terça-feira, 29 de julho de 2025

KERUÁ UANIEÁ, Animais Criados na Aldeia Indígena






Uma Fábula de Amor aos Animais 


Era uma vez, na aldeia encantada de Natiá, um círculo de casas coletivas chamado erá, construídas com sabedoria dos antigos e voltadas para o grande terreiro Iworó, onde os passos da vida ecoavam no modo tradicional nhenetí. Ali, tudo vivia em harmonia com as árvores sutuá, que sussurravam histórias ao vento.


Nessa aldeia moravam não só os parentes humanos, mas também os parentes de penas, de pelos e de casco. Araras de mil cores voavam sobre os tetos de palha. Papagaios tagarelas repetiam as falas dos pequenos. Macacos brincavam de esconder com as crianças, enquanto o quati curioso vasculhava panelas e a cutia ligeira fazia correr os pequenos guerreiros.


Tinha ainda os jabutis pacientes e os patinhos amarelinhos, que andavam desajeitados como quem dança ao som da vida. Os animais não estavam presos — viviam soltos, como os ventos que sopravam entre os troncos do mato. As crianças falavam com os bichos, e os bichos respondiam com gestos, olhares e sons cheios de afeto.


Enquanto os homens iam pescar e caçar, as mulheres cuidavam da casa e do alimento, e os pequenos viviam entre risos, brincadeiras e histórias vivas com os animais.


Um dia, chegaram os colonizadores, trazendo novos animais em suas canoas e carregamentos: galinhas cacarejantes, bodes que teimavam em pular cercas, ovelhas macias como nuvem, porcos rosados, perus barulhentos e até um pavão que parecia carregar um pedaço do arco-íris em sua cauda.


Os antigos olharam, os pequenos se encantaram, e a aldeia passou a acolher esses novos seres com o mesmo respeito dado aos primeiros. Mas entre todos os bichos que vieram e os que já viviam ali, o pato-do-mato era o mais antigo amigo do povo. Dizem os velhos que ele foi o primeiro a aceitar viver ao lado dos humanos, e até hoje faz parte das casas e dos quintais pelo Brasil afora.


Assim, entre voos e passos, entre penas e risadas, os animais da aldeia cresceram junto ao povo. E o ensinamento ficou:


"Todos os animais são importantes para nosso alimento, mas criar com amor é o que faz bem para a alma e para o corpo."


E assim termina essa fábula, que vive em cada aldeia, em cada criança, em cada bicho solto que ainda corre no terreiro da memória.




Autor: Nhenety Kariri-Xocó 




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