segunda-feira, 30 de setembro de 2024

A ORIGEM DO TERMO NHIHÒ, DO SUFIXO -HÒ E A TERMINOLOGIA COMUM DO NORDESTE


Algumas línguas da América do Sul definem os homens como 'altos' e mulheres como 'baixas', referindo-se à altura de ambos os sexos, é bastante comum ver no Nordeste essa terminologia:


Pankararú: sikiuru 'mulher', derivado do substantivo 'pequeneza'

Kariri: kützi, tidzi, tedzi 'mulher', derivado da mesma palavra que o Pankararú

Tarairiú: xenumprek 'homem', derivado de xenum 'corpo' + prek 'comprido'


Agora confirmo que o Kipeá e Dzubukuá herdaram esse sistema também, através de suas palavras para 'pessoa, gente', que são tçõho e dseho respectivamente. A palavra tçõ/dse deriva de um antigo *kya 'alto', que é uma redução de uma palavra mais antiga ainda *kawə, através da seguinte evolução:


*kawə > *kaw > *ka > *kya > *tsa > *tsə 'alto, comprido'


Enquanto -ho é descendente de um antigo -go, que por sua vez é um sufixo coletivo, assim criando *tsə-go 'povo comprido'.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



A PALAVRA BODZO 'MACHADO' É UM EMPRÉSTIMO DO ARAWAK


 A palavra nativa das línguas caribes para machado é wywy, cognato distante do Tupi îy 'machado' (Proto-Tupi *wy), fonologicamente, não é possível que essa seja a palavra ancestral de bodzo 'machado' das línguas Kariri.


 Porém, a palavra Lokono bařu 'machado' é um par perfeito com bodzo, levando em consideração que ř é pronunciado como se fosse uma mistura de r (o r do português antigo, que se repete muitas vezes /r/) + j, portanto um som que pode ser aproximado nos ouvidos de um falante Kariri para dz.


 balhu (usando a ortografia de Pet, 2011) é composto de ba 'ponta, fim' + lhu 'cortar' (GOEJE, 1928, p. 15, 31), assim ba-lhu 'ponta de cortar' ou 'ponta que corta'.


Goeje, The Arawak Language of Guiana, 1928, p. 15, 31.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



sexta-feira, 27 de setembro de 2024

OKREN 'FLECHADOR, ARQUEIRO LIGAÇÃO COM AS LÍNGUAS TEREJÊ


Tava procurando aqui saber o significado de *Okren* e acabei encontrando isso, bate perfeitamente com essa palavra, como as línguas Terejê tem derivação zero, o significado desejado aqui é provavelmente:


*_wakre_* 'flechador, arqueiro' > Okren: *_wkren_* (redução silábica + nasalização)


     Segundo o professor Valdivino Kariú Warazu pode ser uma influência da pronuncia tupi, Wrazu a forma dos povos Tapuias pronuncia. Karapotó (tupi)

Krapotó (Tapuia).



     O município de Orós-CE, orosi 'estar cheio' > oros.


Essa etimologia faz sentido, levando em consideração da posição exata do município, que é na entrada do açude Orós, que deriva do Jaguaribe.


  Minha teoria é de que o nome derive da língua dos Aruá.

Cujo o nome bate com a temática do rio Jaguaribe, de 'onça', veja ali em:


120 b) 2) arua, S. aruwa jaguar (onça)

120) e) 1) aroadi-, S. aroada 'engatinhar' (referindo-se ao modo que as onças predam).



Fontes: 


De Goeje, The Arawak Language of Guiana, 1928, p. 166



Krieger e Krieger, Akwẽ mrmẽze - Ktâwankõ mrmẽze Ktâwankõ mrmẽze - Akwẽ mrmẽze, Dicionário Escolar, 1994, p. 51.



Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



A PALAVRA PARA TAMBOR E CONCLUSÕES SOBRE SUA ESTRUTURA


A palavra para tambor em Dzubukuá, de acordo com Martinho de Nantes em sua relação, seria wrara, derivada do Tupinambá gûarará. A palavra possui uma mudança sonora em que a sílaba wa- se achata perante uma rótica (o som de r), assim wa-ra se torna w-ra, essa mudança sonora é bastante típica do grupo Jê Central, principalmente de seu grupo oriental, que consiste no Xerente, Xakriabá e Akroá, se comparadas as seguintes palavras com o Xavante, que é do ramo ocidental, vemos a diferença:


Xavante: warazu 'branco'

Xerente: wrazu 'branco'

Xakriabá: orazu 'branco'

Akroá: urazu 'branco'


A três últimas línguas reduzem a sílaba, argumento que um membro, especificamente os Akroá, tenham influenciado a fonética do Dzubukuá, pois membros deste grupo, os Okrens, viviam há algumas horas de distância dos Dzubukuá, no rio Salitre (COELHO SILVA, 2003, p. 168). Argumentei no passado sobre a relação extremamente próxima do Terejê (Xokó-Natú-Wakonã) com o Akroá especificamente, especialmente pelo seu uso exclusivo do prefixo a- ao invés de da- para marcar a terceira pessoa humana, assim, creio que os Okren sejam uma quarta derivação do povo Terejê, sendo eles, assim como os Natú para os Kipeá, os principais doadores das palavras Macro-Jê dentro da língua de Aracapá.



Fontes:


Nantes, Relação de uma missão no Rio São Francisco, p. 37


Coelho Silva, Arqueologia no médio São Francisco. Indígenas, vaqueiros e missionários, 2003, p. 168


http://linguistica.museu-goeldi.br/wp-content/uploads/53.J%C3%AA.L%C3%A9xicoB%C3%A1sicoClassifica%C3%A7%C3%A3o.pdf





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quinta-feira, 26 de setembro de 2024

INFLUÊNCIA ARAWAK NO KARIRI, A ORIGEM DA PALAVRA COTÒ 'COMER QUE SE GUARDA'


 A palavra cotò 'comer que se guarda' deriva de uma língua aparentada do Lokono que migrou para o Nordeste, visto que seu significado e formato batem perfeitamente com verbos daquela língua (khota, khoton) que significam 'comer, banquetear, jantar'


Fontes:

Rodrigues, O artigo definido e os numerais na língua kirirí, 1942, p. 189

Bennett, An Arawak-English Dictionary, 1989, p. 24

Pet, A Grammar Sketch and Lexicon of Arawak (Lokono Dian), p. 176




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



PRECONCEITO CONTRA OS POVOS INDÍGENAS


      No princípio dos contatos dos europeus com os nativos da América não foi harmônica, ocorreu para conquista de novos mercados dos produtos a serem explorados. Os povos indígenas eram vistos como seres inferiores a raça branca, os gentios deveriam serem dominados, explorados, escravizados e evangelizados com nova cultura bem com outra religião. 

         O Brasil na América do Sul não foi diferente, os povos indígenas seguiu nesse mesmo processo de dominação pelos portugueses, suas terras foram ocupadas, os nativos aldeados em missões jesuíticas, sujeitos a doenças, aculturação, escravização, muitos grupos fugiram para evitar a exterminação. 

        Atualmente ainda ocorre preconceito contra os povos indígenas, são chamados por alguns brasileiros de indolentes, preguiçosos, selvagens. Com a nova Constituição de 1988 os indígenas conseguiram avançar em alguns direitos sobre as terras, línguas, cultura, mas alguns deputados fazendeiros, madeireiros, seringueiros, mineradores dificultam o  cumprimento da constituição. Ainda assim temos brasileiros, estrangeiros simpatizantes da causa indígena que estão ao lado de um mundo melhor, na preservação das florestas onde os indígenas são os guardiões da natureza. 



Autor da matéria: Nhenety KX 



quarta-feira, 25 de setembro de 2024

A TONICIDADE DO DZUBUKUÁ EM COMPARAÇÃO COM O KIPEÁ


Em 2008, Queiroz descreveu que os acentos do Dzubukuá, seja o agudo ou grave, eram usados uniforme e unicamente para representar a sílaba tônica, no entanto venho aqui argumentar o contrário, visto que possuímos dados do Kipeá que contradizem alguns argumentos do autor citado.


 Veja que em Queiroz (2008, p. 91), o autor argumenta que hamodì, escrito com o acento grave, estaria marcando a sílaba tônica em -dì, no entanto, Mamiani registra o cognato dessa palavra como homodi (MAMIANI, 1877, p. 92), sem acento na sílaba final, um indício do autor da gramática e catecismo Kipeá de que a sílaba tônica é paroxítona, contradizendo o argumento de Queiroz e nos dando pistas sobre as funções práticas dos acentos que Nantes utilizou. Ao que parece, Bernardo de Nantes e seus colegas tinham conhecimento da ortografia politônica do Grego Antigo e estavam usando ela a todo vapor no Dzubukuá, indicando que na visão deles, o Dzubukuá era uma língua que fazia distinção tônica, sendo possível que esta fosse uma língua tonal.


