sexta-feira, 31 de março de 2023

ORIGEM NO MARACAIBO


        Nhenety mencionou a história da origem dos Kariri, que diziam se originar de um grande lago ao norte, também menciona que estudiosos acreditam que os Kariri se originaram ou do Amazonas ou do Lago Maracaibo da Venezuela, Nhenety gostou do Maracaibo e suspeita que este nome seja Kariri, portanto ele me pediu para checar a etimologia da palavra.


 Após alguns minutos de pesquisa notei algumas coisas sobre o nome e o local em si, primeiro começando sobre o local, a Wikipédia diz que aquela baía foi habitada tanto por indígenas aruaques quanto caribes, assim estabelecendo os grupos linguísticos regionais e possibilitando um estudo mais aprofundado sobre o nome deste lugar.


 A Wikipédia inglesa propõe duas etimologias possíveis para a cidade de Maracaibo, a primeira, traduzindo livremente seria mais ou menos assim: "É dito que o nome Maracaibo vem de um bravo cacique (chefe indígena) Mara, um jovem nativo cujo bravamente resistiu aos Espanhóis e morreu lutando contra eles. A lenda diz que quando Mara pereceu, os Coquivacoas gritaram "Mara kayó" (Mara caiu!), assim originando o nome da cidade, no entanto seria estranho os indígenas terem gritado tal frase em espanhol", eu particularmente, assim como o escritor deste texto, também duvido dessa etimologia, já que realmente seria estranho os indígenas terem falado em uma língua estrangeira para eles tal frase, o que nos leva para a segunda etimologia.


 A segunda etimologia proposta na Wikipédia e, de acordo com ela, por historiadores, seria a de que o nome deriva de uma língua indígena (sem mencionar qual) que dizia Maara-iwo que é traduzido como "local onde serpentes são abundante".


 Valdivino indígena Kariú Kariri do Ceará menciona a similaridades deste nome com o nome de uma Encantada do povo Kariú, também chamada Maara, cujo tem a cabeça de mulher e o corpo de uma cobra, propondo a tradução de Maara-iwo como "Caminho de Maara". Eu e Nhenety concordamos que foi um maravilhoso achado a conexão entre Maara de Maracaibo e Maara da Encantada Kariú, uma distância de quase 4000km, mas uma proximidade histórica e cultural gigante.




Autores Ari Loussant e Valdivino Kariú Kariri 



quinta-feira, 9 de março de 2023

O SIGNIFICADO DE TORÀ 'CORTESIA COM O PÉ'


 Ao olhar para essa palavra é fácil reconhecer um dos verbos que compõem ela, sendo este *TO, que se assemelhar ao TO de TODÌ 'estar de pé' ou no inglês 'to stand', sendo este provavelmente quem está carregando o significado de pé em cortesia *com o pé*, já RÀ é uma ação mais complicada de definir, existem várias definições para cortesia, todas centradas na ideia de um gesto/ação educada para outra pessoa.


 Nós temos que tomar cuidado com as traduções de Mamiani, não podemos presumir que uma certa palavra teria a mesma conotação na língua séculos depois, um exemplo disso é a outra palavra que ele define como 'fazer cortesia' que é DACRÙ, Mamiani não usa essa palavra em lugar algum de seu catecismo, não nos dando a chance de saber qual seria seu uso, porém o Nantes usa seu cognato *daklo* várias vezes durante seu catecismo e demonstra para nós que o significado de 'fazer cortesia' estava mais em volta de 'adornar, decorar, assear' do que 'gesticular educadamente'.


 As únicas palavras que encontrei que possivelmente podem ser cognatos distantes são o Boróro reru 'saltar' e o Proto-Jê-Meridional *(ɾɛ̃ɡ)ɾɛ̃ɡ 'saltar, pular' (este é um pouco mais duvidoso, estou ciente dos processos de nasalização do PJM, mas não o suficiente para dizer se isso é uma mudança regular de ɛ > ɛ̃ ou se a palavra já tinha o som ɛ̃, que é um é aberto nasalizado), se elas forem cognatos podemos definir que no passado RÀ teria tido o significado de 'pular, saltar'. Eu digo no passado, pois não me resta dúvidas de que a palavra já tinha evoluído de seu significado de 'saltos aleatórios' para 'saltos coordenados', ou seja 'dança, dançar', se este não fosse o caso, não teríamos visto Mamiani definir salto como SAIPRÌ e Nantes como HOPELE, teríamos visto RÀ novamente (este argumento é um no qual eu irei voltar outro dia, pois eu suspeito do LE de HOPELE, apesar de parecer somente com a palavra PELE 'sair', ainda irei estudar mais a fundo para saber qual é seu significado), outro argumento que apoia essa ideia é o fato de o próprio autor ter definido o gesto como algo de cortesia, o que implica mais ainda em coordenação e organização proposital do gesto.


