sexta-feira, 26 de julho de 2024

ETIMOLOGIA DE UBBI E UBI


Pt.:


 As palavras ubbi ‘ver, ouvir’ e ubi ‘observar’ derivam de um cognato do Galibi upi ‘procurar, buscar’.


 Há o vozeamento típico do Kariri, causado pela influência Terejê, d’onde as vogais altas [i, u] fazem com que as oclusivas surdas [p, t, k] tornem-se sonoras [b, d, g].





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



CORREÇÃO DA ETIMOLOGIA DE WARAERO


 A palavra Kipeá waraerò 'beiju' é cognata do Galibi wararùpo 'espécie de mandioca', a palavra Kariri se especializou para se referir a um tipo de preparo da mandioca.


 A pronúncia rae em wa-RAE-rò é causado pela fraqueza dessa sílaba, transformando-a no som entremeio o á aberto e o é aberto.


 O ù com o acento grave indica vogal longa, o que também indica que o Kariri perdeu a sílaba por redução silábica, que foi da seguinte forma:


*wararûpo > *wararûp > *wararû > *wararô > warærô


Obs.: o circunflexo aqui representa a vogal longa, û = úú, ô = ôô.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE MOENAHAN E MINEHẼ


 As palavras moenahan ‘hoje’ e minehẽ ‘hoje, pelo tempo que já passou’ são abreviações de construções antigas, o que houve aqui foram a queda de certos elementos da gramática antiga do Kariri.


 A palavra antiga, usando as palavras que ainda sobreviveram de forma independente no Kariri seriam:


Dzubukuá: anro-moe-na-han

Kipeá: ero-mi-ne-hẽ


anro/ero ‘este(a)’ + moe/mi ‘funcionando como (sufixo com ess sgnf.)’ + na/ne ‘sufixo de adnominalização’ + han/hẽ ‘sufixo plural’. Toda essa construção é cognata do Galibi eromenokon ‘hoje, agora’.


 O fato da maioria dessas palavras não existirem ativamente hoje no Kariri, além do fato de que elas derrubaram o pronome demonstrativo anro/ero, que determina o conceito de ‘agora’, e também a clara substituição por uma construção análoga (do ihi / do ighŷ que são do ‘para’ + ihi/ighŷ ‘este, isto’, usando ‘este’ para denotar ‘agora’), indica que quando o Kariri entrou no Nordeste e foi subsequentemente influenciado pelas línguas Macro-Jê, este sistema do Proto-Caribe colapsou, sendo substituídos em suas funcionalidades pelas preposições do Terejê, como do, bo e mo. Mas como elas sobreviveram até o presente momento nessas palavras, e agora sabemos o seus significados, podemos revivê-las na língua novamente:



moe/mi ‘funcionando como (sufixo com ess sgnf.)’


 Esse sufixo faz com a palavra que ela marca torne-se algo funcional, isso é, a palavra marcada ganha a conotação de que ela funciona como o conceito que ela representa, por exemplo:


Dz.: baddo-moe ‘funcionando como entrada, entrada, porta’ (baddo ‘entrar’ + -moe ‘funcionando como’)


Kp.: mani-mi ‘funcionando como longe, distância, comprimento, duração’ (mani ‘longe’ + -mi ‘funcionando como’).




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DAS PALAVRAS BUYEHOHO, BUYEWOHO E BUJÖWAGOH


 As palavras buyehoho ‘corpo’, buyewoho ‘corpo’ e bujöwagoh derivam da composição de quatro elementos:


bu-ye/bu-jö ‘grande’, que é o classificador geral bu- + ye/jö ‘grande’


hoho/woho/wagoh que representam cognatos do Galibi akepy ‘corpo, defunto’ e do Wayana ôkep ‘corpo’, no caso do Kariri, está marcado com o prefixo w- relacional, sendo a raiz principal oho/agoh, que deriva de um antigo *əgo e mais antigamente de *əko.


 A evolução do Dzubukuá de w > h representa um processo antigo do Proto-Kariri de transformar o fonema *w em *g, que no caso do Dzubukuá, viram todos uniformemente ɣ (h).