 Tal conceito é familiar para os falantes de português brasileiro, visto que fazemos distinção entre *sabe* (SÁ-bì) e *saber* (sà-BÉ), onde a sílaba mais forte, ou tônica, modifica o sentido aplicado na palavra, tal sendo um sistema de dois tons, alto e baixo. O autor Queiroz sustenta o argumento de que o terceiro diacrítico de modificação da pronúncia da vogal seria o circunflexo [^], que de acordo com o argumento de Queiroz (2008, p. 65), representaria voz tremulante (creaky voice), cujo pode-se argumentar ter base em reduções de antigas codas do Proto-Kariri, um exemplo dado foi:


ñâ 'morrer'


 Cujo provavelmente vem de um Proto-Kariri *ñyk 'ser colocado para dormir', cognato ou descendente do Wayana *nyk-ma 'colocar para dormir' (Courtz, 2008, p. 326), indicando que perda de antigas codas e posterior monossilabização do morfema resultam em traços da antiga consoante permeando na vogal:


*nyk-ma > *nyk > *ñyk > *ñak > *ña̤ 'morrer'


Fontes:


Queiroz, Aspectos da fonologia Dzubukuá, 2008, p. 65, 91

Courtz, A Carib grammar and dictionary, p. 326

Mamiani, Arte de Grammatica da lingua brazilica da nação Kiriri, 1877, p. 92




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



terça-feira, 24 de setembro de 2024

A FUNÇÃO DE -BA NÃO DESCRITA POR NANTES NEM MAMIANI


Mamiani chamou -bae de um sufixo de elegância, enquanto Queiroz adota tal nomenclatura, mas na página 119 de sua tese (QUEIROZ, 2012), este autor diz que, quando um substantivo opera como predicado, este recebe o sufixo -ba, isso indica que a função desse sufixo não era vazia, e sim que este tinha função de verbalizador intransitivo, como vemos no Kaliña -pamy 'verbalizador intransitivo' (COURTZ, 2008, p. 335).


Fontes:


Queiroz, Um estudo gramatical da língua Dzubukuá, família Kariri, 2012, p. 119

Courtz, A Carib grammar and dictionary, 2008, p. 335




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE SEKWAKIRIHEN


 A palavra significa 'ancestrais', está na forma plural, marcada pela terceira pessoa se- 'eles(as)'. Kwakiri deriva de um antigo Wakiri, que se decompõe como:


wa 'distante, longo' + -kiri 'sufixo que forma substantivo', mesmo que -te do Dzubukuá, assim wa-kiri 'coisa distante, tempo distante'


-hen deriva do sufixo de substantivos verbais, implicando que wakiri havia adquirido o significado de 'ser antigo', precisando desse sufixo especial para marcá-lo como substantivo. Também é necessário notar que, como língua Aruaque, o Sekwakirihen adotou uma estratégia gramatical Caribe, por meio muito provavelmente dos Caripós e Dzubukuá que eram seus vizinhos ao leste, a estrutura circunfixal vista em se-...-hen é claramente inspirada no Kariri di-...-li e no Caribe ty-...-he.


 Por fim, o fato de eu estar trazendo essa etimologia é devido ao seu significado de 'ancestrais', que bate tematicamente com o nome do povo aparentado do Dzubukuá, os Txumimí, derivado de um antigo *jumy-my 'pais' (forma plural) e cognata do dzu de pa-dzu 'pai', é possível que, assim como os Natú, de fala Macro-Jê, eram da mesma nação que os Kipeá, os Sekwakirihen também eram considerados membros da nação Dzubukuá, sendo parte da mesma divisão Pai/Avô que os Txumimí participavam, sendo parte da divisão comum de metades sociais entre Pai-Filho que mencionei em publicações passadas.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



segunda-feira, 23 de setembro de 2024

O PRIMEIRO TORÉ EM DZUBUKUÁ


Pt.:


 Quando da Fumaça Antiga nascem os astros ancestrais, oito deles se tornam irmãos e irmãs e formam uma aldeia em um campo do céu além (immenna aranquewiddo) ao pedirem a Iddhuyedde (Grande Fogo), que mora no centro da fogueira para dar-lhes um lar, este se torna o centro dessa moradia, batizada de Ukie (queimar, Sol). 


 Um dia, queriam novamente comunicar-se com Sonsé, mas estavam distantes demais da Fumaça Antiga e não sabiam o que fazer sobre isso, eis que Iddhuyedde sugere que mandem mensageiros (dibabbuili) em direção ao Criador, para isso, é necessário que o ritual de um ciclo inteiro seja feito, o mestre do fogo ensina a primeira dança cósmica, que circulava a fogueira de Ukie, o Sol. Os astros, agora chamados de Ñike (avó), dançam desde de tempos primordiais, com cada ciclo sendo uma mensagem nova para Sonsé, a cada 5 de Junho, a resposta é dada através das sete Bati no céu do Ano Novo.


Dz.:


 No iha bo Badzè anranyedde clohemy-a, moeddhadique bo anroa ibybahi immoro co peanrabuyebahi mo immenna aranquewiddo no dadicliquie Iddhuyedde, dibbali mo muddhu iddhu, iddi anra iña iddôa, anro mymuddhu anrabuye anro, didzeli Uquie.


 Bihè uquie, danlan iñaa imme Ñin'ho hany, immaniidze Badzè anranyedde nelu, inedso iñaa widde ñatte idommo, ne Iddhuyedde ñeñeti iddi dibabbyli ho Ñinho, anro hany, innetto wan'ho olambyidze iña ploh, nanhe iddhu iquedde torè aranquewiddoccu bihè, toquiqui do coho iddhu Uquie, Clo-uquie. Clohemy-a, do ihi diccali Ñike, ittoraa ibo cloiho bihèccu, bihècliboe olamby iddeho dadiwrobabbyquie Ñin'ho hany, bihècliboe 5 Thedzo, iddicli welemy no Bati mo yaranque Bati.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA FINAL DE SUMARÃ OROBAE 'QUATRO' DO KIPEÁ


Descobri recentemente o significado do prefixo o- que surge na palavra orobae do Kipeá, que por si, só surge no composto *sumarã orobae* 'quatro'. A palavra aqui usada é robae 'todos', enquanto o- é um prefixo que significa 'ambos', cognato do Kaliña o- 'ambos', portanto:


sumarã o-robae 'todos os dois contrários'


 Provavelmente se referindo ao método que se contava, primeiro levantava-se dois dedos em uma mão para formar o wachani/witane 'dois', depois levantava-se os últimos dois dedos dessa mão, muito provavelmente sendo o anelar e o dedo mínimo, assim formando o *sumarã orobae* 'todos os dois contrários' aos dois dedos que vieram antes. Quando os quatro estivessem levantados, levantava-se o polegar para formar o amysã/ammoedha 'mão, cinco'.\


Fonte: 


Rodrigues, O artigo definido e os numerais na língua Kirirí. Vocabulários português-Kirirí e Kirirí-português, 1942, p. 182

Courtz, A Carib grammar and dictionary, 2008, p. 326




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



LÍNGUA SAKAKÑA, UMA LÍNGUA ARAWAK


 A língua Sakakña, e seus nomes variantes antigos: Sekwakirihen, Sakwakirihen, Sakakirihen, Sakakrihen ou Sakakriña (Sacacrinhas) é o idioma do povo do mesmo nome, habitantes do Rio Salitre, tributário do São Francisco, à algumas horas ao oeste do território Dzubukuá, no município de Cabrobó.


 Sua relação com as língua Arawak está em seu nome e nos empréstimos de origem Arawak que surgem no Dzubukuá e Pankararú. No caso do Dzubukuá, a palavra é aquela citada na publicação anterior: wanadzi 'remédio', enquanto a palavra Pankararú que é de origem Arawak é ipá 'pedra', o interessante aqui sendo a divergência do Lokono siba 'pedra', onde o s- desapareceu e o -b- do Proto-Arawak *kɨba 'pedra' sofreu desvozeamento para -p-, assim:



Proto-Arawak *kyba > Lokono Antigo *tsyba > Sewakrihen Antigo *hiba > Sewakrihen Clássico ipa 


 

 Isso explicaria por quê a língua desenvolveu s- onde antes havia j-, como no caso do pronome de terceira pessoa do plural *je-, que virou se- e depois sa-, como em Sa-kakri-ña 'eles dos velhos tempos, ancestrais', foi por quê os /s/ originais viraram /h/ e depois foram perdidos, como no caso do Dzubukuá com *sode > *hode > odde 'o que', isso indica que esse idioma fazia parte da esfera de influência do Dzubukuá, pois o sotaque se adequa às regras fonéticas desta língua Kariri e de outras línguas da região, como no caso do Masakará que também não tem /s/.


Um outro substantivo, cujo é difícil identificar a origem específica, mas que sabemos que é do tronco Arawak, é a palavra para milho das línguas Kariri, no Dzubukuá é madiqui, no Kipeá masichi e no Sapuyá-Kamurú mussigi, todas implicam em uma forma em *mayiki, é possível que o doador dessa palavra seja justamente o Sakakña, indicando que /ɾ/ virou /j/ em algum momento, enquanto /l/ virou /ɾ/ para compensar.



 Outros aspectos que podemos extrair dos nomes deixados são que, o som de /p/ virou /w/, como no caso do Proto-Arawak *pana 'folha' virando Sakakriña *wana 'folha', a consoante /w/ virou /k/, através de um processo praticamente idêntico ao do Dequeamamene (Aguamamune > Aquamamune > Acamamamune > Camamune), como em Lokono wakili 'velhos tempos' > Sakakriña kakri 'velhos tempos', as vogais são estáveis, não havendo mudanças radicais nelas, exceto por /e/ > /a/ e /ɨ/ > /i/, típico da região, assim como Dzubukuá e o Pankararú fizeram.



 Eu relaciono essa língua ao Lokono por conta do vocábulo kakri 'velhos tempos', cujo não fui capaz de identificar um cognato fora do Lokono wakili 'velhos tempos', indicando que se trata de uma inovação desse grupo linguístico, parte da ramificação Ta-Arawak. Ainda falando de inovação, o Sakakriña foi claramente influenciado pelo Dzubukuá em sua criação de agentivos, pois note que este usa de um prefixo se- 'eles/elas' + um sufixo -ña 'substantivizador' para criar um substantivo agentivo plural 'aqueles que são ...', esse tipo de estrutura é nativa das línguas Caribe e Kariri, como no Dzubukuá di-...-li, o que indica que novas palavras e até palavras antigas estavam sendo substituídas por neologismos inspirados na língua Kariri do Katecismo Indico.