 Eu ia reconstruir esse termo como *ra 'dança, dançar', porém devido à palavra TORÉ que está bem espalhada pelo Nordeste e sua semelhança com TORÀ, eu devo reconstruir de duas formas *ra ~ *râ 'dança, dançar' para compensar a mudança das vogais. Também para os dialetos que permitem e por precaução, irei reconstruir versões com a letra l no começo, pois baseado no landaeh do Kamurú versus o anrande do Dzubukuá e o rende do Kipeá, é difícil prever quando uma palavra será lateralizada (ou seja, passará de r > l) dentro de cada língua, isso também pode ajudar na criação de novas palavras, como 'ritual' por exemplo.


Proto-Kariri *ra ~ *râ 'dança, dançar'


Dz.: ra, râ, la, lâ

Kp.: rà

Sp.: rá, réi, lá, léi

Km.: rà, là

Kt.: ra, ró

KX.: rá, râ, lá, lâ

Pp.: rá

DT (Dzubukuá-Tuxá).: ra, roe, la, loe



Autor da matéria: Ari Loussant 



HETE BUCE - ORTOGRAFIA NOVA


 Por um bom tempo venho publicando de forma similar à academia, com símbolos derivados do Alfabeto Fonético Internacional (AFI), isto pode ser agradável para alguns, mas para outros que desconhecem do lado técnico, torna o conteúdo que publico cada vez mais inacessível.


 Com isso, gostaria de definir hoje uma nova ortografia, cujo substituirá a minha técnica por algo mais compreensível para aqueles que se interessam nos estudos da família Kariri, cada símbolo será baseado na minha ortografia para o Dzubukuá e alguns desses serão semi-inspirados no Português e semi-inspirados na ortografia usada por Nantes, por exemplo, o circunflexo será usado para vogais 'alteradas', ou seja, vogais que tem sons parecidos com suas versões sem acentos, por exemplo, na minha ortografia o 'o' do Dzubukuá representa o 'ô' do Português, já o 'ô' do Dzubukuá é representado pelo 'ó' aberto do Português.


 Existe apenas um som que eu creio que será difícil para nós falantes de português que é o *dh* do Dzubukuá, este som é idêntico ao th de that do inglês, é como se você pronunciasse o z com a língua debaixo dos dentes de cima (como se você tivesse mordido a língua). De resto, creio que todos os sons são pronunciáveis de forma fácil por nós. Batizarei esta ortografia com o nome Hete buce, que derivam das palavras do Proto-Kariri *HE 'escrever' + *TE 'nominalizador' e *BU 'classificador genérico' + CE 'novo, novamente', ou seja 'ortografia nova'.


 Outra coisa que estou alterando é minha utilização de c e z para representar o ts e o dz, pois estes podem confundir aqueles que estão acostumados somente com a ortografia do Português. Devo deixar claro também que o propósito dessa ortografia não é substituir as ortografias já estabelecidas de cada língua, e sim ser usada exclusivamente no processo de reconstrução linguística da família Kariri e estabelecer um método comum para todos nós falarmos as palavras de cada idioma sem favorecer um ou outro, com tudo isso dito, deixarei aqui todas as novas letras que serão utilizadas a partir de agora:


VOGAIS


a = /a/ (mesmo que o á aberto, jamais fechado, como em CA-sa, PA-to, AR-te)


â = /ə/ (mesmo que o â fechado, jamais aberto, como em ca-SA, por-TA, mi-NHA)


e = /e/ (mesmo que o ê fechado, jamais aberto, como em ES-te, ES-pada, ES-cada)


ê = /ɛ/ (mesmo que o é aberto, jamais fechado, como em ES-ta, E-la, ER-va)


i = /i/ (mesmo que o i do português)


o = /o/ (mesmo que o ô fechado, jamais aberto, como em O-vo, OI-to, O-gro)


ô = /ɔ/ (mesmo que o ó aberto, jamais fechado, como em HOR-ta, OR-ca, OR-la)


u = /u/ (mesmo que o u do português)


û = /ɨ/ (mesmo que o y do Tupi, o i grosso que é pronunciado a seguinte forma, fale a letra i, depois deixe sua boca na posição que você usou para falar o i, nesta mesma posição solte a letra u sem arredondar os lábios)


V = /V/ (este é um dos poucos símbolos que importei do AFI, ele representa uma vogal indeterminada, quando é difícil estabelecer qual vogal seria adequada para a reconstrução)



