quarta-feira, 26 de abril de 2023

SUGESTÕES DE NÚMEROS UM ATÉ UM BILHÃO


 (Parte 2)



 Dando continuidade ao texto anterior, irei prosseguir para os números maiores. Antes de continuar, gostaria de pôr outra sugestão dentro dos neologismos que criei anteriormente, especificamente para os números de 6-8, eu estou me inspirando tanto nos números Kariri como nos da língua Guató que seguem descrições similares, caso o tamanho do número seja grande demais, recomenda a remoção do elemento i-bâ 'mão dele', portanto os números passam de ârokiibâ, âlikiibâ, kiploibâ para âroki, âliki, kiplo, ficando mais curto e não perdendo seu sentido anterior. Concluí o que tinha para dizer, aqui estão os números:




11 = Neologismo *(s/y)-â-wi-te (ele, a coisa que vem na frente)


Dz.: yâwite

Kp.: sẽwitè, senwitè

Sp.: seiwité

Km.: sawitè

Kt.: sóvite

KX.: sâwite, yâwite

Pp.: sãewite

Dz-Tx.: yowite


12 = Neologismo *(lya)wi-po(po) (número irmão mais velho)


Dz.: wipo, wipopo

Kp.: wipò, wipopò

Sp.: wipó, wipopó

Km.: wipò, wipopò

Kt.: vipo, vipopo

KX.: wipó, wipopó

Pp.: wipô, wipôpô

Dz-Tx.: wipo, wipopo


13 = Neologismo *i-de ((ele) está perto)


Dz.: ide

Kp.: idè

Sp.: ité

Km.: itè

Kt.: ide

KX.: idé

Pp.: idê

Dz-Tx.: ide


14 = Neologismo *s-u-ma ((ele) é inimigo)


Dz.: uma

Kp.: sumà

Sp.: sumá

Km.: sumà

Kt.: uma

KX.: sumá

Pp.: suma

Dz-Tx.: uma


15 = Neologismo *lya-dze(dze) (número irmã mais velha)


Dz.: lyadze

Kp.: ryadzè

Sp.: lyatsé

Km.: lyatsè

Kt.: ryaze

KX.: lyadzé, ryadzé

Pp.: ryadzê

Dz-Tx.: lyadze


16 = Neologismo *dze-bi(gâ) (quinze e um)


Dz.: dzebi

Kp.: dzebì

Sp.: tsebí

Km.: tsebì

Kt.: zebi

KX.: dzebí

Pp.: dzêbi

Dz-Tx.: dzebi


17 = Neologismo *dze-ca(n(e/i)) (quinze e dois)


Dz.: dzeta

Kp.: dzechà

Sp.: tseká

Km.: tsekà

Kt.: zesha

KX.: dzechá, dzetá

Pp.: dzêcha

Dz-Tx.: dzeta


18 = Neologismo *dze-(wVcan(e/i))(di)ke (quinze e três)


Dz.: dzeke

Kp.: dzekiè

Sp.: tseké

Km.: tsekè

Kt.: zeke

KX.: dzeké, dzekié

Pp.: dzêkyê

Dz-Tx.: dzeke


19 = Neologismo *dze-so (quinze e quatro)


Dz.: dzeho

Kp.: dzesò

Sp.: tsesó

Km.: tsesò

Kt.: zeo

KX.: dzesó

Pp.: dzêsô

Dz-Tx.: dzeso


20 = Neologismo *pri (todos)


Dz.: pri

Kp.: prì

Sp.: prí

Km.: prì

Kt.: pri

KX.: prí

Pp.: pri

Dz-Tx.: pri


30 = *ca(n(e/i))-dze (dois quinze)


Dz.: tadze

Kp.: chadzè

Sp.: katsé

Km.: katsè

Kt.: shaze

KX.: chadzé

Pp.: chadzê

Dz-Tx.: tadze


40 = *ca(n(e/i))-pri (dois vinte)


Dz.: tapri

Kp.: chaprì

Sp.: kaprí

Km.: kaprì

Kt.: shapri

KX.: chaprí

Pp.: chapri

Dz-Tx.: tapri


50 = *lya-pa (número pai)


Dz.: lyapa

Kp.: ryapà

Sp.: lyapá

Km.: lyapà

Kt.: ryapa

KX.: lyapá, ryapá

Pp.: ryapá

Dz-Tx.: lyapa


60 = *so-ñe (4-antes (do cem) no sentido de ter 4 dezenas antes do número 100)


Dz.: hoñe

Kp.: sonhè

Sp.: sonyé

Km.: sonyè

Kt.: oñe

KX.: sonhé

Pp.: sonhê

Dz-Tx.: hoñe


70 = *ke-ñe (3-antes (do cem))


Dz.: keñe

Kp.: kienhè

Sp.: kenyé

Km.: kenyè

Kt.: kyeñe

KX.: kenhé, kyenhé

Pp.: kyenhê

Dz-Tx.: keñe


80 = *ca(n(e/i))-ñe (2-antes (do cem))


Dz.: tañe

Kp.: chanhè

Sp.: kanyé

Km.: kanyè

Kt.: shañe

KX.: tanhé, chanhé

Pp.: chanhê

Dz-Tx.: tañe


90 = *bi(gâ)-ñe (1-antes (do cem))


Dz.: biñe

Kp.: binhè

Sp.: binyé

Km.: binyè

Kt.: biñe

KX.: binhé

Pp.: binhê

Dz-Tx.: biñe


100 = *lya-dyé (número mãe)


Dz.: lyadê

Kp.: ryadé

Sp.: lyagái

Km.: lyagài

Kt.: ryadé

KX.: ryadê, lyadê

Pp.: ryadé

Dz-Tx.: lyade


200 = *ca(n(e/i))-dyé (dois-cem)


Dz.: tadê

Kp.: chadè

Sp.: kagái

Km.: kagài

Kt.: shadé

KX.: chadê, tadê

Pp.: chadé

Dz-Tx.: tade


300 = *(wV(ti)can(e/i)(di)ke-dyé (três-cem)


Dz.: kedê

Kp.: kiedè

Sp.: kegái

Km.: kegài

Kt.: kyedé

KX.: kedê, kyedê

Pp.: kyedé

Dz-Tx.: kede


400 = *so-dyé (quatro-cem)


Dz.: hodê

Kp.: sodè

Sp.: sogái

Km.: sogài

Kt.: odé

KX.: sodê, hodê

Pp.: sodé

Dz-Tx.: hode


500 = *(mû)ca-dyé (cinco-cem)


Dz.: dhadê

Kp.: sadè

Sp.: sagái

Km.: sagài

Kt.: sadé

KX.: sadê, dhadê

Pp.: sadé

Dz-Tx.: dhade


600 = âro-dyé (seis-cem)