 Não muitos dados além desses, mas a palavra kakri já é um norte perfeito, pois relaciona o Sakakriña ao Lokono, portanto facilitando sua reconstrução, sendo necessário apenas aplicar as mudanças fonéticas aqui citadas e aplicar as mudanças lexicais com base em traduções do Dzubukuá.



SAKAKÑA MODERNO, O QUE ACONTECERIA SE TIVÉSSEMOS REGISTROS NOS DIAS DE HOJE ?



 Usarei aqui, como argumento, duas línguas da proximidade do São Francisco, ambas que sofreram de mudanças fonéticas similares, indicando uma área de convergência linguística, mas disso já sabemos, o interessante dessas duas línguas é que seus registros foram feitos no século 20, muito depois dos registros coloniais, 3-2 séculos para ser exato, tempo suficiente para vermos mudanças na fala local, e isso vemos sem dúvidas.


 As duas línguas são o Natú e o Xukurú, que possuem palavras antigas que demonstram clara redução silábica, mas uma redução que praticamente livra-se de uma sílaba inteira, mesmo que ela possua encontros consonantais, veja o Natú zitók 'estrangeiro, inimigo', cognato do Xavante tsitob'ru 'inimigo', de um antigo tsitobkru 'inimigo', note que o Natú reduziu a última sílaba kru 'raiva' para apenas uma consoante que virou coda da palavra completa -k, tal processo também é visto no Xukurú, que transformou o Tarairiú Antigo sekri 'casa' em xek 'casa', reduzindo kri 'casa' para -k, tal processo indica que línguas de famílias diferentes estavam passando por novos processos de redução silábica, aqui desejo. A prova de que tal processo alcançou o médio São Francisco é que o Pankararú também participou dele, língua essa que estava há apenas algumas horas de distância do Rio Salitre, a redução é demonstrada em tik 'pena' (Woyana t-un-ke) e bar-kíra 'flor' (bar < Woyana pyry 'flor').


 O nome visto no título e escolhido como nome principal no começo do texto aplica essa exata regra, reduzindo o morfema descrito kakri para kak, imitando o sotaque que estava em vigor no século 19 e 20 no rio Opará.



TIPOLOGIA DO SAKAKÑA


 A tipologia vista no Dzubukuá é descrita por Queiroz (2012, p. 380) como um idioma polissintético aglutinativo, tal descrição está correta de certa forma, mas é um pouco absoluto, o Dzubukuá, assim como qualquer outro idioma do mundo, está em um espectro, a maioria das construções da língua são feitas de forma analítica (através de preposições ao invés de afixos), mas a capacidade da língua de afixar múltiplos prefixos e sufixos, parte de sua natureza sintética, herdada do Proto-Caribe, permite que frases sejam formadas com uma palavra só, mas tal sistema não é o prevalente nas construções da língua. Pode-se inferir que o caráter polissintético das línguas Arawak teria sofrido uma redução no Sakakña, visto que nas proximidades não só haviam povos Terejê (substrato Macro-Jê do Dzubukuá), mas também os Masakará, povos Macro-Jê com alinhamentos mais analíticos e isolantes, que sabemos que influenciaram o Dzubukuá, influenciaram os Pankararú e sem dúvidas teriam sido parte de um substrato da língua Sacacrinha.



ORDEM DOS CONSTITUÍNTES E SINTAGMA NOMINAL


 Se o Dzubukuá influenciou a gramática da língua nas formas agentivas, existe grande chance que a ordem de verbo inicial como preferida teria adentrado a língua, sendo ela VSO e VOS, mas como tal afirmação é difícil de confirmar, sugiro o uso desta para imitar o Dzubukuá, mas também sugiro o mesmo processo de ordem livre dessa língua Kariri por meio de topicalização.


 O sintagma nominal provavelmente segue o Dzubukuá:


 NCAD (nome-classificador-adjetivo-determinante = basi da-wi tô 'casa CL-grande esta')


ou 


DNCA (determinante-nome-classificador-adjetivo = tô basi da-wi 'esta casa CL-grande') 



Fontes:


C. H. De Goeje, The Arawak Language of Guiana, 1929


Willem J. A. Pet, A Grammar Sketch and Lexicon of Arawak (Lokono Dian), 2011


Bernardo de Nantes, Katecismo Indico, 1896


Čestmír Loukotka, Classification of South American Indian languages, 1968


José Márcio Correia de Queiroz, Um estudo gramatical da língua Dzubukuá, família Kariri, 2012


Thomaz Pompeu Sobrinho, Línguas Tapuias desconhecidas do Nordeste: Alguns vocabulários inéditos, 1958


Robert E. Meader, Índios do Nordeste: Levantamento sobre os remanescentes tribais do nordeste brasileiro, 1978




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



sábado, 21 de setembro de 2024

ETIMOLOGIA DE MATRINADO


 A palavra matrinado é composta de matri 'tabaco, cigarro, cachimbo' + -nado 'que são', forma plural do sufixo -ne 'que é', sufixo chamado de agentivo, que cria agente, ou seja, aquele que faz uma ação ou que é algo, portanto:



matri-ne 'que é cigarro/cachimbo'


matri-nado 'que são cigarros/cachimbos'



Apesar de não surgir no Wayana diretamente, é cognato de uma palavra que surge dentro do ramo Caribe Central, que é do Apalaí matary 'tabaco, cigarro', do composto tamy matary 'tabaco', sendo este composto também ancestral do Kipeá ta de ta-nè 'desejar fumo'.


A palavra possivelmente deriva do Proto-Caribe *mapoto 'fogo' + *-ry 'sufixo possessivo', que sozinho, marca a terceira pessoa, portanto também serve como nominalizador, portanto ma(po)to-ry 'coisa de fogo' > *mato-ry > mata-ry > *mata-ri > mat-ri



Fonte: Koehn & Koehn, Vocabulário Básico, Apalaí-Português Dicionário da Língua Apalaí, 1995, p. 28





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quinta-feira, 19 de setembro de 2024

PASSADO E NÃO PASSADO DO TECEAMAMENE


 Assim como descrito antes no Woyana, o Teceamamene, membro primo da mesma rama central do tronco Caribe, possui um sistema de passado e não passado, eu li o documento de Courtz e percebi que ensinar essa língua seria bem demorado, isso se deve pelo seu caráter sintético, ou seja, muitos sufixos, muitos prefixos para cada coisa, cada conceito, cada tempo, aspecto e modo.


 Eu creio que, realisticamente, o Teceamamene, como demonstra o dialeto Temona, que expliquei ontem, já estava passando por alterações fonológicas e morfológicas, vejamos novamente aquela frase da língua Tarairiú-Janduí e analisemos ela:


ga anne-s yeda-s hade konde-g hou

tu assim-IRR mandar-IRR milho caçar-RLS CAUS

“que tu faça ser enviado milho e caça”


Vejamos a ordem, temos pronome no começo (ga ‘tu’), verbo auxiliar (anne-s ‘que assim seja’) e verbo principal (yeda-s ‘que mande, que envie’) no meio e conjugados juntos na forma irrealis (imperativo nesse caso), assim havendo concordância entre auxiliar e principal, objeto da frase em penúltimo (hade ‘milho’ e konde-g ‘caça, animal’) e posposições causativas-instrumentais no final da frase (houh ‘causar’, altera o yeda ‘enviar’ para yeda …. houh ‘fazer enviar, fazer mandar’), portanto a ordem dos constituíntes é SVO e a língua faz uso de posposições, possui dois marcadores de tempo sufixados -s ‘futuro, irrealis’ e -g ‘presente-passado, realis’, sendo que o realis (-g) cria substantivos.


 Nos dados fonéticos, vemos uma preferência por palavras monossilábicas (uma sílaba) e dissilábicas (duas sílabas), codas são permitidas e criadas a partir de reduções silábicas (-g < *-kêp ‘predicativo’; -s < *-ja ‘irrealis’).


 Com estes dados, é possível criar-se uma base para a gramática que o Teceamamene e o Woyana compartilhariam com o Janduí no Sprachbund do CE-RN, façamos exatamente essa frase do ritual Janduí em Teceamamene, aplicando as mudanças descritas aqui em outras publicações, com os vocábulos extraídos dos topônimos (Pompeu Sobrinho, 1945) e da gramática de Courtz (2008):


am sa-t mog-tag sig taro bo

tu assim-IRR enviar-IRR milho animal CAUS





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



VOGAL EPÊNTICA DO KARIRI-WOYANA


 A palavra swawari existe dessa forma, sem o sufixo -a típico do Tupi (îagûar-a) por quê a palavra foi adotada sem ele, mas na época que foi emprestada, a fonotática da língua não permitia consoantes finais, portanto a língua KW decidiu adotar o uso de uma vogal epêntica, uma vogal que cria uma sílaba aberta (CV) para respeitar a fonotática do idioma, a vogal que foi escolhida foi -i.


 Para respeitar tal processo, irei adotar as duas formas de escrever, tanto a forma com a consoante final e a forma com a vogal epêntica, isso não servirá muito para palavras nativas, que perderam suas próprias vogais, e sim para palavras do Tupi que recebem o sufixo -a e palavras do Tarairiú que terminam com consoante, por exemplo:


Tarairiú: wa rat 'baía grande' > Kariri-Woyana: wa rati ~ wa rat

Tarairiú: pykab 'terra' > Kariri-Woyana: pykabi ~ pykap

Tupi Antigo: a-pyçyk-a 'estar contente' > Kariri-Woyana: pycyki ~ pycyk

Tupi Antigo: açab-a 'atravessar' > Kariri-Woyana: cabi ~ cap





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DO MORFEMA PANKA E QUAL SERIA O EQUIVALENTE DO WOYANA ?