CONSOANTES


b = /b/ (mesmo que o b do português)


c = /c/ (não existe equivalente no português, este som só existiu no período do Proto-Kariri, é um som intermediário entre o K e o T com um Y após, como se estivesse tentando pronunciar KYA e TYA ao mesmo tempo)


ch = /t͡ʃ/ (mesmo que tch de tchau do português, usado somente nas línguas que possuem este fonema)


d = /d/ (mesmo que o d do português)


dy = /ɟ/ (similar ao c, só que neste caso é necessário o som da voz, ou se for necessário outro exemplo, é o mesmo que tentar pronunciar GYA e DYA ao mesmo tempo)


dz = /d͡z/ (similar a quando a palavra dezoito é pronunciada de forma rápida, virando dzoito)


dh = /ð/ (mesmo que o th de that do inglês, pronunciado da seguinte forma, fale a letra z, depois tente falar a letra z novamente, só que com sua língua debaixo dos dentes de cima)


f = /f/ (mesmo que o f do português, usado somente nas língua que possuem este fonema)


g = /g/ (mesmo que o g do português)


gh = /ɣ/ (este som é o resultado do *g do Proto-Kariri em seus descendentes, é pronunciado como um h, só que de forma que se assemelhe vagamente ao g)


h = /h/ (este som é idêntico ao r inicial ou aos dois rr da ortografia português e da pronúncia brasileira)


j = /d͡ʒ/ (mesmo que di de dia no dialeto carioca)


k = /k/ (mesmo que o k do inglês ou c de CACHORRO do português, jamais o c de CÉU)


kh = /kʰ/ (versão aspirada do k, se pronuncia ele soltando ar enquanto se fala a consoante)


l = /l/ (mesmo que o l do português)


m = /m/ (mesmo que o m do português)


n = /n/ (mesmo que o n do português)


ñ = /ɲ/ (mesmo que o nh do português)


p = /p/ (mesmo que o p do português)


ph = /pʰ/ (versão aspirada do p, se pronuncia ele soltando ar enquanto se fala a consoante)


r = /ɾ/ (mesmo que o r de PARÁ, PRATO e PARADA, jamais o r inicial de RATO ou RUA)


s = /s/ (mesmo que o s do português)


sh = /ʃ/ (mesmo que o x de xícara, este som não parece ter existido no PKrr, mas sim em seu descendente Katembri e talvez no Sapuyá e no Kamurú)


t = /t/ (mesmo que o t do português)


ts = /t͡s/ (similar aos dois zz de pizza do italiano)


th = /tʰ/ (versão aspirada do t, se pronuncia ele soltando ar enquanto se fala a consoante


v = /v/ (mesmo que o v do português, este som não parece ter existido em nenhuma língua Kariri, exceto o Katembri que evolui o w > v)


w = /w/ ou /β/ (mesmo que o w do inglês ou o u de uau do português, este som tinha duas formas, o w normal e o som bilabial fricativo, que para aqueles que não sabem, é o mesmo som que o B do Tupi em abá 'homem, indígena', um sopro que parece com a consoante v, só que diferente desta, é pronunciada soprando ao invés de tocando os dentes de cima nos lábios de baixo)


y = /j/ (mesmo som que o y do inglês, o j do alemão ou o i de iate do português, assim como o w, é uma semivogal, também será utilizado no final das palavras quando esta tiver uma semivogal, por exemplo, o I final de SAI da palavra Kipeá SAIPRI seria escrito como SÂYPRI ou SÂYPLI no Proto-Kariri reconstruído)



Autor da matéria: Ari Loussant


terça-feira, 7 de março de 2023

O SIGNIFICADO DE *WOHO ~ *HOHO


 Esta palavra surge em dois compostos diferentes nas línguas Dzubukuá e Kipeá, o primeiro é a palavra corpo que é buyehoho no primeiro e buyẽwohò no segundo, a tradução literal dessa palavra é 'o grande inteiro', composta pela palavra buye/buyẽ 'grande' que surge com o classificador bu- e a raiz composto woho/hoho.


 Minha hipótese para essa palavra é que seu significado tenha sido literalmente 'inteiro, íntegro' pois é a palavra que faz mais sentido de se usar para criar o significado de 'corpo', seu significado de 'inteiro' é corroborado pelo seu uso na segundo composto que mencionei, que seria wohoye/wohoyẽ 'todo(s), toda(s)', que seria composta da raiz woho e a raiz ye/yẽ 'grande'.


 A pronúncia da palavra parece ter sido diferente do que sua escrita sugere, assim como vários outros h ortográficos de Mamiani e Nantes, este parece surgir de um *g do Proto-Kariri, a prova disso está no equivalente Sapuyá que lujöwagoh (corrigido para buyeiwagó na nova ortografia dessa língua), então não só o h de woho é na verdade um g fraco como também o *o de wo é uma vogal fraca, podendo se reconstruir a palavra como *wəgo 'inteiro'.


