sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

O SIGNIFICADO DOS NOMES DAS ETNIAS DA NAÇÃO KARIRI


Me foi perguntado o significado autodenominativo do verbete 'Kariri', isto é, qual o significado dessa palavra para os próprios Kariri. Posso dizer logo de cara que Kariri ou Kiriri é que é chamado de "exônimo", exo- como em êxodo se refere a uma coisa de fora, -nimo é nome, portanto exô-nimo é o 'nome de fora', os Kariri até onde fui capaz de perceber se dividiam em três grupos, baseados em uma divisão similar àquela vista nos Jês Setentrionais, de Pais/Avós e Filhos/Filhas, digo isso demonstrando aqui estes nomes:


Dzubukuá: dseho (povo descendente), dseho buhe (povo vermelho)


Kipeá: nhihò (povo avô, povo velho, compara com NHI de NHI-KÉ 'avó' e a relação aproximada dos Kipeá com os Natú, que também significado 'velho' na língua Natú)


Kamurú: klöh (relacionado ao Akuwẽ kra 'filho, filha')


Sapuyá: glöh, löh (mesmo grupo que o Kamurú)


 Como é possível ver, os povos Kariri se identificavam de formas distintas, o Dzubukuá herdou sua palavra de um antigo *ka 'filho', palavra esta vista nos vocabulários de muitas línguas do Nordeste, como no Karatiú (Tarairiú) akó 'filho' e kómatyn 'príncipe', o nome do povo Tru-ká e o nome do povo Xokó (< Sê-ókó, visto também como Xoká), o Kariri palataliza suas velares surdas (o som de /k/) para kya em certos ambientes, esta palatalização levou o kya, kye, kyi, kyo, kyu a virar tsa, tse, tsi, tso, tsu com o tempo, além dos /a/ em muitos casos terem virado schwas /ə/, digo tudo isso para argumentar que a mudança de ka para dse é absolutamente regular seguindo os padrões de evolução do Dzubukuá, fazendo com que estes sejam os dse-ho 'o povo descendente, o povo dos filhos'.


 Os Kipeá faziam parte de uma divisão que havia se separado junto com o povo Terejê conhecido como Natú, que provavelmente tinham vários clãs, um deles sendo os Peagaxinã (Os da pisada do mutum), que pareciam ser os mais importantes, pois seu nome foi que inspirou a tradução do nome KI-PE-Á (Os da pisada da ave), as raízes aqui citadas podem ser encontradas no Kamurú KI-gropi 'pássaro' e no próprio Kipeá PÈ 'pisar'. Voltando para o endônimo Kipeá, isto é, o nome que eles se davam como povo coletivamente e independente da divisão das aldeias, o nome era NHIHÒ, vemos um paralelo de HÒ com o Dzubukuá dse-HO, possivelmente a palavra para 'pessoa, gente, humano', NHI só tem um cognato claro anotado, que é a palavra NHI-KÉ, que está sufixada com -KÉ que torna as palavras femininas, retirando esse sufixo nos sobra NHI 'velho, idoso', portanto temos os NHI-HÒ 'o povo velho, o povo dos ancestrais'.


Terminando esta parte com os Kamurú e Sapuyá, ambos se chamavam de uma variação de klöh, facilmente identificável como uma palavra do grupo Macro-Jê, talvez vinda através do Terejê, seu cognato mais próximo se encontra no Xerente kra 'filho, filha' e no Xavante 'ra 'filho, filha' ( < *kra). Eles também, assim como os Dzubukuá, se chamavam de 'descendentes', mas usavam uma palavra diferente destes, o que talvez indique de que se tratavam de um grupo que se considerava distinto dos demais Kariri, formando o grupo KLÂ.


Indo para os nomes das etnias dentro destes grupos citados acima, Dzubukuá se divide como Dzu buku-á 'aqueles das águas brancas', antigamente pensei que havia algo de errado com a classificação do nome, pois o classificador normal de líquidos é krô- no Dzubukuá, mas percebi que dentro do Katecismo Indico havia o exemplo de dzubuye 'mar' que claramente mostrava que essa regra não é rígida, portanto esse é o significado do nome desta etnia.


Kipeá foi explicado ali em cima como tradução do clã/subgrupo Natú chamado Peagaxinã, portanto significa 'aqueles da pisada da ave'.


Sapuyá se refere a um rato silvestre, chamado de rato-de-espinho, derivado de uma palavra Tupi, também derivou a palavra cobaia, vindo de çabuîa 'rato que se come'.


Kamurú, de acordo com Teodoro Sampaio, se refere ao robalo, um peixe abundantemente presente no Rio São Francisco.





Autor: Suã Ari Llusan 





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