 O morfema panka surge na nomenclatura da nação Pankararú, Pankaru, Pankaré, Pankararé, Jeripankó e Koiupanká, também surge, de acordo com os registros de Loukotka, como um título para pajés: pankaré 'título de pajé', a palavra é derivada de um composto cognato do Wayana upakat 'o/a velho(a)', derivado de upake 'tempo atrás, tempo passado' + -ato 'nominalizador de participante', criando upak-at(o) 'aquele que é de tempos atrás, velho(a)'.


 Sabemos que o Woyana mudou sua palavra nativa de guerreiro (kaikusi) para uma palavra emprestada do Tupi (swawari), acredito que a forte presença do Tupi nas relações desse povo teriam influenciado sua língua, adotando um termo que se equivale ao que eles usavam antes, sugiro que seja arakèwari ~ arakèwar (ara-kaé 'antigamente' + -ara 'sufixo agentivo' = ara-kaé-gûar-a 'aquele que é de antigamente').


Fontes:

Tavares, A Grammar of Wayana, 2006, p. 52

Loukotka, Document et vocabulaires inédits de langues et de dialectes sud-américains, p. 15





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quarta-feira, 18 de setembro de 2024

DECIDINDO O DESTINO DAS CODAS DO TECEAMAMENE


 O caráter sintético da língua ancestral do Teceamamene é sem dúvidas uma de suas características mais belas, mas realisticamente falando, teria o Teceamamene preservado todos os afixos vistos ? Vemos ao longo do território cearense que, em muitos casos, os dialetos e línguas e variantes irmãos e primos do Teceamamene estavam todos perdendo suas codas e reduzindo palavras aos montes, como no caso de Temona, que não possui o sufixo necessário para marcar o substantivo, que em teoria teria sido *ty-wona-ke, possível assim especular que o que os colonizadores ouviram foi um estágio avançado da evolução das codas, onde há algumas décadas eles poderiam ter ouvido algo como Temonak ou Tewonak.


 Já decidi que as codas que já existiam no Wayana, serão perdidas no Woyana, mas codas serão readquiridas por meio de redução silábica, portanto:


Wayana: ipok ‘bom’ > Woyana: mo ‘bom’


porém


Wayana: wapodahkon ‘lenha’ > Woyana: nak ‘madeira, lenha’


 Todas essas conclusões vieram com base na comparação do ponto A, que é o Wayana das Guianas e o ponto C, que é o Pankararú, Atikum e Kambiwá, para reconstruir de forma fiél o ponto B, que é o Woyana, mas venho evitando dar uma conclusão sobre as codas do Teceamamene exatamente pela incongruências que venho encontrando, sabemos que o ponto A é o Kaliña e o ponto C são o Dzubukuá, Kipeá, Sapuyá e Kamurú, mas os dois pontos citados demonstram estruturas relativamente similares, não permitindo consoantes finais de jeito algum, enquanto o ponto B discorda disso em alguns dos dados, como Curubu (< *curu buk), Siebba (consoante geminada -bb-, derivado de Siebeba) e o citado acima, Temona (< te-mona-k < *ty-wona-ke).


 A sugestão que trago é que, para desambiguar certas funções da língua, as codas sejam preservadas ortograficamente, enquanto em sua pronúncia, como é de costume de línguas que perdem suas consoantes finais, recomendo o uso do fonema transitório /ʔ/, que é a travada na garganta, portanto:


pok ‘bom’ é pronunciado bo’ /‘boʔ/

tewonak ‘fértil’ é pronunciado tewona’ /tewo‘naʔ/





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



A RELAÇÃO DE ALIANÇA DOS TECEAMAMENE E OS WOYANA


Algumas evidências lexicais apontam que, muitos dos léxicos Woyana e Pankararú são de origem mais aproximada do Kaliña ao invés do Wayana, o que pode servir de evidência para uma interação e possível relação amistosa desses dois povos.


 A evidência que me refiro se encontra no vocábulo *barkíra* 'flor', que possui duas raiz que significam flor: bar 'flor' + kíra 'flor', sendo que bar claramente deriva de um antigo pyry 'flor', cognato do Kipeá purú 'flor', mas essa palavra não é Wayana, pois a palavra do Wa. é ekuru 'flor', do qual deriva o kíra, que é realmente nativo do Wo. e Pnk., o que indica que essas duas línguas interagiram e se fundiram em algum momento durante a migração do norte para o Opára, na minha visão, o principal suspeito seria um ancestral ou língua irmã daquela falada pelos Teceamamene de Maranguape, cujo possivelmente se referiam a um povo Kariri assentado nas proximidades do Maranguape e Baturité.





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



terça-feira, 17 de setembro de 2024

ANALISANDO O SISTEMA DE NASALIZAÇÃO DO PANKARARU, O QUE ELE IMPLICA SOBRE O KARIRI-WOYANA


 O Pankararú possui um sistema nativo de nasalização que se assemelha ao que é visto nas línguas do tronco Macro-Jê, onde os arquifonemas [m], [n] e [ŋ] variam em sua pronúncia dependendo da nasalidade da vogal, se a vogal for oral (não-nasal), os arquifonemas são realizados como /ᵐb/, /ⁿd/ e /ᵑg/, enquanto se elas forem nasais serão realizados como /m/, /n/ e / ŋ/.


 A prova desse sistema está na palavra mõni ‘milho’, que deriva de um descendente do Proto-Jê Setentrional *bõ-cy ‘milho’, literalmente ‘semente do mato’. Note que a palavra, por sua nasalidade herdade de *bõ ‘capim, mato’ transformou as duas sílabas em consoantes nasais, um processo idêntico ao de harmonia nasal do Guaraní (Sanchez, 2023, p. 14) e do processo Macro-Jê descrito acima.


  Com esse dado em questão, decidi reanalisar a ortografia, para não sobrecarregá-la de regras, como o til [~] não é permitido sobre as letras [e], [i] e [u] no teclado brasileiro, recomendarei o uso da letra -n no final da palavra, visto que essa coda foi perdida. Sobre as consoantes, decidi fundir m/b, n/d e ñ/s em apenas três letras: m, n e j, onde a pronúncia de cada será determinada da mesma forma que mõni foi, através da nasalidade da vogal, incluindo também a harmonia nasal, portanto:


mun /mũ/ ‘nação’, do Tupi Antigo mũ


j-u ma ya /ʒu’baja/ ‘Jubaia’, do Kariri antigo j-ù-pai-je ‘abundante no topo, frutífero(a)’


 O hífen indica que a consoante é oral, mas a vogal é nasal:


mo-n /bõ/ ‘ilha’, do Kariri Curubon ‘nome de uma ilha’


 Uso [j] para que a letra que represente os sons de ñ e s seja neutra, não tendendo para um, nem para o outro.





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



segunda-feira, 16 de setembro de 2024

A PALAVRA PARA MULHER DO KARIRI E PANKARARU SÃO COGNATAS


 As duas palavras, que são sikyu-rú no Pankararú e tidzi/tedzi/kützì nas línguas Kariri, são ambas cognatas próximas entre si, a diferença aqui é que o Kariri sofreu metátese (inversão das sílabas), passando tzikü para kützì, como é bem preservado no Sapuyá, enquanto no Dzubukuá e Kipeá, o /k/ se dissimilou para /t/:


kütsi > kitsi > titsi > tidzi/tedzi


 As duas palavras descendem de um antigo substantivo que significa 'pequeneza', com o sufixo possessivo -ru (-ry) no caso do Pankararú, criando sikiu-rú 'pequeneza dele(a)'. No Wayana teria sido apsikï ~ aphikï 'pequeneza', seguindo a lógica do Woyana, teria virado sik /siʔ/ ~ hik /hiʔ/ 'pequeneza' e depois sik ly ~ hik ly 'pequeneza dele(a), mulher'.





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE DAK 'LENHA' E O REFORÇO PARA O ARGUMENTO DA SÍLABA TÔNICA PAROXÍTONA


 Essa palavra deriva de um composto de duas palavras antigas diferentes: wapot 'fogo' + ahkonu 'lenha', criando wapotahkon, com o tempo e a chegada ao Nordeste, wapotahkon se tornou wapodahkon, ainda mais tempo se passou e as duas primeiras sílabas foram derrubadas, criando dahkon, a partir daí, houve uma alteração na vogal final e redução das codas, pois o Pankararú se encontra na região do São Francisco, que é onde se tinha a estrutura sílaba majoritaria de CrV, evitando assim as codas, portanto:


dahkon > dahkan > dáka 'lenha'


 Percebe-se que, olhando para a etimologia da palavra, a sílaba que era mais forte e levou a essa redução foi a penúltima wapo-DAH-kon, o que reforça o argumento que disse sobre a redução silábica ter sido causada por uma sílaba tônica forte, mas também adiciona algo que eu não havia levado em consideração, que era o quão forte essa sílaba era a ponto de deletar sílabas inteiras, reduzindo a palavra de quatro sílabas para duas, e como sabemos do caso do Woyana do Ceará (buk 'traíra (peixe)' < punka), que reduzia as vogais finais, seria mais extremo ainda e reduziria para uma sílaba só: dak ~ da 'lenha'. Isso é um grande auxílio na reconstrução do Kariri-Woyana, pois sabemos agora o padrão preferido de redução exato, tendo como suporte a palavra para 'lenha'.


 O cognato direto do Kariri para wapot 'fogo' é upodo 'coisa assada', ahkon(u) não possui um cognato que eu conheça no Kariri, visto que su 'fogo, lenha' vem do Terejê *tsu 'queimar'


Fonte: Tavares, A Grammar of Wayana, p. 80





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



A PALAVRA PARA ÁGUA DO WOYANA ERA SA, COGNATO DO KARIRI DZU


A palavra Pankararú já 'água' e a palavra Kariri dzu/tzu 'água' são ambas cognatas primas uma da outra, distantemente relativas do Kaliña jà-ty 'combustível', a partir de uma linguagem figurada sobre a água ser o combustível do ser vivo.