Dz.: ârodê

Kp.: erodè

Sp.: eirogái

Km.: arogài

Kt.: órodé

KX.: ârodê

Pp.: aerodé

Dz-Tx.: arode


700 = âli-dyé ou roho-dyé (sete-cem)


Dz.: âmlidê

Kp.: rohodè

Sp.: eiligái

Km.: aligài

Kt.: rohodé

KX.: âlidê

Pp.: rohodé

Dz-Tx.: ãlide


800 = *kip(r/l)o-dyê (oito-cem)


Dz.: kiprodê, kiplodê

Kp.: kiprodè

Sp.: kiprogái, kiplogái

Km.: kiprogài, kiplogài

Kt.: kiprodé

KX.: kiprodê, kiplodê

Pp.: kiprodé

Dz-Tx.: kiprode, kiplode


900 = *(iki)ma(rã)-dyé (nove-cem)


Dz.: madê

Kp.: madè

Sp.: magái

Km.: magài

Kt.: madé

KX.: madê

Pp.: madé

Dz-Tx.: madhe


1000 = yâ (deriva do Kariri *yâ 'grande')


Todos os números a partir de agora seguirão a mesma lógica que os anteriores, dois-mil, três-mil e etc, portanto não irei repetir todo o processo e só irei dar o número, caso haja dúvidas, reveja os números de 100 até 900 e use eles como base para saber como o processo foi feito, por exemplo, eu usei apenas *ma* de ikimarã em 900, portanto continuarei a usar só o ma a partir de agora, sem inconsistências.


2000 = ca(n(e/i))-yâ (dois-mil)


Dz.: tayâ

Kp.: chayẽ, chayen

Sp.: kayéi

Km.: kayà

Kt.: shayó

KX.: chayâ, tayâ

Pp.: chayãe

Dz-Tx.: taye


10000 = bâ-yâ (dez-mil)


Dz.: bâyâ

Kp.: boyẽ, boyen

Sp.: peiyéi

Km.: payà

Kt.: bóyó

KX.: bâyâ

Pp.: baeyãe

Dz-Tx.: boye


20000 = pri-yâ (vinte-mil)


Dz.: priyâ

Kp.: priyẽ, priyen

Sp.: priyéi

Km.: priyà

Kt.: priyó

KX.: priyâ

Pp.: priyãe

Dz-Tx.: priye


100000 = dyé-yâ (cem-mil)


Dz.: dêyâ

Kp.: deyẽ, deyen

Sp.: gaiyéi

Km.: gaiyà

Kt.: déyó

KX.: dêyâ

Pp.: déyãe

Dz-Tx.: deye


200000 = cadyé-yâ (duzentos-mil)


Dz.: tadêyâ

Kp.: chadeyẽ, chadeyen

Sp.: kagaiyéi

Km.: kagaiyà

Kt.: shadéyó

KX.: chadêyâ

Pp.: chedéyãe

Dz-Tx.: tadeye


1000000 = *mâ (milhão, derivado do Proto-Kariri *mâ 'mais')


Dz.: mâm

Kp.: mae

Sp.: méi

Km.: mà

Kt.: mó

KX.: mâ

Pp.: mae

Dz-Tx.: mã


10000000 = *bâ-mâ (dez-milhão)


Dz.: bâmâm

Kp.: bomae

Sp.: peiméi

Km.: pamà

Kt.: bómó

KX.: bâmâ

Pp.: baemae

Dz-Tx.: bomã


100000000 = *dyé-mâ (cem-milhão)


Dz.: dêmâ

Kp.: demae

Sp.: gaiméi

Km.: gaimà

Kt.: démó

KX.: dêmâ

Pp.: démae

Dz-Tx.: demã


1000000000 = *wi-lo (número-bilhão, derivado do Proto-Kariri *lo 'todos')


Dz.: wilo

Kp.: wirò

Sp.: wiló

Km.: wilò

Kt.: viro

KX.: wiló, wiró

Pp.: wirô

Dz-Tx.: wilo



Autor da matéria: Ari Loussant 


SUGESTÕES DE NÚMEROS UM ATÉ UM BILHÃO


( Parte 1 )



Lembro que há alguns meses atrás eu falei que não tinha intenção de alterar o sistema numeral que eu havia sugerido, pois na época eu estava satisfeito, no entanto com minha nova motivação de fazer as coisas de forma que eu percebo como mais autêntica, eu decidi revisitar este tópico com duas sugestões.



 Sim, duas sugestões, eu irei fazer uma versão resumida dos números entregues para nós por Mamiani, seguindo uma lógica similar a este, e logo irei sugerir uma versão com palavras no mínimo monossilábica, no máximo di ou trissilábica, seguindo a lógica dos números do Kipeá, vamos para a primeira sugestão.



 No ano passado eu lembro de publicado minha hipótese sobre o numeral quatro *Sumarã Orobae*, minha hipótese anterior foi de que Su-marã Oro-bae seria '3-inimigo este-todos' ou seja 'inimigo de todos estes' sendo que 'todos estes' se refere aos dedos anteriores, e inimigo é uma forma nativa do Kariri de dizer 'contrário', então a tradução mais adequada seria 'contrário de todos estes (dedos)', esta hipótese se sustenta na possibilidade de ORO ser uma variante de ERO, um demonstrativo proximal cujo o prefixo E- é um schwa, comprovado pelo Dzubukuá *ANRO*, portanto a vogal poderia facilmente se modificar de *e* para *o*. No entanto, não levei em consideração na época a possibilidade de RO não estar conectado ao ORO e sim estar conectado ao BAE, formando ROBAE 'todos', uma palavra que surge no catecismo de Mamiani e tem como se cognato LOBOE no Dzubukuá. Com tudo isso dito creio que se a primeira hipótese estiver errada eu deva reconstruir o significado como '3-inimigo ?-todos', portanto 'inimigos de todos ?', sendo que o ponto de interrogação representa o O, cujo o significado ainda é um mistério na segunda hipótese.



 Bom, parando de falar sobre detalhes, o que importa no momento são os números, há alguns meses atrás eu expliquei sua lógica, a lógica sendo 'leva/é levado/recebe X (dedo(s) da) mão para ele', sendo que X representa numerais diferentes, por exemplo, se na frase surgisse wachani seria 'leva/é levado/recebe dois (dedo(s) da) mão para ele', esta contagem já implica que o número cinco está contado, portanto você está contando com a outra mão e levando números extras com ela, portanto você adicionou dois ao cinco anterior, formando o número sete, a lógica é simples, porém é explicada de forma extensa que não ajuda na hora de contar, portanto agora irei propor uma lógica nativa de contar os números.



 Eu estudei ontem os numerais da língua Guató, outra língua indígena que estava ameaçada de extinção, a língua Guató possui algumas similaridades com a língua Kariri, ambas utilizam em sua gigantesca maioria de raízes monossilábicas (até mesmo palavras polissilábicas são formadas por compostos de raízes de uma sílaba), tem o padrão silábico (C)V, bastante similar ao padrão mais comum que é CV nas línguas Kariri, os numerais daquela língua seguem um padrão similar ao encontrado no Kipeá, só que explicada de forma mais simples e adequada para contagem:



Seis, tšenekaéhera, C. tchenai-caicaira.