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quinta-feira, 25 de julho de 2024

ANÁLISES DAS FRASES DE INTRODUÇÃO DO WAKONÃ E SUA TRADUÇÃO PARA O NATÚ, PARTE III


Natú: hay pora me pa ‘bom dia, como vai’


Derivado do Wakonã rêipôrámêpá ‘bom dia, como vai’


 A palavra hay significa ‘bom, bem’, pora deriva de um cognato do Xavante poré ‘geral, em todo lugar’, me significa ‘com’ e pa é o interrogativo, assim formando:


hay pora me pa, literalmente ‘com bem geral ?’, com ‘geral’ sendo um modificador usado para denotar como a pessoa vem ido em geral, não só no presente momento, mas nos últimos dias ou semanas.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ANÁLISES DAS FRASES DE INTRODUÇÃO DO WAKONÃ E SUA TRADUÇÃO PARA O NATÚ, PARTE II


Natú: pö hay tï ‘obrigado, muito bem’


Derivado do Wakonã pórraêtê ‘muito bem, obrigado’


A palavra pö ‘satifasção, alegria, sucesso’ deriva de um cognato do Xavante pã ‘satisfação, alegria, sucesso’, hay é ‘bom, bem’ e tï é a partícula predicativa, basicamente o verbo ‘ser’, a frase significa ‘é bem satisfatório’, portanto ‘muito bem, obrigado’


Natú: wêr jö ‘obrigado’ e wêr jö tia ‘obrigado’


Derivado do Wakonã bêrêió ‘obrigado’ e bêrióstiá ‘obrigado’


 A palavra wêr significa ‘bondade, bonito’, cognato do Xavante wẽ e wẽre ‘bondade, bonito’, enquanto jö provavelmente é cognato do verbo nhomri ‘dar’ do Xavante. Assim


wêr jö ‘dar bondade’ > ‘agradecer, gratidão, obrigado’.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ANÁLISES DAS FRASES DE INTRODUÇÃO DO WAKONÃ E SUA TRADUÇÃO PARA O NATÚ, PARTE I


Pt.:


 Com as descobertas recentes sobre os padrões fonéticos entre o Wakonã, Xokó e Natú, creio que fique mais fácil revisitar e reconstruir de forma precisa as palavras de introdução no Natú:


Olá, bom dia = de hay wê pa


Derivado do Wakonã derraivêpá ‘bom dia’


Obs.: A construção utiliza de de … pa para construir uma frase imperativa (técnicamente o tom que se passa é do optativo, isso é, desejo), portanto ‘oxalá tenhas um bom dia’.


 Hay wê significa ‘bom dia’, note que a ordem indica que os adjetivos (hay ‘bom’) devem vir primeiro e o modificado (wê ‘manhã’) deve seguir o modificador.


 A preposição de é cognato do Xerente te ‘marcador de tempo não-passado de segunda e terceira pessoa’, indicando que o Terejê preservou esse sistema, cujo será reconstruído assim:


wa ‘primeira pessoa passado e não-passado’


mô ‘segunda e terceira pessoa do passado’


de ‘segunda e terceira pessoa do não-passado’


Sendo o complexo verbal canônico:


Sujeito agente → Pronomes de tempo → realis/irrealis → Direção → Sujeito paciente → Interrogativo


Ex.: wa/ka/ta → wa/mô/de → cu/do/cê →  kra/zu/rôt/kap → a-/wa-/o-/i- → pa



Portanto uma frase com todos esses elementos seria:


wa wa cu zu tê pa ‘eu saio?’


É claro, essa é a frase completa sem ignorar qualquer aspecto do complexo verbal, toda língua falada no mundo, no entanto, busca reduzir o caminho para que a mensagem alcance o ouvinte. Logo de começo é possível eliminar os pronomes de agente da cláusula, que pelo contexto são fáceis de deduzir, e no caso da primeira pessoa é identico, resultando na repetição redundante (wa wa). Também é possível reduzir no presente o realis cu, que não é obrigatório. Portanto:


wa zu tê pa ‘eu saio?’ (wa ‘eu’ + zu ‘sair, movimento centrífugo (de dentro para fora)’ + tê ‘ir’ + pa ‘interrogativo’)


 Assim, efetivamente encurtando a frase na prática. A pergunta fica é claro, para quem leu os pronomes de tempo mô e de, que possuem o significado simultâneo de segunda pessoa (tu, você, vós, vocês) e terceira pessoa (ele, ela, eles, elas), para isso, o pronome de agente que vem antes dele pode surgir para desambiguar, mas é claro, a maioria das línguas do mundo tendem a possuir mesmo que um mínimo sistema de inferência, que faz com que os falantes deduzam o contexto da fala sem dar grandes detalhes.


 Pense por exemplo, uma mãe chegando em casa depois de ter deixado o almoço pronto para o filho, o filho chega da escola e come a comida, a mãe chega um pouco depois e pergunta:


- comeu ?