 A partir desses dados e pela afirmação em documentos que associam os Pankararu e Atikum aos Woyana, podemos inferir que os Woyana do Ceará, de Camocim até Maranguape e Baturité, de Banabuiú e o Rio Jaguaribe, teriam em comum a pronúncia do proto-fonema /j/ como /s/, portanto água nessas línguas era *sa*.


 Como a palavra é monossilábica, refiro-me de volta aos classificadores Woyana que citei em uma publicação recente e sugiro que a palavra seja wok sa 'água, rio', que é wok 'beber' + sa 'água, combustível', para distinguir de dak sa 'combustível', que é dak 'lenha' + sa 'água, combustível'.





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



O CONCEITO DE PASSADO E NÃO PASSADO DO KARIRI-WOYANA


 A língua Kariri-Woyana possui um sistema que assemelha-se muito ao do tronco Macro-Jê. Veja que, nas línguas Jê, normalmente existe uma separação daquilo que é passado, presente e futuro a partir de dois conceitos: realis e irrealis.


 Nas línguas Transanfranciscanas (Maxakalí, Kamakã e Krenák), tal sistema é feito a partir das codas (consoantes finais) dos morfemas, no Masakará por exemplo, se eu digo ni ‘ir.IRR’, estou usando ele na forma irrealis, ou seja, marcando qualquer conceito não real, o futuro, o imperativo, o pretérito imperfeito, aquilo que não aconteceu ainda, que pode acontecer, que acontecerá, que eu quero que aconteça e etc. Se eu marco essa palavra com sua coda ni-n ‘ir.RLS, a partir daí estou marcando o presente, pretérito perfeito, particípio ou até mesmo o gerúndio, pois é realis, algo que é real, como algo que já aconteceu, acontece ou está acontecendo.


 No Jê Cerratense, tal discernimento é feito a partir de partículas e/ou afixos separados, que variam de ramo em ramo, atesto o uso complexo de dois grupos determinantes de tempo-aspecto-modo dentro do ramo Terejê, com o primeiro grupo marcando o passado (mô) e o não-passado (de), o outro grupo marcando o realis (do) e o irrealis (za), com esses dois existindo, é possível formar diferentes concepções de tempo misturando cada um, por exemplo mô do passado da segunda e terceira pessoa + za irrealis, resultaria em mô za ‘passado irreal’, ou seja, o pretérito imperfeito, por exemplo: mô za krâ ‘(tu/ele(a)) comera(s)’.


 O sistema do Woyana, baseado nos dados do Wayana do Amapá, por coincidência, assemelha-se bastante ao visto no Xokó, Natú e Wakonã (Terejê), que é o discernimento do primeiro grupo que falei: passado e não-passado. O passado da língua Woyana era marcado com um morfema zero, o que isso significa é que o morfema era invisível, implicado na frase que, quando você falar o verbo de forma solta, você está dizendo esse verbo no passado ou no presente, portanto a falta de marcação indica o modo realis da língua Woyana:


mnak ‘orelha, ouvir’


u-mnak ‘eu escuto ele(a)’ ou ‘eu escutei ele(a)’


 O próximo marcador não é invisível, é a posposição sa, que é cognata do Wayana ja, ambos marcam o que a terminologia dos estudos do tronco Caribe chamam de não-passado, mas trazendo para a terminologia Macro-Jê, conhecemos como marcador de irrealis, pois marca o futuro (algo que não aconteceu, portanto irreal), imperativo (algo que se ordena fazer, portanto ainda não foi feito, irreal), optativo (que se espera, irreal), desiderativo (que se deseja, irreal) e o pretérito imperfeito (algo que deixou de ser, não é mais real, irreal).


tuk ‘comer’


my-tuk sa ‘tu comerás’ (futuro) ou ‘coma!’ (imperativo) ou ‘tu comeras’ (imperfeito).


à-dali:m bo! 'boa noite para vós' (baseado no que estudei da gramática de Tavares)

à- 'para ti, para vós'

dali:m 'preto', cognato do Wayana talilime, baseado na mesma inovação que o Kariri fez com karai 'preto' 

à-waîna bo! "Bom dia para vós"

bo 'bom, bem', cognato do Wayan i-po-ke, muito provavelmente cognato do wo de wonhe 'bem'.





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



domingo, 15 de setembro de 2024

ETIMOLOGIA DE BATI/BATÜ 'ESTRELA'


Em um céu pintado de preto ou azul escuro, denominado de caya 'noite', que deriva do adjetivo *karai 'escuridão', existem pontos que pintam o céu, como meccaa (pintura corporal) brancas circulares e brilhantes.


 Bati ou Batü (y grosso), dependendo da língua Kariri, deriva do substantivo patỳto 'lugar vazio', referindo-se às estrelas como pequenos furos no céu. Isso talvez explique o por quê dos Natú e Xokó chamarem a lua de kra-wave 'astro do riscar', existe uma temática de rasgo do céu nos contos mais antigos das nações Kariri-Terejê, onde a lua rasga o céu e possivelmente deixa seu rastro como pequenos buracos no céu, por onde adentram os raios cósmicos do céu superior (Sonsé).


Fonte: Courtz, A Carib grammar and dictionary, 2008, p. 341.





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



sábado, 14 de setembro de 2024

A ETIMOLOGIA DA PALAVRA ATIKRAKA 'ME DÊ LICENÇA' DO WAKONÃ


A frase, usando a ortografia que sugiro: 


a-tí krá ká


 Significa 'o/a senhor(a) vire a cabeça', a-ti sendo a forma respeitosa de se falar com alguém, chamado de pronome honorífico, ele utiliza o pronome de segunda pessoa (a-) da série acusativa + o sufixo -ti aumentativo.


krá ká significa 'virar a cabeça' ou literalmente 'cabeça virar', demonstrando duas novas coisas:


1) Reforçando a ideia de línguas monossilábicas e analíticas no grupo Terejê, muito mais ainda que no caso das línguas Akuwẽ


2) Indicando através do uso da palavra ká, cognata do Xerente kdâ, que o Terejê faz parte de uma ramificação oriental junto com o Xerente, Akroá e Xakriabá (principalmente o Akroá, devido ao seu uso comum do prefixo a- no lugar de ka-), demonstrando que o Xavante e seus dialetos formam um grupo ocidental separado.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



CORREÇÃO DA ETIMOLOGIA DE BENDO/BOEDDO 'SERRA, MONTE'


A palavra deriva de um antigo substantivo que significa 'grandeza', cognato do Kaliña poto 'grandeza'


Fonte: Courtz, 2008, A Carib grammar and dictionary, p. 351 





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



PRONOMES DA LÍNGUA WOYANA, DISTINÇÃO DO SINGULAR E PLURAL


 A língua Woyana possui apenas a primeira pessoa ‘eu’ e ‘nós’ e a segunda pessoa ‘tu’ e ‘vós’, como pronomes distintos dos demonstrativos, a terceira pessoa ‘ele(a) e ‘eles(as)’ são normalmente marcados pelos demonstrativos ‘esse(a)’, ‘este(a)’, ‘aquele(a)’ e ‘isso’ e ‘aquilo’.


 Mesmo sendo uma língua Kariri e não Macro-Jê, o Woyana possui distinção de pronomes agentivos e acusativos, que são pronomes para sujeitos e objetos de frases transitivas e intransitivas, também inclui-se aqui os pronomes mediais, onde o sujeito e objeto são a mesma pessoa, comecemos com o mais fácil, que são os pronomes agentivos ou independentes, que não se afixam à uma palavra:



ywu, y, sy, wu ‘eu’

ëmë, ëm ‘tu’

ywu am, y am, sy am, wu am ‘nós todos’

ëmë am, ëm am ‘vós todos’

kunm ‘eu e tu, nós dois (inclusivo)’

emn  ‘eu e ele(a), nós dois (exclusivo)’

ty ‘si próprio(a), ele(a) mesmo’


Esses pronomes são usados para representar o agente, isto é, aquele que faz a ação em uma frase transitiva (frase que precisa de sujeito e objeto), como por exemplo:


Frase Wayana


malonme kunmëlamkom tumëkëmëi

malonme kunmëlamkom tumëkëmëi

então nós.todos retornado

‘então nós todos retornamos’


Frase Woyana


Mon: wu am dy-mëk-ëm-he

mon: wu am dymëkëmhe

então eu coletivo retornado

‘então nós todos retornamos’


Obs 1.: note o uso da estrutura dy-…-he como particípio ‘retornado’ e também o pretérito perfeito, similar ao uso do Kariri de di-...-li/di-...-ri nessa mesma função de particípio.



Pronomes de terceira pessoa


 Como dito acima, os pronomes de terceira pessoa ‘ele(a)’ e os pronomes demonstrativos são os mesmos, aqui se faz distinção de animado (similar à classe superior do Tupi Antigo moro-/t-) e inanimado (classe inferior do Tupi mba’é-/s-), também de número (singular e plural) e, como demonstrativos de distância (este, esse, aquele):



Pronomes de terceira pessoa anafóricos


Absolutivos

në: ‘ele(a)’ (anafórico)

dot ‘eles(as) (anafórico)


Obs.: anafórico significa que o pronome se refere de volta a um constituinte de uma frase, por exemplo:


Prem Kap ho: ma:k në-n

Prem Kap ama mãe dele-POSS

‘Prem Kap ama sua mãe’


 në-n ‘seu, sua’ se refere de volta à Prem Kap, ao invés de se referir à mãe de outra pessoa, portanto é um pronome anafórico.