Cf. n°420 tšénehe ‘um’. Para hera, cf. n°424 tóhera ‘cinco’, n°14 mará


‘mão’.


/t͡ʃéne kaéka i-ɾá/ um ? 3-mão



426. Sete, dunikaéhera, C. dououini-caicaira.


Cf. n°421 dúni ‘dois. Para hera, cf. n°424 tóhera ‘cinco’, n°14 mará ‘mão’.


/dúni kaéka i-ɾá/ dois ? 3-mão



427. Oito, tšumokaéhera, C. tchoum-caicaira.


Cf. n°422 tšúmo ‘três’. Para hera, cf. n°424 tóhera ‘cinco’, n°14 mará ‘mão’.


/t͡ʃúmu kaéka i-ɾá/ três ? 3-mão



428. Nove, deka(i)rkaékaira, C. dekai-caicaira.


Cf. n°423 deéka(i)r ‘quatro’. Para hera, cf. n°424 tóhera ‘cinco’, n°14 mará


‘mão’.


/ɾékai kaéka i-ɾá/ quatro ? 3-mão



 Vejam na última parte de cada número, no texto que está com barras / /, tem uma descrição logo do lado como "quatro ? 3-mão", indicando que Schmidt, o autor de "Guató: A língua" sabia de quase todos os elementos que formam aquele número, não se sabe o que é kaéka, mas se pode inferir que a frase contava 4 coisas ao lado da mão (5), fomando 4 + 5 = 9 e é essa lógica que começa no seis e termina no nove que os Guatós seguiam. Depois vamos para o número 10:



Dez, kínyuira, C. quinoida.


Para ra, cf. n°14 mará ‘mão’.


/kı̃́nu i-ɾá/ COMP.dez 3-mão



 A palavra kínyu é independente, mas vejam que mão aparece novamente, pode se inferir que a kínyu completava a contagem dos números a partir da mão, isso fica claro com o próximo número:



Onze, tšenehebó, C. tchenai-ai-caibo.


Cf. n°420 tšénehe ‘um’, n°20 mabó ‘pé’.


/t͡ʃéne i-bɔ/ um 3-pé



Vejam que abaixo a frase 3-mão foi trocada por 3-pé, indicando a forma como os Guatós contavam, eles implicavam que todos os dedos da mão estão sendo contados e agora eles estão adicionando mais com os dedos dos pé. Essa lógica também pode ser vista no numeral 20 do Kipeá que tem ibŷ 'pé dele(a)' em 'mycribrae misã ideho iby saí' que é 'ser levado toda as mãos com o pé (dele(a)) para ele(a)'. É essa mesmíssima lógica que eu gostaria de aplicar para todas as línguas da família Kariri para facilitar a contagem e ao mesmo tempo seguir uma lógica nativa, aqui estão minhas sugestões:



1 = Proto-Kariri *bigâ 'um, pessoa, alguém' ou *gébâ 'um'


Dz.: bighâ


Kp.: bihè


Sp.: bigéi, bichéi, gaibéi


Km.: bigà, biggà, gaibèi


Kt.: bighó


KX.: bighâ


Pp.: bigae


Dz-Tx.: bihe



2 = Proto-Kariri *(lia)wV-(ti)can(e/i) 'dois'


Dz.: witane


Kp.: wachani 


Sp.: lyawithikaní


Km.: lyawittikanì


Kt.: washani


KX.: witané, wachaní


Pp.: wachani


Dz-Tx.: witane



3 = Proto-Kariri *(lia)wV-(ti)can(e/i)(di)k(j)e 'três'


Dz.: witanedike


Kp.: wachanidikiè


Sp.: lyawithikaniké


Km.: lyawittikanikè


Kt.: washanidikye


KX.: witanediké, wachanidikyé


Pp.: wachanidikyê


Dz-Tx.: witanedike



Obs.: Eu notei que Aryon Rodrigues tinha mencionado que ele só pôde analisar os morfemas -dikie do Kipeá como as negações -dŷ e -kie, mas logo ele diz que não se adapta ao caso desse número, eu concordo, creio que mais análises devam ser feitas observando as palavras kanatsi 'amanhã' e kanatsikye 'diariamente' do Dzubukuá, cujo não parece estar sufixada com uma negação e sim uma palavra que indica continuidade, talvez o -kie de wachanidikie indique a 'continuação após o dois' ou 'aquilo que sempre vem depois do número dois'.



4 = Neologismo: *lyawi-so 'PFX.NMRL-contra'


 Seguindo a lógica do quatro ser o número contrário aos últimos três, *ljawi- sendo reconstruído a partir do Kamurú como um prefixo de numerais, também existindo a possibilidade dessa ter sido a palavra para 'número' naquela língua.



Dz.: lyawiho


Kp.: riawisò


Sp.: lyawisó


Km.: lyawisò


Kt.: ryavio


KX.: lyawiso, lyawiho


Pp.: ryawisô


Dz-Tx.: lyawiho



5 = Neologismo: *bâ ou *mûca 'mão'


 Ambas as palavras aqui citadas significam mão nas línguas da família Kariri, qualquer uma das duas pode ser usada como o numeral, então deixarei os falantes de cada língua decidir qual será o mais adequado como número.



Dz.: bâ, mâdha


Kp.: bò, mŷsã


Sp.: péi, musáng


Km.: pà, musàng


Kt.: bó, misã


KX.: bâ, mâdha, mûsã


Pp.: mýsã


Dz-Tx.: bo, moedha



6 = Neologismo: *âro (bu)ki 'este dedo da mão'


 Seguindo a lógica de começar a contar implicando o número cinco, irei usar uma das raízes da palavra dedo *bugi ~ *puki que foi reconstruída a partir do Kamurú mussambugi, formando portanto a frase 'este dedo':


Dz.: âmroki


Kp.: eroki


Sp.: eiroki


Km.: aroki


Kt.: óroki


KX.: âroki


Pp.: aeroki


Dz-Tx.: ãroki



7 = Neologismo: *âli bu(ki) 'aquele dedo da mão':



Dz.: âmlibu


Kp.: eribù


Sp.: eilipù


Km.: alipù


Kt.: óribu


KX.: ânlibu


Pp.: eribu


Dz-Tx.: ãlibu



8 = Neologismo: *ki p(l/r)o 'o dedo além'


 Dessa vez iremos dizer que o dedo está mais além dos últimos dois:



Dz.: kiplo, kipro


Kp.: kipro


Sp.: kiplo, kipro


Km.: kiplo, kipro


Kt.: kipro


KX.: kiplo, kipro


Pp.: kipro


Dz-Tx.: kiplo, kipro



9 = Neologismo: *ikimarã 'dedo contrário dele'


 Como é possível notar, eu negligenciei o i-bâ, dessa vez só usei um composto entre ki 'dedo' e marã 'inimigo' junto com o prefixo da terceira pessoa i-, portanto significa 'dedo contrário dele', com o 'dele' implicando o dedo anterior.



