domingo, 28 de novembro de 2010

BRINCADEIRAS

   Nossos quintais na rua dos Índios, cada um tinha uma cerca de madeira no fundo, com um portãozinho ao lado. Dava para a lagoa do Cordeiro, que banhava em círculo os quintais das outras ruas: Santa Cruz, Dr. Clementino do Monte. Na margem da lagoa, a vegetação era um pouco baixa: existia velame, pipeira, ingazeiro, marizeiro e ramagens.
A meninada gostava de brincar de cozinhada, em que cada um dava um pouco para fazer a misturada. As meninas davam as panelas, sal e arrumavam lenha, além de varrerem o pé do velho ingazeiro. Os meninos saiam para o mato para colher frutos silvestres e caçar passarinhos de peteca e apanhar sardão e os outros temperos do mato: tomatinho, alfavaca, ciguleira, maxixe. Os meninos eram quem mais suavam para arranjar a mistura. Mas aquela lagoa era farta, além do peixe; os moradores jogavam lixo nos fundos dos quintais e ali nasciam verduras e legumes das sementes jogadas fora.
Quando tudo estava arranjado, os meninos levavam a caça, a pesca e a colheita para que as meninas começassem a cozinhada; elas tratavam do preparo dos alimentos e cozimento. Após as tarefas cumpridas, a menina maior do grupo era quem fazia a divisão, colocando nos pratinhos de barro, ou em cacos de potes quebrados, a comida de todo o grupo, e todos saiam satisfeitos com a brincadeira.
Fazíamos pequenas canoas de raiz de timbauba, colocávamos um pano para pegar corrida na lagoa do Cordeiro. Mas as brincadeiras eram por época; às vezes demorava muito tempo para uma acontecer. No tempo do caju, brincávamos com a castanha: colocando uma encostada na parede, tentávamos acertar e quem conseguia ganhava todas as castanhas jogadas. Quando apareciam os ventos, em certa época do ano, fazíamos pequenos corta-ventos colocados numa vara suspensa com a mão. Na safra do milho, as meninas brincavam com as bonecas que nascem no pé.
Uma outra brincadeira... Um menino segurava um pedaço de pau lá na beira do rio e gritava: "galinha gorda!" Os outros respondiam: "gorda!" Aí, ele continuava: "para o meio ou para a beirada?" Os outros respondiam: "para o meio!" Ele sacudia o pedaço de pau bem no meio das águas e todo mundo começava a nadar para ver quem era o mais rápido nadador.
Também no rio, tinha a brincadeira de derrubar: eram dois pares de meninos, com o grande colocando o menor nos ombros, ambos em pé, com água na cintura; começava a luta entre os que estavam em cima; quem derrubasse seria o vencedor. A minha brincadeira predileta era atirar com uma lança de madeira para acertar o pé de mamoeiro da minha avó Júlia. Na aldeia só tinha um pareio para disputar comigo: era o meu primo Joelton, filho de Tio Jó (Josival). Gostava muito de fazer um alvo, mesmo no chão e atirar a lança para o alto e acertar no círculo riscado com uma pedra.
O jogo da peteca, feita de palha de milho com pena de pato, era uma roda de meninos batendo com o brinquedo na palma da mão, sem deixar cair. Aquele que derrubasse sairia da brincadeira, ficando no final só dois para disputar a vitória. Eu mesmo não era muito bom nessa brincadeira, perdia todas.

Nhenety Kariri-Xoco

Nenhum comentário: