Existem duas palavras registradas separadamente nas línguas Xocó e Wakonã cujo possuem raízes similares, essas palavras são:
ôlôfô 'soldado'
ôrôní 'esse, pronome demonstrativo proximal'
Ainda não sou capaz de afirmar com total certeza a procedência de fô de ôlôfô, note a semelhança com raízes referentes a bater como no Proto-Macro-Jê *mbok e o Kariri pó 'ser espancado, bater'.
ôrôní no entanto tem uma origem certa, comparável com o demonstrativo proximal (i)ni 'este' da língua Kandoxi, comparável também a prefixos de terceira pessoa do singular derivados possivelmente de cognatos destes dois demonstrativos (JOLKESKY, 2016, p. 285, 292, 398, 459, 522).
Com isso, gostaria de propôr uma teoria para ôrô/ôlô, cujo a presença na seguinte frase talvez indique algo interessante sobre a gramática das línguas Katuandí:
ôrôní atêrêgin jarigá 'quem índio é esse ?' (ANTUNES, 1973, p. 139)
Sabemos que atêrêgin é 'indígena' como visto em várias outras palavras discutidas aqui anteriormente (ãjikêô, zitok, ajím, etc...), portanto jarigá é o verbo em sua forma interrogativa j-ari-gá '3-ser-INTERR', pode-se confirmar todas esses significados a partir de cognatos em outras línguas:
j = i- 'prefixo de terceira pessoa' encontrado no:
Kariri: i-
Tupi: i-
Macro-Jê: i-
Fulni-ô: e-
Arawa: NI ʔi
Mura-Matanawi: PRH ʔi ‘3.F’
Mapudungun: -i
e vários outros
O verbo arí 'ser' é confirmado pelas seguintes palavras:
Arawak: AXN ari 'sim', MCG ario 'sim', NMT aro 'sim'; IGN ani ‘assim’; YVT ani ‘então/3.S’
Quechua: PKC *ari 'sim'
-gá como sufixo interrogativo possui cognato direto no Proto-Arawak *-ka 'sufixo interrogativo'
Com o verbo, o interrogativo e o substantivo 'indígena' confirmados, resta apenas o demonstrativo 'esse' da frase de Antunes, cujo podemos confirmar através do processo de eliminação que foi feito aqui que ôrôní é o demonstrativo. O ponto desta publicação é demonstrar que o Katuandí tinha algo similar ao Tupi, que eram as classes de animacidade, o que no Tupi Antigo foi denominado por seus estudiosos como classe superior e classe inferior.
Essas classes também pareciam existir no Wakonã e no Xocó, podemos presumir que o Peagaxinan (Natú) também as tivesse, no entanto não sabemos de seu equivalente "inferior" ou "inanimado", que seria no português os pronomes de objetos "isto", "isso" e "aquilo", também aproveito para dizer que falta o demonstrativo distal 'aquele, aquilo' de forma independente.
Proponho a seguinte solução:
MARCADOR DE INANIMACIDADE
Após pesquisar sobre o marcador de seres animados ou superiores ôrô-, descobri que ele tem relação direta com as seguintes palavras:
Arawak: GRF araɡʷaku 'homem', LKN arhoaka 'homem'
ou talvez
Arawak: BWN ɨʀɨ 'pai', IÑP ɨrɨ 'pai', BRE hiɾ ‘homem’
Todas com o significado de homem, seguindo esta mesma lógica e aplicando a lógica comum de marcação de seres animados e inanimados nas línguas do mundo, os humanos, espíritos e deuses cairiam na classe ôrô-, portanto sobrando apenas os objetos e outros seres vivos não-humanos, cujo sugiro que seja marcado por mati- 'milho', portanto temos:
demonstrativos animados:
ôrôní 'este' (proximal)
ôrôkám 'esse' (medial)
ôrôlhí 'aquele' (distal)
demonstrativos inanimados:
matiní 'isto' (proximal)
matikám 'isso' (medial)
matilhí 'aquilo' (distal)
ôrô- e mati- servirão de traduções de termos tupis que possuam poro- e mbae-, para os equivalentes do Tupi Antigo com os prefixos t- e s-, recomendo o uso de a- e u-, a- 'prefixo de classe superior/animado' vindo do prefixo de argumento genérico e u- 'prefixo de classe inferior/inanimado' vindo do prefixo relacional u-/w-.
Autor da matéria: Suã Ari Llusan
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