E o filho responde


- comi.


 Note que no português do Brasil, a conjugação de segunda pessoa (comeste) colapsou e foi substituída pela terceira pessoa (comeu), mas ainda assim, sabemos que a mãe quis dizer ‘tu comeu ?’ e não ‘ele(a) comeu ?’, exatamente por que sabemos o contexto através da inferência, portanto mô e de, funcionam da exata forma, o contexto distingui a segunda e a terceira pessoa.


mô do krâ pa ? ‘comeu ?’


wa do krâ ‘comi.’




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



FINALMENTE COMPROVANDO AS CONSOANTES FINAIS DO NATÚ


 Até o presente momento, a única evidência firme das codas do Natú era a palavra zitók ‘estrangeiro’, cujo tók seria uma antiga dupla negação tó-kó ‘não-não’ que foi reduzida para tó-k, essa era a única forma de hipotetizar sobre as codas do Peagaxinã.


 Mas após uma análise do vocabulário Kipeá, vasculhando os termos que são confirmadamente Terejê, cheguei em ki-bu ‘osso do pescoço’, que já analisei no passado como ki ‘osso’ + bu ‘pescoço’. O problema aqui é que bu só pode vir de um vocábulo de uma língua Jê Cerratense, que herdou *mbut, não do Proto-Kariri, que herdou ne ‘pescoço’.


 Como já afirmei no passado também, o Kipeá é a língua que sabemos que interagiu fortemente com o Natú, então a partir daí já é possível extrapolar de onde veio o vocábulo. Porém, a palavra do Jê Central e posteriormente do Proto-Akuwẽ era *butu ou *budu, com a coda de mbut (-t) sendo herdada com uma vogal repetida:


*mbu-t > *mbu-t-u > *bu-t-u ~ *bu-d-u


 Vemos que em algumas palavras, como wanhere, a coda também passava pelo mesmo processo de extensão no Natú (ñe-r-e), mas ela não parece ter sido preservada aqui no bu do Kipeá, minha teoria é de que os Kipeá estavam aproximando sua fala à fala Natú, que na época, provavelmente já demonstrava tendência de redução silábica por conta da sílaba tônica da língua, portanto veríamos algo como *but ‘pescoço’ já presente na fala do Natú Antigo, ao invés do esperado *butu ou *budu.


 Agora temos duas evidências da redução silábica do Natú, e prova de que tal processo é muito mais antigo que o registro da língua no século XX:


*dzi-tó-kó > zi-tó-k ‘estrangeiro’

*budu > but ‘pescoço’.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quarta-feira, 24 de julho de 2024

ETIMOLOGIA DE BANARÈ


O verbo banarè 'temer' no Kipeá ou bannanrè 'temer' do Dzubukuá derivam da composição de BA 'ter medo', uma palavra do Terejê, que é cognata do Xavante pa em pa-hi 'ter medo' e pi-pa 'perigo'.


 NARÈ e NANRÈ derivam de um cognato do Galibi anari 'medo', servindo de modificador para BA que é monossilábico e pode ser confundido com outras palavras. O fato de Nantes escrever bannanrè com dois nn provavelmente indica que a vogal de a- do início foi preservada na forma de alogamento das consoantes, talvez indicando que NARÈ e NANRÈ eram na verdade ANARÈ e ANANRÈ quando estavam em suas formas independentes.


Fontes:


COURTZ, Hendrik, A Carib grammar and dictionary, 2008




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



terça-feira, 23 de julho de 2024

ETIMOLOGIA DE DSE E TÇÃ


As palavras dse/tçã 'duro, rijo' derivam de uma antiga palavra cognata do Galibi jàna 'dureza, firmeza', indicando que o fonema ts deriva tanto da palatalização de k quanto de um antigo fonema j (j alemão, como se fosse o y de yes do inglês)


Fontes:


COURTZ, Hendrik, A Carib grammar and dictionary, 2008.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



CORREÇÃO DA ETIMOLOGIA DE AIBY


 A preposição aiby, que é usada em cláusulas de necessidade, como:


dzu-eicò s-aiby bodzo 'eu necessito do machado'


 Parece deriva de um substantivo cognato do Galibi apyin 'multitude', assim a função de aiby era de expressar grandeza da necessidade por algo, cujo da forma que Mamiani registrou, provavelmente havia perdido a conotação intensiva e se tornou uma partícula obrigatória para indicar necessidade de forma genérica.