Ergativos


e-sa ‘por causa dele(a)’ (mesmo que i-nhà do Kipeá)

e-sa-he ‘por causa deles(as) (mesmo que i-nhà-à)



Pronomes demonstrativos


Pronomes animados (humanos, animais, plantas, espíritos)


Proximal

mëj ‘este(a)’

mëj sam ‘estes(as)’


Medial

mëk ‘aquele(a)’

mëk sam ‘aqueles(as)’


Distal

mëk tamk ‘aquele(a) acolá’

mëk tamk sam ‘aqueles(as) acolá’



Pronomes inanimados (seres inorgânicos, locais, conceitos abstratos)


Proximal

sin, hin ‘isso’

sin kom, hin kom ‘isso (plural)’


Medial

mlà ‘aquilo’

mlà kom ‘aquilo (plural)’


Distal

myn ‘aquilo acolá’

myn kom ‘aquilo acolá (plural)’



2.6) Pronomes interrogativos


2.6.1) Animado

nyk ‘quem (singular)’

nyk sam ‘quem (plural)’


2.6.2) Inanimado

dy ‘que (singular)’

dy kom ‘que (plural)’



Gênero


Os pronomes de terceira pessoa descritos na seção dos demonstrativos não demonstram distinção de gênero, ele e ela são o mesmo pronome



Pronomes prefixados agentivos


 Os pronomes prefixados agentivos automaticamente marcam duas pessoas, a pessoa que é o sujeito, que está marcada pelo próprio prefixo e a terceira pessoa, que é implicada.


w- (perante vogal), u- (perante consoante) ‘eu … ele(a)’

m- (perante vogal), my- (perante consoante) ‘tu … ele(a)’

n- (perante vogal), ny- (perante consoante) ‘ele(a) … ele(a)’

mën- (perante vogal e consoante) ‘ele(a) certamente … ele(a)’

kun- (perante vogal e consoante) ‘ele(a) há muito tempo atrás … ele(a)’

kut- (perante vogal e consoante) ‘nós … ele(a)’



Pronomes prefixados acusativos


 Os pronomes acusativos são aqueles que marcam o sujeito de frases intransitivas (que só tem um sujeito, como ‘eu dormi’, ‘eu caí’ e etc), também marcam o possessivo, são os seguintes:


s- (perante vogal), sy-, y- (perante consoante) ‘meu, minha, me, para mim’

ëw- (perante vogal), ë- (perante consoante) ‘teu, tua, te, para ti’

j- (perante vogal), i- (perante consoante) ‘dele(a), se, para ele(a)’

k- (perante vogal), ku- (perante consoante) ‘nosso(a), nos, para nós’



Pronomes mediais


Esses proneomes são feitos com a prefixação da série agentiva e o infixo -ët-, são pronomes que marcam a voz média, que é quando o sujeito e o objeto são a mesma pessoa:


w-ët- ‘eu me’

m-ët- ‘tu te’

y-ët- ‘ele(a) se’

k-ët- ‘nós nos’



Sugestão de inovação


 Com a presença e influência dos Tupis entre os Jaguaribaras, o sistema de prefixação de sujeito e objeto muito provavelmente teria sido adotado, a estrutura demonstrada aqui dos prefixos facilita bastante esse processo, por exemplo:


w-i-klep ‘eu ajudei ele(a)’, onde w- ‘eu’ é o sujeito e i- ‘para ele(a)’ é o objeto.



Fontes: Tavares, A Grammar of Wayana, 2006.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ANALISE DO WOYANA, PROCESSOS DE COMPOSIÇÃO, SUGESTÃO DE ORTOGRAFIA E DADOS DIVERGENTES ENTRE O WOYANA E WAYANA


 Comecemos com os dados divergentes que mencionei no título, pois é um tópico fascinante, que implica em como a língua se parecerá em sua forma reconstruída. O Woyana tem forte ligação com os Jaguaribaras, sendo ou dialeto deste ou irmão direto da língua do povo de Warakapassu, os poucos dados da língua Jaguaribara provam essa relação, como a palavra para a deusa da lua, Nuã, que é cognata do Wayana nunuwë ‘lua’, indicando mais uma vez o processo de monossilabização que discuti anteriormente.


 Ainda nesse processo de monossilabização, que afirmo aqui, não é estranho para os povos Kariri, visto que o Dzubukuá, Sapuyá, Kipeá e Kamurú todos passaram por isso. Você deve até estar se perguntando, “ah, mas as palavras do Kariri não são monossilábicas” temos padzu, ambule, buiddi, bucco, cradzo e várias outras que, no mínimo, são de duas sílabas, outras são maiores como anhirocla, claraiddo, muiquedde, tonranran e etc. 


 Apesar das estruturas que recebemos a partir da documentação serem praticamente quase todas de mais de uma sílaba, o interessante para nosso estudo é como essas palavras se decompoem, elas não são como no português, que temos algo como casa, que não se separa como duas sílabas com signifiados próprios ca-sa, mas no Kariri, cada sílaba nativa da língua possui uma função gramatical e/ou semantica, veja por exemplo padzu ‘pai’, que tem duas palavras que podem ser analisadas como ‘pai’, pa ‘pai’, derivada de uma ‘nursery word’, ou seja uma palavra de berçário, que são as primeiras palavras faladas por bebês, como dada, mama, nana,  baba, tata e papa, por último dzu ‘pai’, que deriva do Proto-Caribe *jumy ‘pai’, assim criando pa-dzu ‘pai-pai’, isso é chamado de composto de sinônimos, um estratégia comum em línguas monossilábicas, como o mandarim, vietnamita e birmanês.


 Outra estratégia de composição é aquela em que os dois componentes complementam o significado deseja-se alcançar, como tu-yó ‘zombar’, que é tu ‘brincar’ (cognato do Xavante to ‘brincar’) + yó ‘falar’ (cognato do Xavante nhamri ‘falar’), derivados do Natú, que também é monossilábico e mais analítico e isolante que a família Kariri.


 O Woyana teria, a partir desse processo adqurido tais estratégias, mas algumas não seriam devido ao contexto em que elas se encontram. Veja nuã ‘lua’ é a palavra que foi herdada no Woyana de um antigo nunuwë ‘lua’, perceba também que a palavra não inovou o léxico, como no Kariri que virou kaya-ku ‘noite-branco’ ou ‘o branco da noite’.


 Outro aspecto que devemos especular sobre são os classificadores, que servem também para desambiguar palavras e criar novas a partir da composição com elas, sabemos que algumas como kro- ‘classificador de objetos redondos’ não teriam exisitido no Woyana, visto que esse deriva do Terejê kra-, que por sua vez deriva do sistema de classificadores do Jê Central. Com a ausência dos Terejê no norte do Ceará, não haveria, realisticamente, chances de tais palavras adentrarem o léxico da língua Woyana, porém, sabemos que a ramificação Wayana desenvolveu classificadores genitivos, que são aqueles que surgem em palavras que não podem ser marcadas com a posse de forma comum, digamos por exemplo alu: ‘espelho’, normalmente essa palavra teria que ser possuída não como  w-alu: ‘meu espelho’, mas sim usando o classificador adequado para ela, que seria kly: ‘coisa’, portanto wu-kly: alu: ‘minha coisa, o espelho’, o mesmo serviria para animais, comidas, bebidas e outras tipos:



ot ‘comidas derivadas de animais’

kaîm ‘caça’

aky: ‘animal de fazenda, parasita, raça de animais’

anon, non ‘pintura corporal’

wok, ok ‘bebida’

ek ‘animal de estimação’

kly: ‘coisa’

mu: ‘isca’

t:a: ‘lugar, vila’

kan: ‘comida derivada de animal moqueada’

mpy: ‘comidas vegetais’

nem ‘comidas/frutas suculentas’

ka top ‘coisa’


 Falo desses classificadores por quê eles serão necessários na hora de compor novas palavras, recomendo que, na ausência do sistema das línguas Kariri do sul, esses classificadores citados acima tornem-se os prefixos classificadores da língua Woyana, assim tornando fácil criar novas palavras e não confundí-las, como bu ‘carne, polpa, pele, casca’, que pode criar:


nem bu ‘polpa de fruta’ (nem ‘comida suculenta’ + bu ‘carne, pele, polpa’)

t:a: bu ‘açogue’ (t:a: ‘lugar’ + bu ‘carne, pele, polpa’)

ot bu ‘carne’ (ot ‘comida derivada de animal’ + bu ‘carne, pele, polpa’)

mu: bu ‘isca’ (mu: ‘isca’ + bu ‘carne, pele, polpa’)



 Isso leva a uma boa transição para o próximo tópico dessa publicação, que será a ortografia que proponho para o Woyana. As línguas Kariri são morfossintaticamente sintéticas, como seu ancestral, o Proto-Caribe, por isso eu tendo a não separar os morfemas por hífens ou por sílabas independentes, por quê o Kariri depende muito de aglutinação (junção de morfemas e uma palavra só), o que tornaria a língua esteticamente inaprazível aos olhos, com muita separação que dificultaria a leitura.


 Das duas línguas que estudei até agora que são monossilábicas, o Masakará e o Natú, ambas tendem a ter composição máxima de quatro morfemas, e essas palavras, que já são consideradas enormes nesse sistema, são composições de palavras de duas sílabas já existenstes, como no caso da palavra ‘muito’ do Masakará: baw dzö ero äng, que é composta de baw dzö ‘mão passar’, ou seja ‘passa da contagem nas mãos’ e ero äng ‘muito é’, ou seja, são dois compostos separados que formam essa palavra maior. O Natú forma compostos de repetição, como ca ki ca ‘fogo madeira fogo’, onde ki ca já existe desde o período do Proto-Macro-Jê, enquanto do ca inicial foi separado especificamente para reforçar o significado.


Essas estruturas de composição tornam mais fáceis separar os morfemas, que só possuem uma sílaba e possuem estratégias de desambiguação que facilitam distinguir no texto qual palavra é qual, eis o por quê de eu ter decidido escrever essas duas línguas morfema por morfema, e para o Woyana, que possui estrutura similar, adoto o mesmo sistema de separação de morfemas, por isso temos mu: bu e não mu:bu. Um documento separado explicando o uso de cada letra e símbolo será publicado em breve.


