sábado, 24 de fevereiro de 2024

A HISTÓRIA DA HUMANIDADE DZUBUKUÁ PARTE I

 

Bernardo de Nantes produziu com ajuda de Martinho de Nantes, o conteúdo que viria ser a base documentada da cultura Dzubukuá, os dois descreveram alguns contos importantíssimos da cultura dos indígenas de Wracapá, o primeiro foi com a menção de que o Deus Criador (Menerurú de Serafim Leite, Nhinhò dos Dzubukuá) enviou um amigo para a terra, este amigo é o mesmo que vemos no último texto sobre os comentários do Conto de Pissôrê Wakonã, como os Wakonã também se identificavam diretamente como Kariri, é possível que o conto de Pissôrê fosse uma parcela daquela história vista na "Relação de uma Missão no Rio São Francisco" de Martinho de Nantes, explicarei de forma resumida.


 Primeiro, seguiremos de onde parei, o Deus Criador do Universo tinha um amigo, esse amigo foi enviado para a terra para viver com os indígenas, o propósito nunca é explicado diretamente, mas pode-se presumir que o propósito do Amigo era trazer o conhecimento para a humanidade, quando ele chegou, ele viveu entre os indígenas por anos, casou-se, teve filhos e filhas e formou uma família inteira, tanto que o conto de Pissôrê diz que a Estrela D'Alva é uma parenta do pajé, nunca diz se é uma filha, prima, sobrinha ou qualquer coisa do tipo. Pode-se inferir que ela era mais nova, portanto de uma geração que veio depois do Amigo, pois o conto Dzubukuá diz claramente que o Amigo, lá chamado de Grande Pai, era velho fisicamente, se Pissôrê e o Grande Pai forem a mesmo pessoa, isso significa que o Amigo foi trasladado para o mundo espiritual em uma idade já avançada ou sempre teve uma idade avançada em sua aparência.


 O Amigo ensinou tudo que podia para o povo Terejê-Kariri, e sempre estava disposto a ajudá-los quando necessário, mas uma coisa consistente sobre essa entidade é seu comportamento irritadiço, é claramente implicado que se ele for perturbado demais por qualquer coisa, ele a fará, mas haverá uma pegadinha por trás, mostrando que esse Amigo é um herói civilizador com características de um trickster, um exemplo claro disso é quando os Dzubukuá pedem por caititus (malan-hou-a na língua, malan 'mata, selvagem' + hou 'porco, caititu' + -a 'plural'), o Amigo talvez estivesse irritado pela insistência, pois mandou-os sair para caçarem, no qual tomou a oportunidade para transformar as crianças em caititus, quando os indígenas voltaram, perceberam a falta das crianças, mas não questionaram o Amigo. "Vocês queriam javalis, vão à caça e os encontrareis", disse o Grande Pai, mas o Amigo fez os javalis subirem uma grande árvore, no qual também subiu em seguida, a história continua descrevendo como os indígenas fizeram para alcançar, ela também justifica porquê os humanos tem linhas nas mãos, explicando que foi porquê caímos da árvore na busca pelos javalis.


 Depois de recuperarem os seus filhos, agora catetos, comeram-nos arrebentados. Aqui o conto se diverge na versão Wakonã para a versão Dzubukuá, ou melhor, a linha do tempo talvez não esteja bem descrita ou talvez sejam interpretações que cada divisão da nação Kariri fez. Os Wakonã e Dzubukuá concordam que o Amigo voltou para o mundo espiritual, mas o conto Dzubukuá pula diretamente para quando os indígenas suplicaram pela volta dele, o Grande Pai respondeu ao mandar no seu lugar três espíritos: Badzé (Fumo), Politam (Jovem) e o Wanagidzé (Sonhos), cujo talvez seja um simbolismo para representar a chegada/introdução desses três rituais na religião Kariri.


 Os Wakonã dizem que ele voltou para o mundo espiritual, que sua parenta Estrela D'Alva guiou outra parte do povo para o céu, tornando-se as estrelas, assim temos uma conclusão da primeira humanidade e a sobrevivência de algumas famílias em dois grupos distintos: Irô Atêrêgin (Povo das Estrelas) e o Atícêrê Atêrêgin (Povo na Terra).


 A ênfase que a cultura Kariri dá para o céu não para apenas aí, é notável que existem menções diretas do céu e do criador como entidades relacionadas uma a outra, os Xocó e Wakonã chamam seu Deus de Sonsé, assim como chamam seu céu de Sonsé, cujo derivam de palavra antigas que significam 'para cima, acima', cognatos distantes do Tupi Antigo çoçé 'acima'. Serafim Leite anota sobre Menerurú, 'deus que subsiste no ar' de acordo com o padre, novamente dando ênfase naquilo que está acima de nós, o ato da Estrela D'Alva subir aos céus com seu povo e tornarem-se as estrelas que pintam a abóbada noturna pode ser um simbolismo para o retorno ao divino, ancestrais nossos que não ficaram na terra, mas alcançaram a eternidade, um objetivo e esperança dessa cultura. Como Nhenety me descreveu, o projeto original divino era a imortalidade do homem e da mulher, tanto em corpo como em alma, mas a decadência da humanidade vem aos poucos cortando essa conexão com o divinal.




 

Autor da matéria: Suã Ari Llusan 




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