 É difícil desconstruir a palavra sem ter outros exemplos de suas duas raízes, mas como a palavra tem o significado singular de 'inteiro, todo', creio não ser errado presumir que a palavra é um composto de palavras com significados iguais ou parecidos, darei o mesmo significado para ambos até que um cognato seja encontrado, aqui estão as reconstruções de cada dialeto:


Proto-Kariri *wəgo 'inteiro'


Dz.: wogho

Kp.: wohò

Sp.: wagó

Km.: wagò

Kt.: wógho

KX.: wâghó

Pp.: waegô


PKrr.: *wə 'inteiro'


Dz.: wo

Kp.: wò

Sp.: wá

Km.: wà

Kt.: wó

KX.: wâ

Pp.: wae


PKrr.: *go 'inteiro, completo(?)'


Dz.: gho

Kp.: hò

Sp.: gó

Km.: gò

Kt.: gho

KX.: ghó

Pp.: gô



Autor da matéria: Ari Loussant 


domingo, 5 de março de 2023

PALAVRAS PARA ESTRUTURAS NAS CONSTRUÇÕES DE UM NOVO CLASSIFICADOR


 O propósito deste texto é trazer novas palavras referentes à estruturas e construções além do básico que é a casa, como prédio, loja, apartamento, condomínio, mansão, palácio, templo, igreja, escola e etc, além de também sugerir um novo classificador para estas palavras para separá-los do classificador genérico bu-.


 Comecemos com o básico, que é prédio, para este irei utilizar o Dzubukuá como exemplo, há algum tempo atrás eu havia sugerido um novo nominalizador -Y, feito para encurtar as palavras, irei usar ele aqui junto com a raiz DE que significa 'formar, tocar' e irei estender ela para 'construir', portanto DE-Y 'coisa construída, construção, prédio', ficará nas seguintes formas em cada língua:


Dz: dey

Kp.: dèi

Sp.: téy

Km.: tìy

Kt.: dey

KX.: déy

Pp.: dêi


 O próximo será loja, uma palavra bastante necessária, para este irei imediatamente sugerir que DEI se torne um sufixo usado para prédios e construções. A palavra que usaremos como chave para diferenciar estre prédio será o verbo 'comprar', para criar esse devemos primeiro olhar para um verbo Tupi para justificar o neologismo, primeiro vejamos o verbo nhe-mũ 'aliar-se, fazer pazes, fazer troca, comprar, vender', temos um verbo equivalente no Kipeá que é NHAEHI, peguemos somente uma das raízes para formar o composto, nesse caso o NHAE será escolhido e se juntará a DEI, formando NHAE-DEI 'prédio de troca, prédio de compra, prédio de venda, loja', assim ficará em cada língua:


Dz.: ñâdey

Kp.: nhaedèi

Sp.: nyeitéy

Km.: nyatìy

Kt.: ñódey

KX.: nhâdey

Pp.: nhaedêi


 A próxima palavra será apartamento, neste caso usaremos uma palavra já existente que é ERA (vou usar o Kipeá para este exemplo), peguemos somente a primeira raiz que é E para formar este composto, que será com a raiz KI de KISI 'repartição', formando EKI 'casa repartida', baseado no significado de apartamento que vem do verbo apartar, ou seja, separação. Aqui estão as variantes em cada língua:


Dz.: âmki

Kp.: ekì

Sp.: eikí

Km.: akì

Kt.: panki, ónki

KX.: gãkí, ãkí, ekí

Pp.: aekí


 Para esta palavra irei usar um dos neologismos que sugeri em Fevereiro, que é o sufixo coletivizador, vamos usar a palavra que acabamos de criar para apartamento EKI e juntar com o sufixo -SU, criando EKISU 'coletivo/conjunto de apartamentos, condomínio', segue aqui a forma que essa palavra toma em cada língua:


Dz.: âmkidhû

Kp.: ekisù

Sp.: eikisí

Km.: akisì

Kt.: pankisi, ónkisi

KX.: gãkisû, ãkisû, ekisû

Pp.: aekisú


 Para mansão, eu ia traduzir como casa grande, porém isso ia entrar em conflito com a palavra para cidade que é ERA BUYẼ, portanto decidi que seria mais adequado pegar essa palavra emprestada do Xokó *gandilya*, como só precisamos de uma raiz, irei usar somente a sílaba inicial GÃ, junto com a palavra YẼ 'grande', para formar GÃYẼ 'casa grande, mansão', aqui estão as traduções:


Dz.: gam'yâ

Kp.: gãyẽ

Sp.: gang'yéi

Km.: gang'yà

Kt.: gan'yó

KX.: gãyân, gãyen

Pp.: gãyen


 Para palácio irei usar a palavra casa ERA junto com a palavra NHE 'chefe, principal, cacique, líder', formando ERA-NHE 'casa do chefe', portanto sendo em cada língua:


Dz.: âmrañe

Kp.: eranhè

Sp.: eiranyé

Km.: aranyè

Kt.: panñe, órañe

KX.: gãnhé, âranhé

Pp.: aeranhê


 A próxima palavra é 'templo, igreja', esta palavra assim como a próxima será bem fácil de criar, será a junção entre a raiz ME 'orar' e a palavra DEI 'prédio, construção', formando ME-DEI 'prédio de orar, igreja, templo'


Dz.: medey

Kp.: medèi

Sp.: metéy

Km.: metìy

Kt.: medey

KX.: medéy

Pp.: mêdêi


 A seguinte palavra é 'escola', seguindo a lógica da anterior, iremos usar o verbo nativo do Kariri para 'ensinar' que é KENDE 'dizer, avisar, ensinar', só precisamos de uma raiz, então usaremos a primeira, juntando com DEI fica KEN-DEI 'prédio de ensinar, escola', assim fica em cada língua:


Dz.: kedey

Kp.: kendèi

Sp.: ketéy

Km.: kitìy

Kt.: kedey

KX.: kedéy, kendéy, subatekerá

Pp.: kendêi, pekebae



 A próxima palavra será o classificador que mencionei no começo do texto, irei utilizar a mesma raiz que usei antes para formar o novo verbo 'construir', que neste caso é DE, a partir dele formarei o novo classificador que deve ser usado após o substantivo e antes do adjetivo, ele servirá para derivar novas palavras sem a necessidade de formar frases grandes, por exemplo, usando o Kariri-Xocó para criar a uma palavra, podemos criar DEYÕ 'muito' com o classificador de prédios e construções, cujo o significado pode ser estendido para 'vários prédios, várias construções' portanto algo como uma 'aldeia, vila' ou até mesmo 'cidade'. Outro exemplo é a na criação similar ao que Mamiani mostrou em ERA BUYẼ 'cidade' que significa literalmente 'casa grande', esta mesma lógica pode ser aplicada para as palavras citadas anteriormente como por exemplo SUBATEKERÁ DEYEN 'escola grande' portanto uma 'universidade', GÃKI DEPI 'apartamento pequeno' pode ser 'quitinete' e por aí vai.



Autor da matéria: Ari Loussant


NEOLOGISMO DA PALAVRA 'TCHAU'


 Muitas línguas utilizam do mesmo termo para dizer olá e tchau, como o italiano que usa o ciao em ambos os casos, o coreano que usa 안녕 (annyeong) informalmente para oi e tchau e os sikhistas que usam termo punjabi ਸਤਿ ਸ੍ਰੀ ਅਕਾਲ (sat srī akāl) também para oi e tchau.


 Outras línguas diferenciam ambas as saudações, como no português oi, olá versus o tchau, adeus, até logo, o francês com bonjour ou salut versus au revoir, adieu. Um tema similar ao de 'olá' pode ser notado nas palavras do mundo para tchau, sempre elas parecem ter a temática de 'passar bem', 'vá bem', 'vá com Deus', 'paz e tranquilidade' 'a ver novamente' e etc, portanto eu decidi seguir um padrão similar.


 Novamente usarei o Kipeá como exemplo, primeiro vamos usar a raiz CO de EICO 'descansar', para criar o conceito de 'tranquilo, tranquilidade', depois usemos a raiz NHAE de NHAEHI 'fazer pazes' para criar o conceito de 'paz', criando CONHAE 'tranquilidade e paz'. Assim como seu equivalente introdutório, esta palavra tem uma versão completa, que seria CONHAE EYAI 'tranquilidade e paz para ti', aqui estão as versões de cada língua:


Dz.: koñâ, koñâ âñây

Kp.: conhae, conhae eyaì

Sp.: konyéi, konyéi eiyéiy

Km.: konyà, konyà ayày

Kt.: koñó, koñó óñóy

KX.: konhâ, konhâ âyây

Pp.: konhae, konhae aeyái



Autor da matéria: Ari Loussant


sábado, 4 de março de 2023

NEOLOGISMO, A PALAVRA PARA 'OI, OLÁ'


 Pode-se encontrar neste blog algumas de minhas publicações passadas referentes aos períodos do dia e algumas saudações básicas como 'bom dia', 'boa tarde' e 'boa noite', no entanto eu não havia me dedicado a criar uma palavra para todos os dialetos que tivesse o significado de 'olá' ou 'oi', portanto hoje eu decidi trazer minha sugestão para uma palavra comum para todos os dialetos.