 Para concluir, explico aqui que o Woyana já havia divergido bastante do Wayana, como em seu desenvolvimento do fonema /j/ (y de yacá ‘cachorro’ do Kipeá) para /s/, isso paralelo ao Kariri, que desenvolvem esse som ou em /ts/ ou /dz/, não encontrei provas de que esse som se tornou /ʒ/ (j de janela) ou /dz/, apenas /s/, como no seu próprio nome Wa sa 'Woyana’ derivado de Wa yana e Swawari do Tupi îagûar-a.


 O Ybutritê indica que o fonema /h/ existia, tal não existia no Proto-Caribe, portanto deve ter se desenvolvido da mesma fonte que do Wayana das Guianas, que foi de um antigo /s/, portanto vemos o que é chamado de mudança em cadeia:


/s/ > /h/, portanto /j/ > /s/


 Tais mudanças são atestadas naquela região fronteiriça do CE-RN, como no Janduí, que pronuncia Kosetug como Kohituh de forma livre, ou o sufixo causativo houh, derivado do instrumental *co do Proto-Jê Setentrional, então pode-se argumentar que, desde aquela época, havia essa transição de /s/ e /h/ na língua do ramo Wayana.



Fontes: Tavares, A Grammar of Wayana, 2006





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



sexta-feira, 13 de setembro de 2024

A CONEXÃO HUMANA COM O UNIVERSO E O AMOR EM CURANARY (LÍNGUA KARIRI DE MARANGUAPE)


Curanary (lit.: nossa língua, Base Teceamamene/Maranguape, fonte: Courtz, 2008 + toponímia cearense)


       Tep:usicimene pa tecane weî tapa:mene sopo, ure cere ta, sapo sa' Tu:si me Teceremenere sasipe pe tema'ma:ne cereno acurap:u teturu:re saîto:, tecane sewar:an. Mo:se te tecerene tusa' Turu: coro:n Ereru: owin temene cereto: capampose, to'se, maînato:se, tonomese, sano Pe apoto:re cereto: cetoto: tanesa Tapa:mene, tecurepomene uto: puwase, teworo ameco "mamito: cerese" sicasa.

      


Português


       O ser humano é um ser microcosmo do universo macrocosmo, no princípio da criação Deus como o Ser Supremo sentiu um profundo Amor Eterno criando o mundo cheio de vida entre elas uma em especial o Ser Humano. Essa energia criadora que organizou o Caos sob a Ordem do unidade harmônica dos elementos químicos, minerais, vegetais e os animais, sendo o Amor o sentimento de criação e conexão dos seres do Universo que faz tudo funcionar num princípio evolutivo e outras culturas chamam processo criativo.





OBSERVAÇÕES


 Alguns detalhes ainda estão sendo estudados, a língua Kariri de Maranguape representa a conservação de aspectos gramaticais da família Kariri que cairam em desuso com sua migração para o São Francisco, decorrente de um forte influxo Macro-Jê, especificamente Terejê, que adentrou nesses idiomas.


 No Rio Timonha, antigamente Temona, houve simplificação da gramática, pois aqui usa-se apenas ty- (te-) com wona (mona) para criar o substantivo ty-wona (te-mona) 'jardim', sem o uso dos sufixos adjetivizadores próprios para esse caso (-me, -ne, -je, -se, -re ou -pe). No entanto, Dequeamamene (Teceamamene) usa não só do prefixo ty- (te-), como também de dois sufixos ao mesmo tempo -me e -ne (-me-ne), sendo -me o marcador de função, algo como 'funciona como', enquanto -ne é o agentivo, portanto 'aquele(a) que', criando ty-woma-me-ne (te-ceama-me-ne) 'aquele/aquilo que funciona como (lugar de) guerra', portanto 'campo de batalha', traduzido para o Tupi como Marangûab 'lugar de batalha', isso indica que a língua Kariri da região próxima de Maranguape tinha tendências conservadoras na morfologia da língua.


 Não temos dados que corroborem muito com argumentos para a sintaxe, mas é possível inferir que, por conta da influência do Tarairiú, haveria modificações no sistema de conjugação da língua. Primeiro que o Tarairiú faz a distinção de realis e irrealis, vemos isso em seu uso de morfemas em suas formas não finitas, como gon-ya 'dormir (realis)' (*gõ-r 'dormir.NF' do Proto-Jê Setentrional), que, hipoteticamente, baseando-se na regra Macro-Jê, teria como forma irrealis (futuro, hipotético, imperativo) *gõ (*gõ 'dormir.F', usado quando conjugado e também no imperativo).


Além dessa distinção antiga do Macro-Jê, o Tarairiú redesenvolveu essa regra para palavras que havia perdido suas codas, usando da sufixação de *-ka (Xukurú -go, Janduí -g, Areriú -ka, Juká -'a) que marca o realis (pretérito perfeito e presente, tudo que é real), enquanto -mâ (como em xikumâ 'defecará' e Terapissima 'futuro acampamento unido') marca o irrealis (tudo que não é real, futuro, imperativo, optativo, desiderativo, pretérito imperfeito).


 Falo desse sistema por quê sabemos que esses povos teriam interagido por séculos uns com os outros, seja a partir de alianças, casamentos e/ou guerras, independentemente, um sprachbund seria criado, e aspectos da gramática de um convergeriam para a do outro igualmente, criando uma forma de falar local característica. A única frase que temos das proximidades do Ceará e RN é de um ritual dos Janduí:



Ga anes yedas hade congdeg houh

ga anes yedas hade congdeg houh

tu assim mandar milho caçar CAUS


'que tu faça ser enviado milho e caça'


ga = 'tu' (NIKULIN, 2020, p. 524, *ga 'tu')

anes 'assim' < verbo auxiliar (NIKULIN, 2020, p. 498, *(c)anẽ 'fazer assim' + ja 'irrealis)

yedas 'enviar, mandar' < verbo 1 (NIKULIN, 2020, p. 497, *jando 'enviar' + ja 'irrealis')

hade 'sabugo, milho' (NIKULIN, 2020, p. 494, *jate 'haste de palmeira', virou 'sabugo' na língua Tapayúna)

congdeg 'caçar' (sem distinção entre verbo e nome, assim: 'caça, animal', NIKULIN, 2020, p. 497, *kundo 'caçar' + -ka 'realis')


Obs.: as quatro primeiras palavras dessa frase, registrada por cronistas holandeses, repetem-se três vezes, mas eu retirei a repetição para deixar claro o que a frase seria se falada fora do contexto do ritual.



 Perceba que a fala dos Janduí é característica das línguas Jê, pouca afixação, com tendências isolantes e analíticas, a língua mais próxima dos Teceamamene seriam os Payakú, cujo tiveram um municípío próximo de Maranguape nomeado em sua homenagem, Pacajus. Este povo teria sido a principal fonte de tal influência Macro-Jê.


 O primeiro texto é uma forma baseada na comparação de dados, que indicam fortemente que a língua falada em Teceamamene era relativa direta do Kaliña das Guianas e parte da ramificação nortenha dos Kariri, outra ramificação que será traduzida logo abaixo é daquela dos Kinkú, cujo o Woyana, de acordo com análise do professor Valdivino e minha, seria dialeto deste, também podendo ser a língua do povo Jaguaribara.


 A língua Woyana compartilha seu nome com o Wayana, membro da mesma ramificação que não migrou para o nordeste brasileiro e sim ficou entre o Amapá e a Guiana Francesa, Tavares fez uma análise perfeita da língua em 2006, dando-nos dados o suficiente para compararmos com os dados do Nordeste e reconstruir esse idioma. O Woyana já teria tendências de redução silábica, mas com a influência das línguas Tarairiú, que já tinha a tendência de ter sílabas de VCVC, muitas das quais adquiriram o último C por meio de redução silábica, tal processo já nativo teria sido reforçado, como prova a palavra bu 'traíra (peixe), que é a pronúncia Teceamamene da palavra Woyana *buk, derivado de bu-ka 'carne-remover' (sim, é cognato do bu 'pele, casca' das línguas Kariri).

 Também temos mais dois dados da língua, de novo, baseado na pronúncia dos Kariri que participavam da mesma ramificação que os Teceamamene: Guasa-puina 'multidão de tapuias (provavelmente acampamento principal de uma das divisas dos Woyana, em Tapuiú, ao oeste de Camocim), com Guasa derivado de Wayana, demonstrando que já houvera ocorrido a redução:


Wayana > Wayan (pronúncia Woyana) > Wasa (palavra adotada com a redução silábica e queda da coda -n)


 O último dado é o antigo nome do rio Jaguaribe, que é Suaguarine, palavra essa claramente deriva do Tupi Antigo îagûar-a, mas com uma pronúncia divergente da que normalmente se espera, indicando que ela não estava sendo pronunciada por Tupis, e sim pelos Jaguaribaras, a presença do sufixo -ne indica que se trata de um substantivo agentivo, portanto suaguari-ne 'aquele que é onça'. Tavares confirma em seu documento que kaikui 'onça' também é kaikui 'guerreiro', portanto Suaguarine está traduzindo a palavra 'guerreiro' com um empréstimo do Tupi, indicando que, apesar da tendência monossilábica da língua, ainda surgiam palavras polissilábicas através de empréstimos dos idiomas locais e possivelmente através de compostos.