Dz.: ikimaram


Kp.: ikimarã


Sp.: ikimaráng


Km.: ikimaràng


Kt.: ikimaran


KX.: ikimarã


Pp.: ikimarã


Dz-Tx.: ikimarã



10 = Neologismo *bâk(l/r)i 'todas as mãos'


 Para o número 10 eu decidi juntar a raiz mais curta de 'mão' junto com uma das raízes do composto KRIBAE 'todos', cujo também surge no verbo do número 10 do Kipeá 'mycribae misã saí':



Dz.: bâkli, bâkri


Kp.: bocrì


Sp.: peiklí, peikrí


Km.: paklì, pakrì


Kt.: bókri


KX.: bâkli, bâkri


Pp.: baekri


Dz-Tx.: bokli, bokri




Autor da matéria: Ari Loussant


quinta-feira, 20 de abril de 2023

ENCONTRO CONSONANTAL NO DZUBUKUÁ


Um encontro consonantal que só existe no Dzubukuá


 Gostaria de relatar algo que descobri há alguns meses atrás, é bem óbvio, mas creio que valha uma boa discussão, o Dzubukuá sem dúvidas possuía dialetos, cada um pronunciava as palavras de sua própria forma, isso é verdadeiramente indicado pelo registro de casos no Dzubukuá onde um encontro de wVr- se reduz para wr-.


 Os Dzubukuá que tiveram sua língua registrada no Katecismo Indico de Nantes foram provavelmente aqueles provenientes da Ilha de Wracapá (atual Ilha de Aracapá), seu dialeto possuía algumas peculiaridades comparado aos de seus vizinhos, uma delas foi a criação de um quinto encontro consonantal com a consoante *r*, os que conhecemos são:


kr

gr

pr

br

 

 Estes são comuns entre todas os dialetos e línguas da família Kariri, mas o dialeto Aracapaense havia criado um quinto encontro consonantal com a consoante *w*, este encontro pode ser visto em palavras como:


Wrobwj, cognato de Worobŷ do Kipeá

Wrio, cujo surge dentro do mesmo catecismo como Worio

Wracapa, cujo possui variantes no português como Aracapá e Varacapá, indicando que a palavra original provavelmente era *Warakapa


 Além disso, a mudança parecia estar influenciando outras palavras não relacionadas, Nantes registra a palavra wro que é cognata do uro do Kipeá, este é a junção entre o prefixo de objetos inanimados u- com o demonstrativo proximal ro, formando uro 'isto', a palavra não possui um w, mas dentro do dialeto de Wracapá havia se fundido com aqueles encontros consonantais e virado *wro*, demonstrando que tal mudança não só era bem produtiva, mas também estava aos poucos influenciando palavras não relacionadas.


 É difícil dizer se essa palavra está relacionada ao Tupi Antigo gûaracapá 'escudo', não tenho ciência de qualquer presença Tupi na região onde os Dzubukuá viviam, mas creio ser necessário ressaltar isso para futuros estudos sobre a etimologia de Wracapá. Por enquanto sugiro que isso se torne um processo produtivo na hora de pegar palavras emprestadas, digamos por exemplo que peguemos empréstimos do Tupi como:


gûará 'garça'

gûarará 'tambor'

gûarassyá(ba) 'beija-flor'

gûarinῖ 'guerra, guerreiro, guerrear'


 Recomendo que todas essas, passem pelo processo de mudança no Dzubukuá, primeiro gw > w


wara 'garça'

warara 'tambor'

waradhû 'beija-flor'

warinim 'guerra, guerreiro, guerrear'


 Depois wVr > wr


wra 'garça'

wrara 'tambor'

wradhû 'beija-flor'

wrinim 'guerra, guerreiro, guerrear'



Autor da matéria: Ari Loussant 


quarta-feira, 19 de abril de 2023

SUGESTÃO DE NEOLOGISMO: SUFIXO ISMO


 Nos falta um sufixo que denote 'ismos', ou melhor, qualquer tipo de afixo, portanto hoje eu decidi criar uma estrutura para denotar este conceito.


 Eu não queria copiar a estrutura das línguas europeias, então eu decidi imitar os circunfixos que podem ser encontrados por todo o lado nas línguas Kariri, como no Kipeá si-me-te 'palavra' cujo significa literalmente 'ele, a coisa/ocasião/instrumento da fala', seguindo essa lógica eu desenvolvi o circunfixo 3S-X-me, sendo que 3S representa a terceira pessoa do singular que varia dependendo da declinação, X representa o substantivo que vai no meio e -me deriva do verbo ME 'pensar', aqui estão alguns exemplos de uso desse novo circunfixo:


Kp.: i-kritã-mè 'cristianismo', literalmente 'ele, o pensar cristão ou a ideia cristã'


Kp.: i-tunhihò-mè 'religião nativa dos Kariri', lit. 'ele, o pensar da crença indígena'


Kp.: su-caradà-mè, su-carà-mè ou su-cadà-mè 'patriotismo', lit. 'ele, o pensar do amor da terra ou a ideia do amor da terra'


Kp.: si-medjè-mè 'vegetarianismo' lit. 'ele, o pensar do vegetariano ou a ideia do vegetariano'


Kp.: i-nhetçã-mè 'autoritarismo' lit. 'ele, o pensar de autoridade rígida ou ideia de autoridade rígida'



Autor da matéria: Ari Loussant 


terça-feira, 18 de abril de 2023

A TRADUÇÃO DO ELEMENTO RU


 Existe uma raiz que surge em algumas palavras cujo o tema parece ser o mesmo, essa raiz é *RU, ela surge nas seguintes palavras:


BADZURU = moquém

RUNHU = panela

YARU = priaca


 Todas essas palavras tem uma coisa em comum, RU e o fato de que elas possuem alguma forma de recipiente, talvez BADZURU seja uma exceção e este RU seja uma outra raiz homófona, mas estou convicto de que RUNHU e YARU estão conectados pela mesma raiz, vamos começar discutindo o significado de YARU e desconstruí-lo.


 YARU é uma forma de composto bastante comum dentro dessa língua, onde uma palavra é prefixada com um dos classificadores da língua, neste é o YA- 'classificador de coisas pontiagudas, metais, ossos', formando YA-RU 'recipiente de objetos pontiagudos, priaca', para aqueles curiosos, priaca é uma palavra nordestina derivada (segundo Teodoro Sampaio) de alguma língua tapuia cujo significa 'bolsa de caçador', confirmando para nós que RU é uma palavra genérica para recipientes.



 indo para RUNHU, NHU é muito provavelmente quem significa panela diretamente, enquanto RU está funcionando de forma parecida como o YA- que vimos em YARU, como uma espécie de classificador, então a palavra se compõe assim RU-NHU 'recipiente-panela'.