 Eu venho estudando há um tempo as palavras de saudação de várias línguas, no Latim o equivalente é Ave ou Salve, este último deriva do imperativo do verbo salveō 'estar bem, estar saudável', ou seja, 'esteja bem, esteja saudável', o birmanês မင်္ဂလာပါ (mangga.lapa) que deriva de မင်္ဂလာ (mangga.la) 'prosperidade', o tailandês สวัสดี (sà-wàt-dii), que deriva do sânscrito स्वस्ति (svasti) 'bem-estar, saúde, sucesso'.


 Com todos estes exemplos cujo derivam sua palavra de olá de algo referente à saúde/bem-estar/sucesso da pessoa que está sendo adereçada, decidi fazer algo parecido sem copiar destes, usarei o Kipeá para exemplificar. Primeiro eu pensei em usar a raiz que denota pensar, pensamento MÈ, logo adicionei a palavra NHÈ que denota bem, perfeição e por último adicionei a palavra para alegre, alegrar-se SÈ, portanto criando a palavra MENHESÈ, para que seja mais de um pensamento adicionei o sufixo do plural A, criando por fim a palavra MENHESÈÀ 'pensamentos do bem e alegres'.


 Essa palavra pode ser utilizada independentemente, você diz 'menhesèà!' e a pessoa lhe responde 'menhesèà!', porém ela também tem uma forma completa que envolve o dativo e-y-aì 'para ti', portanto sendo 'menheseà eyaì', traduzido como 'pensamentos do bem e alegres para ti'. Foi decidido também que outra palavra principal para o Kariri-Xocó para 'olá' seria Yõk ou Yõka, um composto derivado da raiz Yõ 'muito' junto com a raiz nativa do Xokó Ka de Kaka 'bom', as duas palavras irão coexistir como sinônimos neste dialeto.


Aqui estão as formas que a palavra toma em cada dialeto:


Dz.: meñedhe (singular), meñedhea (plural)

Kp.: menhesè (sg), menhesèà (pl)

Sp.: menyesé (sg), menyesé á (pl)

Km.: minyesì (sg), minyesì à (pl)

Kt.: meñese (sg), meñese-a (pl)

KX.: menhedhé ~ menhesé (sg), menhedhé-á ~ menhesé-á (pl)

Pp.: mênhêsê (sg), mênhêsêá (pl)



Autor da matéria: Ari Loussant


sexta-feira, 3 de março de 2023

DEFININDO AS DECLINAÇÕES DO DZUBUKUÁ


 Uma coisa que vem sido difícil para os falantes de dialetos derivados da língua anotada por Bernardo de Nantes é a falta de regularização das declinações, já que não existe um equivalente de uma gramática feita por este autor assim como existe para o dialeto Kipeá, venho através deste texto demonstrar alguns exemplos destas declinações que surgem no Katecismo Indico, usando como base as declinações de Mamiani para estabelecer uma numeração para elas e organizá-las para futuras adições ao léxico Dzubukuá (neologismos, empréstimos e etc). Neste texto irei utilizar a ortografia do Catecismo de Nantes e a minha ortografia para o Dzubukuá logo ao lado.


Primeira declinação (substantivos e verbos): O que nós conhecemos por primeira e quarta declinação na língua Kipeá parecem ter se fundido completamente no dialeto de Wracapá, para aqueles não familiarizados com a diferença entre essas duas, posso explicar elas da forma mais básica como a separação entre substantivos e verbos (apesar de haver exceções), na primeira caem em sua maioria palavras que são substantivos, raramente caem empréstimos de outras línguas, porém podem ocorrer exceções como WASÚ 'esquerda' do Kipeá que vem do Tupi Antigo *assú* que tem seu equivalente em WANYDU (WAM'YDHU), apesar deste surgir apenas em um composto, jamais sozinho e declinado. Sobre a quarta, essas seria por definição de Mamiani onde caem a maioria dos verbos ativos e passivos e suas derivações, isto é substantivo de verbos que caem nesta declinação, então por exemplo BATE 'moradia' sempre será na terceira pessoa SI-BATE, pois o verbo BA 'viver, morar' é da quarta declinação. Como eu disse anteriormente essas duas se fundiram e eu irei explicar logo após mostrar a declinação:


1ª pessoa singular: hi- (ghi-)

2ª pessoa singular: a- (â-)

3ª pessoa singular: i- (i-)

1ª pessoa plural exclusiva: hi-X-de (ghi-X-de)