 Com tudo isso dito, aqui está minha reconstrução da língua Woyana, baseada na gramática de Tavares, 2006 + dados dos topônimos cearenses:




K-om (lit.: nossa língua)


       S-aî ty ka ty lo s:ik ty kup: më-m na, sa:-p yl ûë Kan me T-aî pep: sy lë lop: Sop Kam la, yl lo mnok s-aî m:e, sy mot up m:e: Ty ka. Num ty yl sin, ty pok Tu:l k:aî Pok po pëk t-yn: yl pi-p m:e, tëp m:e, py-m ot me, aî Py lë-n yl pym s-aî ko ty kup: ty mam pok po sa:-p ûan: me ûë, ty ûë sem sy ka "mam to: yl"




Curanary (lit.: nossa língua)


       Tep:usicimene pa tecane weî tapa:mene sopo, ure cere ta, sapo sa' Tu:si me Teceremenere sasipe pe tema'ma:ne cereno acurap:u teturu:re saîto:, tecane sewar:an. Mo:se te tecerene tusa' Turu: coro:n Ereru: owin temene cereto: capampose, to'se, maînato:se, tonomese, sano Pe apoto:re cereto: cetoto: tanesa Tapa:mene, tecurepomene uto: puwase, teworo ameco "mamito: cerese" sicasa.

      


Português


       O ser humano é um ser microcosmo do universo macrocosmo, no princípio da criação Deus como o Ser Supremo sentiu um profundo Amor Eterno criando o mundo cheio de vida entre elas uma em especial o Ser Humano. Essa energia criadora que organizou o Caos sob a Ordem da unidade harmônica dos elementos químicos, minerais, vegetais e os animais, sendo o Amor o sentimento de criação e conexão dos seres do Universo que faz tudo funcionar num princípio evolutivo e outras culturas chamam processo criativo.



A língua Woyana é mais monossilábica e analítica que a sua língua irmã, o Teceamamene, também como indica Tavares, tinha tendência de trocar /r/ por /l/, e as línguas do Ceará do grupo Caribe trocavam o i grosso por /e/, juntando isso com a redução silábica de punka > buk, veríamos que o verbo yry 'fazer' viraria yl /ɪl/. O autor também relata que a língua, apesar de ainda fortemente sintética, tinha adquirido em algum momento características analíticas, como a falta de conjugação para o passado e o gerúndio, deixando o verbo em sua forma base, portanto yl significava tanto ‘feito’ quanto ‘fazendo’, um conceito nada alienígena ao Macro-Jê, que possui a diferenciação de finitude e não-finitude através de sufixação.


 Com isso, o estudo ainda não está concluído, também irei publicar esse texto de novo levando em consideração que os Jaguaribaras foram fortemente influenciados pelos povos Tupi, então apesar de vocábulos nativos sem dúvidas existirem, também teriam equivalentes Tupi, como suaguari ‘onça’ (aqui sûaûari).





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ORIGEM DO PLURAL DAS LÍNGUAS KARIRI


O sufixo que usamos para o plural de objetos é -á, ele deriva de uma antiga palavra *ary, que significa 'conteúdos, sementes', que subsequentemente tornou-se o marcador de pluralidade. A palavra *ary é cognata do Proto-Caribe *a-ry 'sementes, conteúdos', o que ocorreu aqui foi a queda do sufixo -ry:


*a-ry > *a-r > *a > *-a





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quarta-feira, 11 de setembro de 2024

CURANARI, NOSSA LÍNGUA


A língua Kariri das proximidades da capital do Ceará deixou-nos pouquíssimos traços, as única palavras que temos certeza são Dequeamamene e suas variantes (Awamamune, Aguamamune, Aquamamune, Acamamune, Camamune), Gemame e Ariama, cujo teorizo serem pontos diferentes das Serras de Maranguape, pois:


1) Dequeamamene (Teceamamene, na ortografia que sugiro) significa 'aquele/aquilo que funciona como (lugar de) guerra', portanto 'campo de batalha', que foi traduzido pelos Tupis como Marangûab 'campo de batalha', derivado de ty- 'terceira pessoa reflexiva' + (o)wòma 'guerrear, batalhar' + -me 'com função de' + -ne 'sufixo agentivo'.  As variantes: awama, aguama, aquama, acama, cama, queama, colocadas nessa ordem, explicam a evolução dessa palavra até sua variante mais recente (1655, em comparação com as outras que surgem mais ou menos +40 anos antes).


2) Gemame (Syemame) significa 'funciona como caminho', derivado de uma palavra antiga das línguas Caribe osema 'caminho' + -me 'com função de'.


3) Ariama (Ariyama) significa 'fronteira', derivado do Caribe erije 'fronteira' + -my 'sufixo nominalizador'


Essas palavras representam um estágio anterior da língua Kariri, a prova dessa relação está na palavra para Maranguape: Dequeamamene, que usa da mesma estrutura de-...-X que o Kariri usa, que no caso do Dzubukuá é di-...-li




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE SONGÀ 'PENAS NOVAS'


A palavra Kipeá songà 'penas novas' refere-se às penas recem surgidas de pássaros, deriva de um verbo do Natú Antigo *tsõka (no que resultaria em côk /soːk/ no Natú do século 20), cognato do Xavante tsõ'a 'apresentar, elevar, revelar' e do Xerente sõkawi 'abertamente', o verbo em sua forma base significa 'abrir, revelar'.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



CORREÇÃO DA ETIMOLOGIA DE SEPRUN 'OVELHA'


A palavra seprun é derivada de um verbo cognato do Xerente saprõ 'conduzir', devido ao modo que um pastor conduz suas ovelhas.



Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



CORREÇÃO DA ETIMOLOGIA DE ZITÓK 'ESTRANGEIRO'


A palavra é na verdade cognata direta do Xavante nhitob'ru/tsitob'ru 'inimigo' e parcialmente do Xerente sikru 'inimigo'. 


tsito(b) significa 'fechado' e kru significa 'raiva, zangado', portanto a palavra original do Natú era *zitokru, que acabou virando *zitokr e depois zitók 'inimigo, estrangeiro'.


Esse processo também é visto no Xukuru, na sua palavra para 'casa' (sekri > xekl ~ xekh > sek, sok), possivelmente refletindo aspectos de uma Área de convergência linguística.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



domingo, 8 de setembro de 2024

ETIMOLOGIA DE SOPOÑU


 A palavra é cognata do Pankararú shupuñum, ambas derivadas de um antigo *supu(-ka) 'remexer ao redor em' + *-numy 'sufixo verbalizador intransitivo', formando *supu-num(y). A palavra não é nativa do Dzubukuá e foi pega emprestada de uma língua das proximidades, vista a preservação do /s/, o esperando sendo *hopoñu.


Fonte: COURTZ, Hendrik, 2008, p. 373




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quarta-feira, 4 de setembro de 2024

A POSSÍVEL LÍNGUA DOS WOYANA DE WARACAPASSU


 Sabe-se graças aos documentos dos holandeses que o povo Woyana foi liderado em algum momento por um cacique chamado Waracapassu (escudo grande), também é possível perceber sua presença na toponímia do Ceará, visto que alguns topônimos não tem explicação etimológica derivada do Tupi Antigo, como no caso do nome antigo do rio Jaguaribe, que era Suaguarine (Suawari-ne), com um sufixo agentivo -ne derivado das línguas Caribes, além da pronúncia de uma palavra Tupi (îaguar-a) com um s- e um -i no final (suawari 'jaguar, onça'), isso indica que os habitantes originários do Jaguaribe eram migrantes Caribes, e afilio-os diretamente aos Woyana, pois de acordo com Loukotka (1968) a palavra registrada no Wayana para onça foi yaweri (yaweri > sawari (fricativização y- > s-) > suawari (labialização s- > sʷ-)).


 A língua Woyana pode ser associada diretamente à confederação Wayana ao norte, no Escudo das Guianas, sendo língua prima da Kaliña descrita previamente e comparada com a família Kariri, parte do grupo central do tronco Caribe, grupo esse que eu suspeito ser o ancestral das famílias linguísticas Kariri, Tremembé e Woyana no nordeste. Os Woyana foram pouco mencionados, mas a relação da palavra Suawarine indica que sua presença ocorria no atual rio Jaguaribe, compartilhando tais terras com os Payakú da nação Tarairiú. Também suspeito que alguns devam ter migrado mais ao leste, para o rio Açu, onde viviam os Janduí, deixando-nos evidência disso no nome que os Janduís usavam para si próprios, Otschuca-YANA.


 Com essa associação, é possível também estudar tal língua, visto que duas gramáticas estão disponíveis de graça na internet (GRIMES, 1972; TAVARES, 2006). Darei atenção para essa língua ao lado do Tremembé no estudo que estou fazendo para tecer a relação linguística do Kariri com os troncos da América do Sul.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ESTUDANDO A ORIGEM DO NOME WANYE/WOYÊN 'TAPUIA' DAS LÍNGUAS KARIRI


Estou me perguntando aqui o quão desconexo ou conexo é esse termo da nação Kariri, pois Nantes usa aqui pagão, uma palavra que é normalmente usada pelos cristãos para definir uma pessoa de religião não-abraâmica.


 Pensemos assim, se Nantes estava na ilha de Aracapá, nas proximidades de Cabrobó e etc, ele estaria chamando as pessoas de dentro das aldeias Dzubukuá que não aceitaram o cristianismo de "pagão" especificamente ? Ou ele estaria falando de um povo a parte nas proximidades do Rio São Francisco ? Venho estudando aqui os documentos holandeses e vi menção de um povo Woyana, cujo bate perfeitamente o nome:


Woyana: woyana

Dzubukuá: wãye

Kipeá: woyên


 Também vi em uma publicação de 2003, de Jacionira Coêlho Silva, a sugestão de uma relação com os povos Umã, que, após eu checar a língua, percebi que tem forte afinidade com o Pankararú.


Também vejo que os Tremembé chamavam os Woyana de 'estrangeiro, bárbaro, tapuia', como no nome de um riacho aqui do Ceará, chamado Tapuiú em Tupi, mas chamado de Guasapuina em Tremembé < *waja(na) apyin-a 'multitude de tapuias' (Courtz, 2008, p. 236).





Autor da matéria: Suã Ari Llusan