 Eu irei começar a pesquisar BADZURU para chegar a uma conclusão sobre seu RU, voltarei quando tiver encontrado algum cognato ou alguma palavra que auxilie na busca, enquanto isso sugiro que RU- seja utilizado para várias formas de compostos para todas as línguas, confirmei no Dzubukuá que Runhu começa com r, apesar disso não ser a prova máxima, já que o Dzubukuá também tem um pouco de tendência de transformar alguns *l em r, mas até que eu encontre algo que contradiga o resultado nas duas línguas, irei reconstruir essa palavra com r.


Proto-Kariri *ru 'recipiente' (nenhuma declinação demonstrada, sugiro a 1ª)


Dz.: ru

Kp.: rù

Sp.: rú

Km.: rù

Kt.: ru

KX.: rú

Pp.: ru

Dz-Tx.: ru


Sugestões de neologismos:


*ru- "novo classificador para recipientes, separando-o de *bu-"


*kro-ru "composto entre o classificador de líquidos e rios + recipiente, formando *kro-ru, que terá o significado de garrafa"


*ru-ki-pû "cuscuzeira, lit.: recipiente-areia-milho, sendo que areia é a palavra mais próxima para farinha e floco e pû é a palavra nativa do Kariri para milho"


*ru-ru-yâ "mochila, lit.: recipiente-classificador(CL)-grande"


*ru-ka "cordas vocais, lit.: recipiente-cantar"


*ru-pu "pulmão, lit.: recipiente-soprar"


*ru-ña "caixão, lit.: recipiente-morrer"


*ru-bumana, *ru-bu, *ru-ma, *ru-na "vaso (de plantas)"


*ru-ru-pi "capsula (genérico), lit.: recipiente-CL-pequeno"


*ru-dzo-ru-pi "capsula (de remédio), lit.: recipiente-medicina-CL-pequeno"


*ru-ko "lixeira, lit.: recipiente-sujo"


*ru-podo "frigideira, lit.: recipiente-assar"


*ru-ku-mu "côco, lit.: recipiente-branco-dentro", sendo que mu vem de mudu 'barriga' com sentido estendido para 'dentro, interior'


*ru-sa "útero, lit.: recipiente-parir"


*ru-wi-te "mala, lit.: recipiente-ir-NMLZ", sendo que wite 'coisa/ocasião de ir' significa viagem, ou seja, a palavra significa 'recipiente de viagem'



Autor da matéria: Ari Loussant 


sexta-feira, 14 de abril de 2023

A PALAVRA UBUMANA E BUNNE


 A palavra para planta foi registrada dentro da língua Kipeá como um composto da quinta declinação UBUMANA, cujo descobri recentemente que possui um cognato registrado no Katecismo Indico de Nantes, a palavra não surge de forma independente e sim surge como um particípio de -TE, ou seja, IBUNNETE 'quinta, vale'.


 Existem algumas dúvidas que eu posso esclarecer, a primeira coisa é a estrutura da palavra em si, vemos que o Kipeá possui um MA no meio de BU-MA-NA, coisa que o possível cognato Dzubukuá BU-NE não possui, isso pode ser explicado como uma tendência à extensão que existe no Kipeá, compare por exemplo o Dzubukuá TIDZEBOE vs Kipeá TIDZEHEHOBO que possui duas raízes extras que são HE e HO.


 Devo explicar IBUNNETE 'quinta, vale', que possui dois significados distintos entre si, o significado literal da palavra é 'a coisa/local/instrumento/ocasião de plantas', nesse caso seria 'o local de plantas, plantação' cujo foi estendido para 'quinta' que pode ser uma propriedade rural com moradia, mas também pode ser qualquer local propício para agricultura, isso talvez explique o porquê de Nantes usar essa palavra para descrever 'Vale de Josaphat', ele não está realmente chamado o local de 'vale', e sim de um local bom para agricultura, provavelmente por que o atual local que se chama Vale do Cédron recebe grandes fluxos de água por conta das chuvas nos meses de inverno.


 Com essas duas dúvidas esclarecidas, posso falar com certeza que as duas palavras são cognatas, o problema agora é descobrir o que cada uma significa independentemente, já falei isso antes, mas irei repetir, quando uma palavra composta por múltiplas raízes não apresenta significado duplo, isso claramente é um indicador de que as palavras concordam umas com as outras, ou seja, são sinônimos, não estou dizendo que elas sempre tiveram os mesmos significados no Proto-Kariri, mas é necessário lembrar que para os Kariri da época, essas palavras estavam sendo tratadas como se fossem idênticas e que poderiam, sem alteração alguma, forma uma unidade só, com um só significado. Para não deixar a palavra sem hipóteses no entanto, eu pesquisei nos dicionários, artigos e teses disponíveis de algumas línguas indígenas, talvez exista uma pequena possibilidade de BU está relacionado ao *pu 'cana' do Proto-Macro-Jê, ainda não achei um candidato para MA e NA/NE, no futuro irei atualizar essa palavra, aqui estão as reconstruções:



Proto-Kariri *bu(ma)nə 'planta (vegetal)' (sugestão: 1ª ou 5ª declinação )


Dz.: bunâ, bumanâ

Kp.: ubumanà

Sp.: punéi, pumanéi

Km.: punà, pumanà

Kt.: bunó, bumanó

KX.: ubumanâ, ubunâ

Pp.: ubumaná

Dz-Tx.: bune


Proto-Kariri *bu 'planta (genérico)' (sugestão 1ª ou 5ª decl.)


Dz.: bu

Kp.: ubù

Sp.: pú

Km.: pù

Kt.: bu

KX.: ubú

Pp.: ubú

Dz-Tx.: bu


Proto-Kariri *ma 'planta (genérico)' (sugestão 1ª decl.)


Dz.: ma

Kp.: mà

Sp.: má

Km.: mà

Kt.: ma

KX.: má

Pp.: má

Dz-Tx.: ma


Proto-Kariri *nə 'planta (genérico)' (sugestão 1ª decl.)


Dz.: nâ

Kp.: nà

Sp.: néi

Km.: nà

Kt.: nó

KX.: nâ

Pp.: nae

Dz-Tx.: ne



Autor da matéria: Ari Loussant 


terça-feira, 11 de abril de 2023

OS QUATRO TIPOS DE 'DE' NAS LÍNGUAS KARIRI


 Como todos somos falantes de português, nos acostumamos com as regras e os padrões semânticos, morfológicos e sintáticos da língua lusitana, isso nos levou a perceber certas palavras de certas formas, uma delas é a palavra 'de'. Essa palavra carrega múltiplas funções ao mesmo tempo, coisa que as línguas Kariri não tinham nesse caso específico, na visão dos Kariri, 'de' tinha funções separadas dependendo de seu contexto, hoje irei ensinar a separar cada 'de' para facilitar na hora de traduzir os textos em alguma língua da família Kariri.


