentes políticas imperiais, incluindo éditos e concílios que moldaram a convivência e os conflitos entre esses grupos.
1. O Império Romano e a Península Ibérica (70-476 d.C.)
A Península Ibérica estava sob domínio romano desde as Guerras Púnicas (218-201 a.C.), e no período de 70 d.C. a 476 d.C., ela permaneceu uma parte essencial do império. Durante esse tempo, a população era formada por romanos, povos locais romanizados (celtiberos, lusitanos) e minorias religiosas, como judeus e, posteriormente, cristãos.
1.1. Judeus na Península Ibérica
Já havia comunidades judaicas na Península desde o período republicano de Roma.
Após a destruição do Segundo Templo em Jerusalém (70 d.C.), um número maior de judeus chegou à Península como prisioneiros ou refugiados.
A princípio, os judeus tinham relativa liberdade religiosa, mas isso mudou com o crescimento do cristianismo e a legislação imperial.
1.2. Cristãos na Península Ibérica
O cristianismo começou a se expandir na Península ainda no século I e II d.C., mas sofreu perseguições esporádicas, como durante o reinado de Décio (249-251) e Diocleciano (303-311).
Com a conversão de Constantino e o Édito de Milão (313), o cristianismo foi legalizado, e a Igreja começou a se organizar mais formalmente na Península.
2. Leis e Políticas Imperiais Importantes
2.1. Antes de Constantino (70-312 d.C.)
Durante esse período, o cristianismo era uma religião minoritária e ilegal, enquanto os judeus tinham certa autonomia, mas eram vistos com desconfiança.
Édito de César Augusto (20 a.C.) – Permitira que judeus praticassem sua fé, sem serem forçados a adorar deuses romanos.
Perseguições aos cristãos:
Sob Nero (64 d.C.), Domiciano (81-96), Trajano (98-117), Décio (249-251) e Diocleciano (303-311).
Judeus também sofreram restrições após as revoltas judaicas (66-73 e 132-135).
Édito de Caracala (212 d.C.) – Concedeu cidadania romana a todos os habitantes livres do Império, incluindo judeus e cristãos.
2.2. Após a Conversão de Constantino (312-476 d.C.)
Com a ascensão do cristianismo ao poder imperial, a relação com os judeus e outras religiões começou a mudar.
Édito de Milão (313) – Legalizou o cristianismo e garantiu liberdade religiosa no império.
Concílio de Nicéia (325) – Organizou a doutrina cristã e condenou heresias.
Édito de Tessalônica (380) – O imperador Teodósio I declarou o cristianismo niceno a religião oficial do Império.
Concílio de Toledo (400, 447, 589, etc.) – Na Península Ibérica, os concílios começaram a impor restrições aos judeus e fortaleceram a relação entre Igreja e Estado.
2.3. Restrição aos Judeus
Leis Teodosianas (393-438) – Restringiram direitos judaicos, proibindo conversões ao judaísmo e impedindo casamentos entre judeus e cristãos.
Concílios de Toledo – Impuseram mais restrições aos judeus, culminando em conversões forçadas no século VII.
3. A Queda do Império Romano e a Península Ibérica
Em 476 d.C., o Império Romano do Ocidente caiu, mas a Península Ibérica já estava sob crescente influência dos visigodos, que adotaram inicialmente o arianismo e depois se converteram ao cristianismo niceno.
Impacto da Queda
A Igreja tornou-se a instituição dominante, com influência sobre leis e sociedade.
Os visigodos impuseram mais restrições aos judeus, culminando na conversão forçada sob o rei Sisebuto (612-621).
Conclusão
A relação do Império Romano com a Península Ibérica entre 70 e 476 d.C. foi marcada pela integração cultural e religiosa, pela romanização dos povos locais, pela perseguição inicial ao cristianismo e depois sua ascensão ao poder. As leis e concílios refletem essa transformação, impactando diretamente cristãos e judeus, com consequências que se estenderiam à Idade Média.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
Livros e artigos acadêmicos
1. BOWDER, Diana. Civilização Romana. Lisboa: Edições 70, 1993.
Aborda a organização social, política e religiosa do Império Romano.
2. GOODMAN, Martin. Rome and Jerusalem: The Clash of Ancient Civilizations. London: Penguin Books, 2008.
Explora a relação entre Roma e os judeus, incluindo as diásporas e perseguições.
3. HEATHER, Peter. The Fall of the Roman Empire: A New History of Rome and the Barbarians. Oxford: Oxford University Press, 2005.
Explica a queda do Império Romano e seus efeitos na Península Ibérica.
4. MARQUES, A. H. de Oliveira. História de Portugal, Vol. 1 – Das Origens ao Renascimento. Lisboa: Presença, 1997.
Traz informações sobre a romanização e o impacto do cristianismo na Península Ibérica.
5. MITCHELL, Stephen. A History of the Later Roman Empire: AD 284–641. Oxford: Blackwell, 2007.
Detalha o período de Constantino e as leis religiosas.
6. RODRÍGUEZ NEILA, Juan Francisco. Cristianos y judíos en la Hispania romana y visigoda. Granada: Universidad de Granada, 1995.
Analisa a convivência e os conflitos entre cristãos e judeus na Península Ibérica.
7. SCHAFF, Philip. History of the Christian Church, Volume III: Nicene and Post-Nicene Christianity. New York: Charles Scribner's Sons, 1910.
Traz informações sobre os concílios e as leis cristãs no Império Romano.
8. WILLIAMS, Stephen. Diocletian and the Roman Recovery. London: Routledge, 1997.
Foca nas reformas de Diocleciano, incluindo perseguições aos cristãos.
Fontes primárias (Éditos e Leis)
1. Código Teodosiano (438 d.C.)
Disponível em: https://droitromain.univ-grenoble-alpes.fr/ (em latim e francês) . Acesso em: 30 mar. 2025.
2. Édito de Milão (313 d.C.)
Disponível em traduções acadêmicas, como na obra de Schaff (History of the Christian Church).
3. Concílio de Nicéia (325 d.C.) – Cânones
Disponível em: https://www.ccel.org/ccel/schaff/npnf214.txt . Acesso em: 30 mar. 2025.
4. Concílios de Toledo (400-589 d.C.)
Traduções acadêmicas podem ser encontradas em coleções sobre os visigodos e a Igreja Ibérica.
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