terça-feira, 9 de agosto de 2022

ESTUDO SOBRE O SUBSTRATO DO KARIRI


 Esse é um estudo um pouco mais avançado, trata-se de uma discussão sobre a possível ou as possíveis línguas que influenciaram a família Kariri ao longo de sua história, línguas de substrato são línguas de menor influência que são suplantadas por línguas de maior influência (nesse caso o Kariri), mas ainda assim deixam traços de sua existência na fonologia e no léxico da língua maior, isso aconteceu com as línguas celtas que influenciaram as línguas romances que as suplantaram, como no caso do Português, Espanhol e Francês.


 Os Kariri muito provavelmente migraram de sua Urheimat (termo linguístico para se referir à terra natal de um grupo linguístico) na Amazônia para o Nordeste Brasileiro, provavelmente seguindo o caminho dos rios e se assentando em alguns, como os Dzubukuá no Rio São Francisco. Ao longo dessa migração, sem dúvidas esse povo interagiu com outras nações de outros grupos linguísticos, e essas interações deixaram suas marcas dentro da língua Kariri:


 Substrato Macro-Jê


 Essa é a hipótese cujo o léxico é mais fácil de se achar, existem vários exemplos de palavras que tem cognatos dentro da família Macro-Jê, antes achei que era uma herança comum do Proto-Brasílico, mas muitos desses vocábulos parecem ser específicos do Macro-Jê, o que me leva a crer que houve uma língua dessa família que interagiu bastante com os Kariri e exportou seus vocábulos para eles, estas são algumas palavras para exemplificar:


Kro 'pedra', do Macro-Jê *kra(C) ~ *krỹ(C), parece ter semi-suplantado o *də 'pedra, monte' nativo.


Kra 'peito', do Macro-Jê *krat 'base, quadril', se fundiu com o *bu 'pele, casca' nativo para formar *kra-bu 'peito', não existe sinônimo para essa palavra, o que provavelmente indica que *kra substituiu um termo anterior do Proto-Macro-Caribe (também é possível que tenha entrado em um período bem cedo da história do Kariri, a ponto de se tornar a primeira palavra para peito, mas essa hipótese é menos provável).


Ki 'osso' e Bu 'garganta', muito provavelmente de um composto *ci-mbut 'osso-pescoço', nenhum dos dois suplantou *me 'osso' e *nə 'pescoço', o que implica que essas palavras entraram como um composto nas línguas Kariri, Nikulin limita a palavra *mbut ao grupo do Proto-Cerrado, além da palavra para osso ser ki, cujo se assemelha mais ao *ci do Proto-Cerrado do quê o *cet ~ *cek do Proto-Macro-Jê, o que indica que esse composto deriva de uma língua Jê desse grupo.


*pẽ ~ hẽ 'madeira, árvore', cognato do Proto-Macro-Jê *pĩm 'madeira, lenha', a alteração da vogal de *ĩ > *ẽ indica que esse empréstimo entrou bem cedo dentro da família Kariri, a ponto de ter tempo de evoluir junto com a língua, a alteração de *p > *h não parece ter relação com a evolução de *p > *hʷ do Tapayúna e Suyá, essa alteração parece ter ocorrido independentemente dentro do Kariri, não substituiu *dz-i 'madeira' e parece ter coexistido como um sinônimo em alguns dialetos, como no Dzubukuá hemdzi.


 Estes são apenas alguns exemplos que demonstram o quão influente o léxico Macro-Jê foi para as línguas Kariri, a ponto de influenciar até mesmo no léxico anatômico ou palavras tão simples quanto 'pedra' e 'madeira', em alguns casos parece até mesmo ter tomado o lugar de um termo derivado do PMC.




Autor da matéria: Ari Loussant



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