1º) 'de' de forma, material, estilo, modo


 O primeiro 'de' que irei ensinar é aquele que Mamiani e Nantes traduziram como DO, esse 'de' é usado especificamente para denotar o material do qual é feito o objeto mencionado, digamos por exemplo a frase portuguesa 'giz de cera', o 'de' dessa frase pode facilmente ser descrito mais detalhadamente com as seguintes construções: 'giz feito com cera', 'giz ao modo de cera', 'giz ao material de cera' ou 'giz a lá cera'. A palavra DO é o dativo das línguas Kariri e se traduz como 'a, para', não é o 'a' do artigo definido como em 'a casa' e sim no dativo que direciona alguém para algo como em 'eu vou à casa dele' que pode ser substituído por 'eu vou *para* a casa dele'. Voltando ao assunto, esse DO se limita a isso, vou dar alguns exemplos aqui para que fique mais compreensível:


Dzubukuá: tami do merata 'vara de ferro' literalmente 'vara ao ferro'

ami do peró 'comida a lá portuguesa' lit. 'comida à portuguesa'


Kipeá: runhù dò bunhà 'panela de barro', lit. 'panela ao barro'

erà dò wì 'casa de madeira' lit. 'casa à madeira'


Como vocês podem ver, essa é a função do primeiro 'de' das línguas da família Kariri, agora vamos para o segundo.


2º) 'de' de origem


 Este segundo foi descrito brevemente por Mamiani, ele é o BO, cujo ele traduziu com a partícula latina EX, como não falamos latim, irei traduzir da melhor forma que posso no português. Falando da forma mais básica, essa palavra se traduz como 'originado de', 'saído de', 'derivado de', ou seja, a palavra denota origem, não só de locais como "eu vim *de* São Paulo", mas também de pessoas "eu nasci *da* minha mãe" ou conceitos como "essa ideia veio *de* um sonho", basicamente você utilizará essa partícula quando você quer denotar que algo saiu, se originou ou derivou de alguma coisa, alguns exemplos aqui para ajudar são:


Sapuyá: sá lí ró nemeté *pó* bigéi neité 'essa ideia nasceu de um sonho'

ku théi tí *pó* Salvador téi Fortaleza 'viajaremos nós todos de Salvador para Fortaleza'


Kamurú: palè lùi amasà *pò* litsì 'a onça saiu da mata'

tá a palè malè *pò* a yarà, gi papanyì a petè 'saia logo de tua casa, estamos esperando por ti'


3º) 'de' de posse


 Esse não toma forma de partícula separada nas línguas Kariri e sim funciona como um prefixo nas palavras, ele pode tomar a forma de qualquer prefixo de qualquer declinação, só depende do contexto da frase e palavra em si, por exemplo:


Katembri: susimu Katembri 'cultura Katembri' lit. 'cultura dele, do povo Katembri'

suvariza Katembri 'língua Katembri' lit. 'língua dele, do povo Katembri'


Kariri-Xokó: sinhákrí ghikrakumá/ikrakumá kayahó 'morreu minha vaca ontem' (o pronome i- no KX foi reconstruído a partir de uma única frase que sobreviveu na língua Xokó e nesse caso funciona da mesma forma que ghi-)

sidendékrí João ghiyâradé 'João construiu nossa casa'



4º) 'de' de causa


 Por último, temos o 'de' de causa, ou em termos técnicos, o ergativo. O ergativo é o que denota causa nas línguas Kariri, ele quem marca o "dono" da ação em verbos passivos, ele é sempre obrigatório em verbos como PA 'ser morto', cujo nunca pode ser traduzido como 'matar' diretamente, portanto se eu quero dizer 'eu matei o mosquito', eu tenho que obrigatoriamente dizer 'o mosquito foi morto por causa de mim', o ergativo pode surgir de forma independente onde ele toma a forma de NO na maioria das línguas, em sua forma conjugada ele vira NA ou NHA, ele é sempre conjugado na primeira declinação de Mamiani, aqui estão alguns exemplos:


Pipipan: Pakri bani *nae* dupari 'foi morto o mocó por causa do caçador'

mýbae aera ro *aenae* kide ? 'foi tu que ergueu essa casa' ? lit.: 'foi erguida esta casa por causa de ti porventura ?'


Dzubukuá-Tuxá: dibokli aribé hiña 'eu lavei o prato' lit.: 'foi lavado o prato por mim'

inatedi natete iña 'ele/ela fará o trabalho' lit.: 'será feito o trabalho por causa dele/dela'



Autor da matéria: Ari Loussant 


segunda-feira, 10 de abril de 2023

A PALAVRA PARA PESSOA NAS LÍNGUAS KARIRI


 Tecnicamente existem duas palavras para pessoa na família Kariri, que podem ser reconstruídas como *tsâ e *bi(dzâ)gâ, cada língua adotou essas palavras com significados diferentes, cujo irei demonstrar agora.


 Uma das formas na qual a palavra *bi(dzâ)gâ foi adotada foi como um numeral, só que cada língua interpretou a palavra de forma diferente, as línguas do norte pegaram a variante *bigâ e adotaram ela como a palavra para o número 1, enquanto no sul, o Kamurú havia interpretado essa palavra como uma com significado múltiplo, portanto era a palavra deles para números de 4 para cima. 


 O porquê de haver essa diferença entre singular (1) e múltiplo (4, 5) pode ser justificada pelo cognato que encontramos no Dzubukuá: bidzoho, que tem três significados 'alguém, ninguém', ambos com significado singular e por último 'todos' com significado múltiplo, ou seja essa palavra carrega o significado ancestral da palavra para 1 que surge no Dzubukuá e no Kipeá como bihe, seu h teria o som mais próximo do g holândes como indicado pelo registro de Martius sobre o equivalente Kamurú que foi escrito como *ibicho*, com o *ch* alemão indicando a natureza velar dessa consoante.


 A outra palavra é tsâ, ela não surge de forma independente e sim em compostos, como nos pronomes independentes hi-ETÇÃ/i-DCE e ew-ATÇÃ/on-ADCE. A palavra pode ser prefixada com o prefixo de objetos animados *â-, formando *âtsâ. A palavra também surge no composto tsõho/dseho 'gente' que é formado a partir da palavra para pessoa tsõ/dse junto com ho que eu descobri a partir do Kamurú e do Sapuyá também ter o som do g holandês, já que surge como zocho no Kamurú (pronunciado tsogho), parece ser um cognato do HO de TSOHO 'muitos' do Kipeá, portanto temos *tsâ-gâ 'pessoa-muito' ou seja 'muitas pessoas, gente, população, povo'.


