quinta-feira, 24 de julho de 2025

UTUÁ SITÉ DINHI, A Fábula das Frutas que Vieram de Longe






A Fábula das Frutas 


Há muito tempo, no coração da floresta Retséá, os Uanieá — os verdadeiros filhos da terra — viviam em harmonia com os hamo, kerí, pipire, kukõj e as pequenas kati que zumbiam entre as flores nativas.


Certo dia, vieram de longe os Carai, os brancos, navegando pelo grande rio Opará. Trouxeram suas ferramentas afiadas e, com elas, cortaram as árvores sagradas da mata. Nas terras Radda dos povos originários Kariri e de seus parentes Etçamyá, os Carai plantaram novas sementes, desconhecidas dos animais e da floresta. Chamavam-se Utuá Sité Dinhi, "as frutas que vieram de fora". São elas: maçã, uva, jaca, manga, laranja, café, cana, além de legumes e verduras.


Essas frutas eram vistosas, coloridas, diferentes. Mas os bichos da mata desconfiaram. “Não têm o cheiro da mata”, diziam as kati. “Não crescem como as nossas”, gritavam os pipire. Os kukõj, desconfiados, apenas observavam. Ninguém se atrevia a provar.


Um Krêre, papagaio falador e curioso, foi capturado pelos Carai e levado para viver entre eles. Viu como os brancos cuidavam das frutas novas e como as comiam com gosto. O tempo passou, as estações giraram, e um dia o Krêre escapou e voltou à Retséá.


Logo os animais o cercaram:


— Krêre, tu que esteve com os Carai, nos diga: essas frutas novas são veneno ou alimento? — perguntou o velho Kukõj.


O papagaio pousou num galho alto e respondeu:


— As frutas são doces, algumas têm sabor nunca visto! Mas atenção, irmãos! Nem tudo o que brilha é bom para todos. Cada bicho deve experimentar com sabedoria. O que faz bem ao Carai pode ser ruim para o Kerí. Observem, provem com calma, descubram quais frutas combinam com sua natureza.


— E se gostarmos, poderemos comer sempre? — quis saber a abelha Kati.


— Sim, mas com moderação, pois até o doce em excesso vira amargor — respondeu o sábio Krêre, batendo as asas.


E assim, com o tempo, os animais aprenderam a conhecer as frutas novas. Uns as adotaram com alegria, outros as deixaram para lá. E a floresta seguiu viva, entre sabores antigos e frutos vindos de longe.


Moral da fábula:

Nem tudo que é novo é ruim, nem tudo que é belo é bom. A sabedoria está em conhecer, escolher e respeitar os limites do próprio ser.





Autor: Nhenety Kariri-Xocó 




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