1ª pessoa plural inclusiva: ku-(X-a) ~ cu-(X-a) (ku-(X-a))

2ª pessoa plural: a-X-a (â-X-a)

3ª pessoa plural: i-X-a (i-X-a)


 Àqueles que estão familiarizados com a primeira declinação devem notar que ela é bastante regular com a de Mamiani, já a quarta se diferencia da primeira pelo seu pronome de terceira pessoa ser SI- ao invés de I- e também por ter em sua maioria verbos e suas derivações, no entanto devo esclarecer algo, o Dzubukuá não possui o som /s/, dependendo de sua origem no Proto-Kariri este se transformou em /h/, /d/ ou /ð/, mas se esse for o caso, deveríamos ver a terceira pessoa sendo conjugada como hi- certo ? Seria uma ideia correta, porém o Dzubukuá que estava sendo falado na época de Nantes estava passando ou já havia passado por outra mudança sonora, uma que também ocorreu do Latim para o Português, que foi a derrubada do som /h/, essa queda também parece ter ocorrido na língua de Wracapá, pois vemos dois cognatos que comprovam isso nas palavra *odde* de Nantes e a palavra *sode* de Mamiani, ambas com o significado de 'o quê, por quê', o que indica que houve a mudança de *sode > *hode > ode na língua Dzubukuá, portanto se presumirmos que a quarta declinação existiu no Dzubukuá e no Proto-Kariri, podemos entender que ela se fundiu por que a terceira pessoa que era /hi/ acabou virando /i/. Recomendo que todos os substantivos e verbos (passivos e ativos) que não possuam declinação estabelecida no catecismo por Nantes caiam todos nesta declinação.


Segunda declinação: Assim como no caso do Kipeá, são poucas as palavras que caem nesta declinação, algumas são preposições assim como no Kipeá como no caso de *oboho* (âboho) 'com', que surge como *anhi-eboho* (âñ-âboho) 'contigo', devo esclarecer que esse /i/ ao lado de nh não é uma vogal verdadeira e sim um indicador de que o nh se trata do som do n palatalizado assim como ninho, e não o encontro entre uma consoante que representa o som nasal da vogal anterior e um /h/ independente, como em nanhe 'senhor' que é para ser pronunciado como nã-he ou nhinho 'Deus' que é na verdade ñῖ-gho. As mesmas palavras que você vê na segunda declinação do Kipeá caem aqui e são conjugadas da seguinte forma:


1ª pessoa singular: hi- (ghi-y-)

2ª pessoa singular: anhi- (âñ-)

3ª pessoa singular: h- (h-)

1ª pessoa plural exclusiva: hi-X-de (ghi-y-X-de)

1ª pessoa plural inclusiva: k-(X-a) ~ c-(X-a) (k-(X-a))

2ª pessoa plural: anhi-X-a (añ-X-a)

3ª pessoa plural: h-X-a (h-X-a)


Terceira declinação: Esta possui menos exemplos ainda, o único verbo que surge tanto no Kipeá quanto no Dzubukuá seria o verbo *enunhe* 'guardar-se', este felizmente surge conjugado no Dzubukuá e nos indica que esta declinação também existia como algo separado da segunda, é difícil dizer se ele seguia as mesmas condições que o Kipeá, pois na língua de Mamiani, a condição para uma palavra entrar nesta seria a de começar com a vogal E, devo esclarecer que uma das palavras que encontramos no Kipeá que cai nessa declinação *ena* 'barba' surge no Sapuyá como z-anatih, o que indica que nem todas as vogais desta declinação eram obrigatoriamente /e/ etimológicos, o que indica que poderia haver outra condição para uma palavra entrar nessa declinação. Recomendo tanto para esta declinação, quanto para a segunda que todos verbos e substantivos novos que chegarem sejam escolhidos pessoalmente pelos representantes do dialeto que está sendo falado, aqui está a forma que a declinação toma nesta língua:


1ª pessoa singular: hidz- (ghi-dz-)

2ª pessoa singular: andz- (âm-dz)

3ª pessoa singular: h- (h-)

1ª pessoa plural exclusiva: hidz-X-de (ghi-dz-X-de)

1ª pessoa plural inclusiva: k-(X-a) ~ c-(X-a) (k-(X-a))

2ª pessoa plural: andz-X-a (âm-dz-X-a)

3ª pessoa plural: h-X-a (h-X-a)


