Uma Fábula do Vampiro da Noite
Nas profundezas das florestas brasileiras, onde a escuridão se esconde em cavernas e grutas, vivia Xepre Kayá, um morcego vampiro astuto e silencioso. Alimentava-se do sangue de outros animais — às vezes de mamíferos, outras vezes de aves — mas sempre agia com tanto cuidado que a vítima mal percebia sua visita.
O maior vampiro de todos é o Morcego-espectral, conhecido popularmente como Morcego-fantasma-grande, os indígenas Tupi chamam de Andirá-guaçu.
Numa noite de luar prateado, Caburé, a velha coruja, pousou sobre um galho alto e anunciou com seu canto pausado:
— Cuidado, irmãos da floresta! O Xepre já desperta!
O veado, a anta e o macaco estremeceram. Até os animais domésticos — o cavalo, a cabra e o boi — ouviram o aviso e buscaram abrigo. Mas nem todos prestavam atenção às palavras da coruja. E quando isso acontecia, Xepre surgia voando, rápido e silencioso como a sombra, pousava na vítima e saciava sua fome. Ao amanhecer, sempre ficava a marca: um pequeno corte no pescoço e um círculo de sangue seco, denunciando que o Vampiro da Noite passara por ali.
Nos tempos antigos, quando a floresta era imensa e intacta, Xepre nunca tocava os humanos. Havia alimento de sobra na vida selvagem. Mas com o passar dos anos, os homens brancos, que ele chamava de Caraí, começaram a derrubar árvores, abrir estradas e caçar sem medida. O alimento foi rareando.
Foi então que Xepre passou a voar cada vez mais perto das cidades. Seu instinto dizia: “Se não encontro sangue na floresta, buscarei onde houver.” E assim, na calada da noite, começou a visitar os próprios homens que destruíram seu lar.
E, desde então, toda vez que um animal ou pessoa encontrava no espelho uma pequena marca no pescoço, já sabia: o Vampiro da Noite estivera ali.
Moral: Quem destrói a morada dos outros, um dia encontrará o visitante que chamou para si.
Autor: Nhenety Kariri-Xocó
XEPRE KAYÁ, O Vampiro da Noite
( Versão em Verso e Rima – Estilo Conto Oral )
Nas brenhas da mata escura,
num silêncio sem igual,
vive o morcego Xepre Kayá,
medonho, mas natural.
Se alimenta de sangue quente,
bicho ou ave, é igual.
Quando a lua sobe alta
e a floresta se acalma,
a coruja Caburé avisa
com sua voz que não engana:
— Se escondam, meus companheiros,
que o vampiro já levanta a asa!
O veado foge ligeiro,
a anta corre pro brejo,
o cavalo, a cabra e o boi
se resguardam, todos atentos.
Mas quem não ouve o conselho
sente no pescoço o tormento.
Xepre voa em silêncio,
como sombra que não se vê.
Pousa leve, suga o sangue,
e a vítima nem crê.
Só no dia seguinte descobre
pela marca que o mordeu.
Antigamente era diferente,
na mata havia fartura,
não faltava alimento
e reinava a criatura.
Mas o homem branco chegou
derrubando a selva pura.
Sem árvores e sem caça,
o morcego mudou seu rumo,
passou a buscar nas cidades
o alimento de que faz uso.
E morde até quem destruiu
a floresta, sem nenhum susto.
Por isso, amigo, escute
e grave bem esta lição:
quem tira o lar do outro
atrai pra si a aflição.
E o Vampiro da Noite
vai cobrar com precisão.
Autor: Nhenety Kariri-Xocó
Nenhum comentário:
Postar um comentário