Fontes:


COURTZ, Hendrik, A Carib grammar and dictionary, 2008.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE MAEHAE E MANHEM


 Ambos Nantes e Mamiani usam essa palavra com os significados de 'engolir' ou 'atravessar' nos seus catecismos, dos quais desses foi derivado o conceito de 'mais' como sufixo, que derivam de uma palavra cognata do Galibi èmoky 'colocar em um buraco, engolir', cujo no caso de 'mais' veio de um sentido de 'adicionar', como colocar algo dentro de uma sacola.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE BŶRIRIPI


 A palavra bŷriripi 'desviar-se das flechas' é composta de byri 'flecha', palavra cognata do Galibi pyrywa 'flecha' + ripi 'partícula que indica falha, erro, falta de sucesso'. Isso talvez indique que byri fosse um verbo que significasse 'ser flechado', juntando com -ripi que indica falha, cria-se:


byri-ripi 'ser flechado sem sucesso' ou 'falhar em ser flechado', portanto 'esquivar-se das flechas'.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



A ETIMOLOGIA DE TANE


 A palavra Kipeá tanè 'desejar fumo' representa a conservação de uma raiz muita antiga das línguas Kariri. Badzé é uma introdução ao vocabulário Kariri a partir dos povos Macro-Jê, tanto que Martinho de Nantes explicita a origem posterior do deus Badzé quando ele relata que foi o Grande Pai que o mandou para nós.


 Com isso em mente, essa palavra não usa badzé em sua composição, sabe-se que -ne é 'desejar', já que a palavra ne-yentà 'desejar' existe, e é comprovado nos nomes de padrasto e madrasta, que são pa-yenta e de-yenta que yenta 'desejar' é uma palavra separável de ne, portanto temos *ta* que parece nesse caso representar 'fumo, tabaco', isso é comprovado pelo seu cognato Galibi, que é tamy 'tabaco'.


Fontes:


COURTZ, Hendrik, A Carib grammar and dictionary, 2008.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE KINNE


 A palavra kinne surge no Katecismo Indico Dzubukuá, na linha:


“Kínneba nodehèm do Kátte do áddhè.”

“...Ou cozido em caldeira de agoa fervente, para vosso guizado.”


 Essa palavra é cognata do Galibi keneneky ‘calor brilhante, brilho’ reduzida de sua forma polissilábica para kinne, possivelmente:


keneneky > kenene > kenne > kinne = kinne


 Essa etimologia justifica o uso da consoantes duplas de Nantes, sendo assim, o autor estava muito provavelmente tentando representar as consoantes geminadas que resultaram de abreviações de palavras polissilábicas e uma possível fonemização desse processo em palavras que não tem tal justificativa etimológica, semelhante à variação livre do Dzubukuá com o fonema /d/ (d) e o fonema /ð/ (dh).




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE BALU/BAERU


 As palavras balu e baru, que surgem em compostos como nabalu 'costa' e nebarù 'ombro' derivam de uma antiga palavra que significa semente *əpy-ry.


 Assim como especulei no passado, balu/baru havia adquirido o significado de 'base', como em ne-baru 'ombro' (ne 'pescoço' + baru 'base').


Fontes:


https://cariban.clld.org/cognatesets




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE RÂCA


A palavra Dzubukuá râca 'peixe que pega a isca' significa literalmente 'levantar o peito de', referindo-se ao ato de fisgar o peixe e puxá-lo da água.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE NHIEWO, NGIGOS E NIUNGOH


 As palavras citadas no título foram usadas pelos cristãos para definir o conceito de ‘demônio’ ou ‘diabo’, não só Lúcifer, mas também todo e qualquer ser que pudesse ser considerado um demônio por eles. Esse uso plural é evidência clara de que os nhiewo (Dzubukuá) ou niungoh (Sapuyá e Kamurú) eram seres espirituais antigos, sendo os mesmos que os ngigos, espíritos que estavam abaixo de Meneruru (segundo Serafim Leite).


 A etimologia da palavra está relacionada ao termo j-akuwa ‘espírito do pajé’ do Galibi, através da nasalização de j- para ñ-, portanto:


j-akuwa > ñ-akwa > ñ-agwa > ñ-əɣwó > ñ-əwó (nhiewó)

j-akuwa >  ñ-akwa > ñ-agwa > ñ-əɣwó > ñ-ũgó (niungoh)


 O espírito é especificamente aquele que baixa no mensô e o auxilia nas curas, eis o por que de ser distinguido como ‘shaman’s spirit’ ou ‘espírito do pajé’.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



A ETIMOLOGIA DE MENERURU, CEMACURE, KENBARERE E WARIDZAM E CRUMNIMNI


Pt.:


 Com a descoberta da relação próximal do Kariri com o Carib do Suriname (Galibi), é finalmente possível dizer com total certeza o que significa o nome do Deus maior dos Kariri que foram anotados por Serafim Leite, Meneruru, o primeiro humano criado por ele, Cemacure, e os dois gêmeos lendários, Kenbarere e Waridzam, e por último, o filho do primeiro homem, Crumnimni, pai de todos os brancos.