 Quarta declinação: Como vimos antes, a quarta declinação de Mamiani havia se fundido com a primeira por motivos fonéticos, portanto esta quarta declinação será equivalente da quinta declinação do Kipeá, a diferença principal desta versão para a de Mamiani seria a preservação da forma completa do pronome da primeira pessoa singular e plural exclusiva, já que este era composto do pronome em si hi- (ghi-) junto com o prefixo relacional -dz- que vimos na terceira declinação e o antigo prefixo genitivo -u-, formando hi-dz-u (ghi-dz-u) 'eu, meu', a segunda diferença seria na ausência do s- da terceira pessoa, que como falei antes por motivos fonéticos se transformou em h- e depois foi perdido completamente, então ao invés de hu- temos apenas o prefixo u- sozinho, esta é a forma que a quarta declinação toma no Dzubukuá:


1ª pessoa singular: hidzu- (ghi-dz-u-), dzu- (dz-u-)

2ª pessoa singular: a- (â-)

3ª pessoa singular: u- (u-) ou sem marcação

1ª pessoa plural exclusiva: hidzu-X-de (ghi-dz-u-X-de), dzu-X-de (dz-u-X-de

1ª pessoa plural inclusiva: k-(X-a) ~ c-(X-a) (k-(X-a))

2ª pessoa plural: a-X-a (â-X-a)

3ª pessoa plural: u-X-a (u-X-a) ou X-a (sem marcação)


 Devo esclarecer que se palavra já possui um u- na frente, como por exemplo *ubette* (ubete), não é necessário colocar outro u- na frente, pois essa palavra já está conjugada, portanto sempre será *ubette* (ubete) e jamais *uubette* (uubete).



Autor da matéria: Ari Loussant



quarta-feira, 1 de março de 2023

O PASSADO RECENTE OU PASSADO IMEDIATO DA FAMÍLIA KARIRI


 Conhecemos o pretérito perfeito kli/kri das línguas Dzubukuá e Kipeá respectivamente, assim como a partícula do futuro di que surge no final das frases, hoje no entanto gostaria de falar de um sufixo que surge algumas vezes no Dzubukuá e que sumiu do dialeto Kipeá, esse sufixo é algo que também surge na família mais próxima ao Kariri, que é a família Karib, o sufixo do passado imediato *-li ~ *lɨ.

 

 Eu já discuti sobre esse sufixo no passado antes e hoje posso afirmar que se trata do mesmo sufixo do passado recente que se encontra na família Karib, o melhor exemplo do uso deste morfema na língua Dzubukuá se encontra aqui:


Katecismo Indico, pág 200 e 201 

Do uro *muiquedeli* túpam do Itiddadde dzocrôyeidze mo radda... = Para isto *mandou* pela grande continuação das chuvas hum diluvio de agoas...

 

 A diferença entre li e kli seria simplesmente do tempo em que a ação foi feita, a diferença seria como entre 'faz pouco tempo que ele mandou fazer isso' e 'faz bastante tempo que ele mandou fazer isso', ambas as frases estão no passado, mas existe uma indicação de o quão longe cada uma está do presente, é praticamente a mesma coisa com li e kli, li seria para ações que o falante considera recente (faz pouco tempo, agora a pouco, agorinha, nesse minuto, nesse instante, etc) enquanto kli que deriva do advérbio 'já' daria a entender que a ação foi concluída há mais tempo atrás (faz tempo, faz muito tempo, faz dias, faz anos, etc), tudo depende de o quão longe o falante acha que algum tópico está do tempo atual.

 

 O Kipeá parece ter se livrado dessa distinção de passado, enquanto no Dzubukuá -li era raro na sua função anterior e parecia ter se limitado bastante à respostas afirmativas, em ambas as línguas ele sobrevive de forma produtiva no circunfixo do partícipio d-X-li/ri. O propósito desse texto é revitalizar o sufixo -li em todos os dialetos, para indicar o passado imediato, aproveito também para sugerir como neologismo o futuro imediato baseado na raiz *le 'pouco, breve', ele funcionará de forma similar ao sufixo do futuro que já existe, sendo colocado no final das frases, para exemplificar este novo sufixo aqui estão quatro exemplos:


Dzubukuá: ghi-do le = comerei (em breve, logo, daqui há pouco)

ghi-do di = comerei (mais tarde, outra hora, depois)


Kipeá: hi-nà rè = trabalharei (em breve, logo, daqui há pouco)

hi-nà dì = trabalharei (mais tarde, outra hora, depois)


Aqui estão as reconstruções:

*-li 'sufixo do passado imediato'

Dz.: -li

Kp.: -rì

Sp.: lí

Km.: lùi

Kt.: -ri

KX.: -lí, -rí

Pp.: -rí


*-le 'sufixo do futuro imediato'

Dz.: le

Kp.: rè

Sp.: lé

Km.: lè

Kt.: re

KX.: lé, ré

Pp.: rê



Autor da matéria: Ari Loussant