 Voltando para a primeira palavra, uma coisa que não discuti foi a formação desse composto *bi(dzâ)gâ, as primeiras duas sílabas *bidzâ surgem em outros compostos dentro das línguas Dzubukuá e Kipeá:


Dzubukuá:

bidzebro = rosto, cara

bidzecradda = aborrecer

bidzamu = pajé


Kipeá:

bidzancrò = rosto, cara

bidzoncrà = bocejar

bidzoncradà = ter nojo

bidzorà, bidzoratò = olhar pasmado

bidzamù = pajé



 A gigantesca maioria tem definições com ações que são feitas próximas do rosto, também não creio ser coincidência a palavra bi ser tão parecida com o verbo (u)bi 'ver, ouvir', portanto traduzo primeiramente bidzâ como 'rosto'. Outro aspecto importante é o cultural, parece que na visão dos Kariri, o rosto era visto como a definição primária para 'pessoa', como vemos em bidzoho 'alguém, ninguém, todos' do Dzubukuá e ibicho 'pessoa' do Kamurú, portanto adicionarei as seguintes definições para bi(dzâ)gâ 'rosto, pessoa, alguém, ninguém'.


 A terceira raiz que se encontra no composto bi(dzâ)gâ foi a que sobreviveu na maioria das palavras descendentes como *bihe* ou *ibicho*, como existe a diferença entre a vogal *e* e *o*, eu reconstruí com o schwa *â*. A raiz gâ de bi(dzâ)gâ é difícil de definir, eu primeiramente achava que se tratava da raiz gâ 'muitos' de iho 'muitos' do Dzubukuá e tsoho 'muitos' do Kipeá, mas isso só explicaria o significado múltiplo que vemos no Kamurú e no Dzubukuá, não explicaria o por que de *bihe* em ambas as línguas do norte serem singular em seus significados, o que podemos presumir é que a raiz que veio a ser ho, he e cho carrega por si só esses significados, portanto irei reconstruir ela com as definições que sobraram no Dzubukuá até que outros estudos esclareçam melhor sua definição, assim temos *gâ 'alguém, ninguém, todos'. Aqui estão as palavras reconstruídas para todas as línguas:


Proto-Kariri *â-tsâ ~ *tsâ 'pessoa'


Dz.: âtsâ, tsâ

Kp.: etçã, atçã, tçã

Sp.: eitséi, tséi

Km.: atsà, tsà

Kt.: ósó, só

KX.: âtsâ, tsâ

Pp.: etçã, atçã, tçã

Dz-Tx.: atse, tse


Proto-Kariri *bidzâ, *bigâ, *bi(dzâ)gâ 'pessoa, alguém, ninguém, todos'


Dz.: bidzâ, bighâ, bidzâghâ

Kp.: bidzõ, bihò, bidzõhò

Sp.: bitséi, bigéi, bitseigéi

Km.: bitsà, bigà, bitsagà

Kt.: bizó, bighó, bizóghó

KX.: bidzâ, bighâ, bidzâghâ

Pp.: bidzãe, bigae, bidzãegae

Dz-Tx.: bidze, bihoe, bidzoho



Autor da matéria: Ari Loussant 


sexta-feira, 7 de abril de 2023

A PALAVRA HANHO DO DZUBUKUÁ


 Essa palavra surge três vezes no Katecismo Indico de Bernardo de Nantes, em todos os casos tem o significado de 'reconciliar', ou seja 'fazer as pazes', irei mencionar esse significado logo logo, primeiro comecemos com alguns argumentos.


 A palavra HANHO surge consistentemente escrita dessa forma, sem alterações ou variantes em qualquer parte do catecismo, isso ajuda bastante a determinar sua pronúncia, irei explicar o porquê. A única outra palavra que eu conheço com uma estrutura similar à de HANHO é a palavra NANHE 'chefe, principal', cujo também, de forma consistente, surge escrita somente dessa forma, sem qualquer variação, isso indica que Nantes só tinha uma forma de representar os sons dessa palavra para o leitor e que ele não precisava alterar ela para indicar sua pronúncia, como no caso de ENUNHE que surge como ENUNHE e ENUNHIE com um I inserido no meio do NH e da vogal que vem depois, para indicar a natureza do NH.


 O que estou dizendo é que HANHO seria parte desse pequeno grupo de palavras que tem coincidentes encontros de NH, cujo não são pronunciados como o NH da palavra *manhã* por exemplo, e sim como um som nasal da vogal anterior, isso é um aspecto da ortografia desenvolvida por Nantes, cujo utilizava de -m e -n para indicar a nasalidade de uma vogal, sendo portanto melhor representado como HÃHO.


 Isso obviamente quebra qualquer conexão que HANHO poderia ter com NHAEHI 'fazer pazes' do Kipeá, já que o NHO não existe de verdade como NH, ele na verdade é apenas HO, portanto de onde vem essas duas raízes novas do Dzubukuá ? Qual é sua pronúncia real ? Os H são verdadeiros ou seriam G fracos ? Essas dúvidas me fizeram buscar em todos os documentos que tenho disponível de várias línguas indígenas do Brasil que podem estar distantemente conectadas com a família Kariri e infelizmente, minha pesquisa foi inconclusiva, eu não encontrei alguma raiz que tenha um significado próximo ou igual às duas que tem no composto HÃHO.



 Por conta dessa limitação nos dados, eu sou incapaz de reconstruir fielmente para o Proto-Kariri, então eu adotei um método de representar o som que não sei, para facilitar sua digitalização por todos, decidi que o som que eu não sei se é /g/ ou /h/ será representar por um H maiúsculo na reconstrução. Também não sei a qualidade real da vogal, se são realmente à e O, ou se são resultados de um schwa do Proto-Kariri, também não sei se a nasalização da primeira raiz é obrigatória, portanto irei reconstruir com as vogais atuais e a nasalização junto, mas colocarei ao lado uma variante com o símbolo de vogal desconhecida V.



 Antes de concluir, como não fui capaz de encontrar qualquer alteração no significado da palavra, creio que se trata mais uma vez de um composto de sinônimos, e devido à similaridade das duas sílabas, eu teorizo de que se trata da mesma raiz reduplicada, futuros estudos irão esclarecer melhor, aqui estão as reconstruções:


Proto-Kariri: *HãHo ~ HVHV


Dz.: hamho

Kp.: hãhò

Sp.: hanghó

Km.: hanghò

Kt.: hanho

KX.: hãhó

Pp.: hãhô

Dz-Tx.: hãho



Autor da matéria: Ari Loussant 


A PALAVRA PARA NOVO NAS LÍNGUAS DA FAMÍLIA KARIRI


 Há mais ou menos 1 ou 2 meses atrás, eu e Ricky descobrimos que a palavra CHE do Kipeá que foi traduzida somente como 'novamente, de novo' por Mamiani também tinha a função de 'novo', cujo muito provavelmente reflete sua função original antes de se tornar um sufixo:


Inióbæ ibuyẽwohóché dó ibuyẽwohó kenhé

"Deus tornará a formar um corpo novo dos ossos"


Recentemente decidi buscar no Dzubukuá para ver se ele possuía o mesmo sufixo, e descobri que sim, essa língua também possui a mesma palavra na forma de -kie:


Do coho nenewj buppi onadcedi mo abuangatekie

"Entaõ deveis fazer hum pequeno exame dos peccados, que novamente fizestes"


Com isso posso reconstruir essa palavra direto para o Proto-Kariri como *ce 'novo, de novo, novamente' e trazê-lo para as outras línguas nas seguintes formas:


Dz.: kye, -kye

Kp.: chè, -chè

Sp.: cé, -cé

Km.: cè, -cè

Kt.: tshe, -tshe

KX.: ché, -ché

Pp.: chê, -chê

Dz-Tx: kye, -kye



Autor da matéria: Ari Loussant e Ricky Seabra


quarta-feira, 5 de abril de 2023

NOVO MÉTODO DE CRIAÇÃO DE PALAVRAS


Alguns neologismos que pensei esta semana e o desenvolvimento de um novo método de criação de palavras


No dia 11 do mês passado acabei ficando doente e só melhorei a partir do dia 20, desde então fiquei sem ideias para publicações, então decidi refletir um pouco sobre como eu venho criando as novas palavras para cada língua da família.


 Eu, Suã, sou uma pessoa muito técnica, cresci em um ambiente que me providenciou com mais visões científicas do que espirituais sobre o mundo, por conta disso, meus neologismos refletem minha visão de mundo e acabam, eu creio, não refletindo o pensamento do povo Kariri, portanto eu decidi tomar alguns dias para refletir como eu faria os neologismos a partir de hoje.


 Obviamente nem todos precisam de uma explicação poética ou esotérica, entre os próprios Kipeá alguns objetos eram definidos de forma a partir de sua função direta como sidadite que usa o verbo dadi 'estar assentado' para formar o particípio que significa algo em torno de si-dadi-te 'ela, a coisa de assentar-se', ou seja 'cadeira, trono (no contexto do catecismo)' e qualquer outro objeto que possa ser usado para sentar. Porém certamente objetos da natureza podem ser definidos de forma melhor que maçã = fruta-vermelha ou laranja = fruta-laranja ou gato = animal que mia e cachorro = animal que late.


 Portanto hoje como treino para mim mesmo, eu decidi conectar as aranhas à internet. Comecemos com a tradução de aranha, já que este termo não nos foi dado nem Nantes ou por Mamiani, se eu seguisse a lógica mais básica a chamaria de 'animal de oito pernas' e concluiria ali mesmo, no entanto eu quero algo menos técnico e que não seja muito complicado ou com muitas sílabas, portanto usarei um verbo que descobri junto com Ricky Seabra enquanto pesquisávamos o catecismo de Mamiani, que é TERI 'fiar', este composto entre TE e RI significa 'fiar' ou em outros termos 'tecer', portanto temos a palavra perfeita para definir a aranha, das quais muitas espécies são especialistas em tecer as mais complexas teias para capturar suas presas, podemos até mesmo chamá-las de mestres nesta arte, então por que não dar esse título para elas ? Sugiro a nomeação das aranhas como 'senhoras da tecelagem' SETERI e como TE e RI são sinônimos, podemos só dizer SETE ou SERI para encurtar. Aqui estão as formas que essa palavra tomaria em cada língua, levando em consideração algumas coisas na hora de reconstruir:


Dz.: heteri, heteli, hete, heri, heli

Kp.: seterì, setè, serì

Sp.: seterí, setelí, seté, serí, selí

Km.: siterì, sitelì, sitè, sirì, silì

Kt.: eteri, ete, eri

KX.: seterí, setelí, seté, serí, selí

Pp.: sêtêri, sêtê, sêri

Dz-Tx.: heteri, heteli, hete, heri, heli


 Com isso temos um neologismo para este animal, mas como falei lá em cima, muitas delas são especialistas em tecer teias complexas, por que não desenvolver uma palavra para 'teia' também ? Usaremos a palavra HO 'fio' para criar este conceito, juntemos ela com SERI e suas variantes:


Dz.: herihâ, helihâ

Kp.: serihò

Sp.: serihó, selihó

Km.: sirifà, silifà

Kt.: erihó

KX.: serihó, selihó

Pp.: sêrihô

Dz-Tx: heriho, heliho


 Terminamos de traduzir dois conceitos referentes à aranha, agora vamos para a internet, como podemos conectar estes palavras ? Simples, uma teia de uma aranha pode ser descrita como um conexão sistemática de várias linhas, para denotar isso no sentido tecnológico, usemos BO 'relâmpago' para denotar 'elétrico, eletrônico', criando SERIHOBO 'teia eletrônica', aqui estão suas variantes:


Dz.: herihâbâ, helihâbâ

Kp.: serihobò

Sp.: serihopéi, selihopéi

Km.: sirifapà, silifapà

Kt.: erihónaré

KX.: serihobâ, selihobâ

Pp.: sêrihôbae

Dz-Tx: herihoboe, helihoboe


Para não concluir só com estes três, também gostaria de sugerir um neologismo para 'site' ou 'sítio eletrônico', eu ia usar a palavra 'lugar' para isso, mas eu decidi continuar com a analogia das aranhas, quando uma aranha captura várias presas com sua teia, ela a partir daí tem várias opções de refeição, certo ? Então por que não usar inseto para denotar a palavra para 'site' ? É claro, não temos essa palavra em lugar algum, mas por sorte, Mamiani registrou uma única palavra referente à um inseto, o DU 'piolho'. Com esse registro podemos trabalhar com essa palavra de várias formas, a principal nesse caso seria ablaut, que falando da forma mais simplificada possível, é um termo técnico para dizer 'eu mudei a vogal porque eu quis'. Vamos fazer isso, peguemos DU e mudemos sua vogal para qualquer uma das que temos disponíveis em cada língua, DA, DE, DÉ, DI, DU, DO, DÓ e etc. Para não complicar, vamos com DI e ponhamos o novo significado de 'inseto', portanto temos DI 'inseto' que junto com SERIHOBO forma SERIHOBODI 'inseto da teia eletrônica' ou seja 'sítio eletrônico', aqui estão as variantes:


Dz.: herihobâdi, helihobâdi

Kp.: serihobodì

Sp.: serihopeití, selihopeití

Km.: sirifapatì, silifapatì

Kt.: erihónarédi

KX.: serihobâdi, selihobâdi

Pp.: sêrihôbaedi

Dz-Tx.: herihoboedi, helihoboedi


 Com isso concluo os neologismos de hoje, logo irei publicar mais, passarei os próximos dias estudando, então a frequência de postagem talvez continue um pouco baixa, mas irei aumentar conforme o tempo for passando.


Autor da matéria: Ari Loussant