MENERURU


 Comecemos com o Meneruru, que ainda possui evidência clara de seu registro no vocabulário Dzubukuá menne ‘ira’, que foi usado pelos cristãos como ira, mas o significado não era exclusivamente hostil, note que no Carib, mene significa ‘mal’, mas também ‘enorme’, não ‘mal enorme’, mas sim duas palavras separadas, o que talvez indique que mene primeiro indicasse ‘grandeza’, antes de passar para significados mais negativos. O que corrobora o uso de ‘enorme’ ao invés de ‘mal’ ou ‘ira’ é a segunda raiz no nome dessa divindade, ruru, que é cognato do Carib tururu ‘massividade, massa caótica’, indicando que, na crença Kariri, Sonsé ou Meneruru era a massa caótica formadora do universo, a pré-existência que deu luz à existência. Portanto:


mene-ruru ‘enorme massa caótica’ > Meneruru ‘Deus que subsiste no ar’ como disse Serafim Leite



CEMACURE


 Cemacure possui um cognato que explica a criação da humanidade, mesmo que o conto hoje não esteja entre nós, esse composto nos indica o que ele poderia ter sido. No Carib existe a palavra samaku, uma espécie de pote de barro que tem mais de um metro de altura, juntando isso com o sufixo -re adjetivizador (de onde derivou o -ri/-li da construção di-...-ri/-li), temos cemacu-re ‘aquele que é cemacu’, indicando que o ser humano não só veio do barro, mas veio da complexidade da técnica do artesão de barro, cujo cronologicamente, o corpo de cemacu teria se quebrado após os Kariri tentarem resgatar seus filhos no céu, dando origem ao humano moderno, que tecnicamente seriam os hemacubuiddhâ ‘cemacus quebrados’ em Dzubukuá.



KENBARERE E WARIDZAM


 Kenbarere muito provavelmente representa um composto entre ke ‘falar’ (de onde surge quedde ‘falar’ no Dzubukuá, sabe-se também que -de ‘dizem que’ é um morfema separável através do Kipeá) + bare ‘forte’ (cognato do Galibi porito, que é normalmente reduzido, como em parì-pe < porito pe) + -re ‘adjetivizador’ (de onde derivou -ri/-li), portanto:


 kẽ-bare-re ‘aquele que fala com força’


 Waridzam muito provavelmente deriva de um cognato do Galibi warijàto ‘cuidar, tomar conta’. Portanto:


waridza ‘aquele que cuida’


 Essas etimologias falam fortemente sobre qualquer conto que poderia derivar desses dois gêmeos, visto que um, tinha ‘fala forte’, pode se entender que ele era mais brusco e direto nos seus comentários, o que fazia com que seu irmão, Waridzam, tivesse que cuidar dele e livrá-lo de qualquer problema que ele se metesse.



CRUMNIMNI


 O filho de Cemacure e sua esposa, cujo nunca é nomeada diretamente, apenas comparada com a Eva cristã, é Crumninim, cujo como argumento desde de minha publicação da listagem de divindades e espíritos da crença Kariri, muito provavelmente não era o único filho do primeiro homem e da primeira mulher, visto Crumninim tinha o propósito de explicar a origem dos europeus, muito provavelmente haviam ancestrais que explicavam a origem não só dos Kariri, mas também de possíveis clãs e outros povos da região ou clãs espirituais. Crumninim muito provavelmente carrega o prefixo kru-/cro- ‘prefixo classificador de rios e qualquer tipo de líquido’, que deriva de um antiguíssimo kuru ‘líquido, água, rio’, visto ainda no município de Paracuru no Ceará e seu rio, o Rio Curu, que é sinônimo do Tupi Pará, que é usado tanto para rios quanto para o mar, portanto:


Cru ‘rio, mar’ + -nĩ ‘nominalizador agentivo’ (cognato do Galibi -nen) + -ni ‘sufixo de adjetivização possessiva’ (cognato do Galibi -ne)


cru-nim-ni ‘marujo, marinheiro’


Fontes:


COURTZ, Hendrik, A Carib grammar and dictionary, 2008




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



domingo, 21 de julho de 2024

PRODENHÈ É UMA FRASE


A palavra prodenhè ou prodenhemŷ é uma frase Terejê que denota o conceito de 'além', é na verdade derivado de: 


pra da ñe 'como se fosse para avançar', cujo os cognatos: pra 'avançar', da 'para' e nẽ/ne 'como' são encontrados igualmente no Xavante e no Xerente. 


-MŶ é uma adição posterior, sendo um sufixo nativo do Kariri que indica direção, portanto prodenhe-mŷ 'em direção ao que avança', portanto 'além'.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE PRI/PLI 'SANGUE'


 A palavra é parcialmente nativa, deriva de um antigo pi, mas sua estrutura parece ter sido influenciada diretamente por pré 'vermelho' do Terejê, como em seus cognatos pré 'vermelho' do Xavante e Xerente.


pi > p(r)i ~ p(l)i (consoante adquirida por associação, mas a vogal /i/ é preservada) > prɪ ~ plɪ (/i/ > /ɪ/, que é um som entremeio í e o ê fechado).





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



USO DE HONORÍFICOS NO KARIRI


 As línguas Kariri parecem ter desenvolvido uma forma de prefixação honorífica derivada de uma palavra Terejê que significa 'autoridade'. Nesse caso vemos prebú 'cuieté', que possui a palavra BU 'cabaça' prefixada com PRE-, significando 'cuia de autoridade, cuia de respeito' e portanto 'cuia verdadeira', funcionalmente similar ao -idzã/-idze 'verdade, verdadeiro' visto também no Kariri.





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DA PALAVRA PONHU 'NADAR' DO KIPEÁ E POSSÍVEL SUFIXO FOSSILIZADO


 A palavra ponhù 'nadar' é cognata do Galibi eponumy 'nadar', perceba no entanto que essa não é a forma base dessa palavra, sendo eponumy derivado de ỳpon 'habilidade de nadar', com -numy sendo um sufixo que significado algo como 'mover-se com'. Como muitas palavras do Kariri, houve redução do morfema para uma forma monossilábica, por conta da influência Macro-Jê, portanto temos:


Kipeá: PÓ 'habilidade de nadar' + -NHU 'mover-se com' = PO-NHU 'mover-se com habilidade de nadar', portanto 'nadar'.





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE POHÀ 'SECAR-SE A RAÍZ'


A palavra deriva de uma antiga palavra das raízes Caribes do Kariri, um cognato ainda é preservado no documento de Courtz, em sua descrição da língua Galibi, lá surge como àpoka 'secar, fazer estaladiço'.


 O que aconteceu no Kariri foi lenição da consoante -k- intermediária, primeiro ela virou -g-, em (a)pogá, depois o -g- aspirou-se para o "g holandês", em pohà.


Fontes:


COURTZ, Hendrik, A Carib grammar and dictionary, 2008.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE POBEBÀ 'FOGAÇA' DO KIPEÁ


 A palavra foi traduzida de forma precisa por Mamiani, que era italiano e distinguiu o pão Kipeá como semelhante à fogaça (focaccia) italiana. A palavra é composta de PO 'ser espancado, bater', referindo-se ao processo de fazer pão + BEBÀ 'baixo', referindo-se à altura do pão, que como a fogaça, é achatado.


[o] na ortografia pode representar o schwa /ə/ (â da sílaba sa de casa do português).





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



CORREÇÃO DA ETIMOLOGIA DE WANHERÉ 'FAZENDA'


 A palavra segue o processo de derivação zero, onde a composição se traduz literalmente como wa 'raiz' (lenição de p > w) + ñêrê 'colocação, plantação'. forma não-finita do verbo ñê 'meter, colocar', formando wa-ñêrê 'colocação de raízes' (< *pa-ñêrê) > 'fazenda'.



Fontes:


LACHNITT, Georg, Romnhitsi'ubumro a'uwẽ mreme-waradzu mreme, DICIONÁRIO XAVANTE = PORTUGUÊS, 1987.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



CORREÇÃO DA ETIMOLOGIA DOS NOMES WAKONÃ E XOKÓ


Pt.:


Percebo agora o seguinte, lembro aqui que os Terejê tem uma relação aproximada com o mutum-de-alagoas, sendo esta ave de tão grande importância, que esses povos se nomeam a partir dela.


 Os Natú se chamam de Peagaxinã, que significa aqueles dos passos do mutum, já os Wakonã também se chamavam de Inakáná, enquanto os Xokó se chamavam de Seokó, é possível identificar a raiz aka 'mutum' em ambos os nomes:


I-n-aká-ná, que se desconstrói como i- 'prefixo de terceira pessoa' + -n- 'prefixo relacional' + aká 'mutum' + -ná 'sufixo do plural', mesmo que -nan de Pe-agaxi-nan.


Se-okó, que se descontrói provavelmente de um antiguíssimo tsi-aká, que seria tsi 'ave, pássaro' + aka 'mutum', com tsi sendo comprovado como raiz Terejê no nome Natú, Pe-aga-XI-nan (aga 'mutum' + xi 'ave')


 Então vemos que a nação Terejê se via como representada por essa ave sagrada, o mutum-do-nordeste, que foi extinta na natureza, mas que hoje aos poucos ergue-se das cinzas e dá novamente seus passos na terra.





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quinta-feira, 18 de julho de 2024

A ORIGEM DO VERBO TÊRÊ E SUA REGULARIZAÇÃO NO TEREJÊ


Pt.:


 Encontrei um fato interessante sobre o verbo têrê ‘ir.SG’ que surge no nome da nação Terejê. Esse verbo é irregular se comparado com o Akuwẽ, visto que não herdou a forma antiga do verbo do Proto-Cerratense, que era *tẽ-m ‘ir.SG’ com o sufixo de não-finitude -m no final da raiz. Isso é muito interessante, pois indica duas coisas:


1 ) Em algum momento da história do Terejê, houve a queda do -m no final da palavra, deixando a raiz em sua forma bruta tẽ, que logo viraria tê (ê = ee longo).


2) No período intermediário, os povos Terejê ainda tinham noção da existência do sufixo de não-finitude -r, e logo optaram por substituir o -m, que havia desaparecido, criando a nova raiz regularizada gramaticalmente para *tẽ-r (> tê-r-ê).


 Esse argumento é reforçado pela forma que o Akuwẽ herdou essa palavra, que foi *nẽm, sem extensão da coda -m, o que foneticamente no Terejê teria feito essa consoante desaparecer sem deixar o traço típico desse ramo, que é a coda extendida (hipotéticamente teria resultado em *tê-m-ê). Por conta disso, é possível afirmar que o Proto-Jê-Central herdou a forma *tẽm sem modificação da coda de não-finitude, ao invés de herdar como *tẽmẽ, quando os Terejê adentraram e participaram da área de convergência linguística do Nordeste, que tende a não permitir consoantes finais, estes tiveram que regularizá-la para uma forma que seguisse o padrão C(r)V da região. Assim criando a dicotomia de tê ‘ir.SG’ na forma finita e têrê na forma não-finita.




Fontes:


Nikulin, Andrey Proto-Macro-Jê: um estudo reconstrutivo, 2020, Brasília.





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quarta-feira, 17 de julho de 2024

POSIÇÃO CANÔNICA DOS TEMPO-ASPECTO-MODO


Wakonã: wê/wêci ‘vir’


REALIS


Presente: sú wê ‘vem’

Pretérito Perfeito: to wê ‘veio’

Gerúndio: wêci ‘vindo’


IRREALIS


Futuro: ce wê ‘virá’

Imperativo/Optativo: ka li ce wê ‘venhas!’ ou “que venhas!”

Condicional: na ce wê ‘se vem’

Pretérito Imperfeito: ce wêci ‘viria’


 Agora que compreendo os conceitos de realis-irrealis e finitude-não-finitude melhor, posso aplicar de forma mais concisa a gramática da língua com seus marcadores nativos. Sabe-se que wê ‘vir, chegar’ tinha a forma não-finita wêci, que surge em dois locais: Quando o verbo está marcando uma ação não concluída, portanto wêci marca sozinho o gerúndio da língua, como em wa wêci ‘eu estou vindo, eu estou chegando’.


 Com isso em mente, lembro aqui que o conceito de pretérito imperfeito é marcado no seu próprio nome, *imperfeito*, que indica uma ação não-concluída, como em: “eu fazia ballet, não faço mais.”, aqui sugiro que a marcação prévia que sugeri seja substituída pela forma não-finita (wêci nesse exemplo) com o marcador de irrealis (cê no Wakonã).


 Também estou modificando a ordem para imitar melhor a gramática do Wakonã, a ordem canônica indicada por essa língua é seguinte:


agente - tempo/aspecto - modo (realis/irrealis) – verbo – objeto


Ex.:


ka – li – ce – bêlêtsie – baskíô

tu – IMP – IRR – falar – comigo

“fales comigo”.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



MORFOLOGIA MISTA DO TEREJÊ


Pt.:


 As línguas Terejê vem apresentando uma morfologia de caráter misto, por um lado vemos sua tendência nativa de criação de palavras, que deriva diretamente da forma como o Proto-Cerratense formava palavras.


 Existem três níveis:


1) DERIVAÇÃO ZERO


 Derivação zero é o que venho discutindo recentemente, que é o conceito de derivar um verbo ou substantivo sem modificá-lo, é a mesma forma que fazemos com o verbo olhar e o substantivo olhar, a palavra não se modifica morfologicamente (pelos morfemas que a formam), mas sim semanticamente (pelo significado que lhe é atribuído), o mesmo ocorre com so ‘curar’ e so ‘curandeiro(a), pajé’.


1) PREFIXAÇÃO


 Normalmente se usam dois prefixos para derivar palavras no Terejê, a- que marca a classe animada e i- que marca a classe inanimada, portanto a-so ‘curandeiro(a) humano(a)’ e i-so ‘coisa que cura, objeto que cura, medicina’.


2) SUFIXAÇÃO


 Por último, existem dois sufixos conhecidos que derivam substantivos, -kîô que cria agentes da ação referida e -dzé que cria objetos e locais derivados do palavra sufixada, portanto mari-kîô ‘guerreiros, exército’ e mari-dzé ‘local de guerra, campo de batalha’.


 Como é possível notar, existe uma característica clara nas derivações nativas, que é o parco uso dos afixos, se limitando normalmente a um de cada vez, raramente notando-se uma estrutura obrigatóriamente circunfixal (que tem tanto prefixo e sufixo obrigatórios), no entanto, o Terejê, através da influência direta do Kariri, adquiriu a tendência de circunfixação, através do prefixo de terceira pessoa correferencial t(i)- e o sufixo de objetos -dzé (que é -shin no Natú, -dzé no Xokó e -çá no Wakonã), como em t-atu-shin ‘aquela coisa que é velha’.


 Isso nos indica que, junto com a marcação direta nativa do Terejê, aspectos do tronco Caribe, através do Kariri, foram introduzidos na língua com a junção desses povos, demonstrando que a gramática das línguas Terejê é o resultado oposto do Kariri, enquanto aqueles são povos Macro-Caribes que se fundiram com povos Macro-Jê, os Terejê são povos Macro-Jê que se fundiram com povos Macro-Caribes.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



O TERMO GANDIL’A É UMA TRADUÇÃO DO KARIRI ERA/ANRA


Pt.:


 Com a descoberta da etimologia de ERA/ANRA das línguas Kariri, revisitei essa palavra na esperança de encontrar sua etimologia através dessa conexão, e enfim, posso dizer com total certeza qual é o significado de gandil’a ‘casa’ da língua Xokó.


 A palavra é descendente da mesma palavra que resultou em kaduri ‘carregar’ do Xerente, através da evolução de k > g, como visto em gulijó da publicação anterior (*kwə̂r > guli), com evolução de duri > dilya, através de um antigo dyri (y = i grosso do Tupi), que virou diri > dirʲə (mesma lenição de é de *a-waré > a-wêlya) ‘língua’ e porfim diʎə, formando gan-dilya 'carregar.SG', com gan sendo descendente do prefixo de interação física e dilya sendo descendente de duri ‘carregar.SG’. Assim confirmando que os Terejê adotaram a expressão que os Kariri usavam para 'casa', o que é mais confirmado ainda pela etimologia do nome Terejê e Monterejê, que significam 'povo que anda, povo que caminha) (*mõ 'ir.PL' e *tẽr 'ir.SG + -jê 'sufixo coletivo', NIKULIN, 2020)



Fontes: 

Nikulin, Andrey, Proto-Macro-Jê: um estudo reconstrutivo, Brasília, 2020

KRIEGER, W. B; KRIEGER, G. C. (orgs.). Akwẽ mrmẽze–ktâwankõ mrmẽze; ktâwankõ mrmẽze–akwẽ mrmẽze. Dicionário escolar: Xerente–português; português–Xerente. Rio de Janeiro: Junta das Missões Nacionais da Convenção Batista Brasileira. 1994. 118 f.





Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE GULIJÓ DO WAKONÃ


A palavra parece ser cognata direta do Proto-Jê Setentrional *kwə̂r-ĵa 'macaxeira', que é composto de *kwə̂r 'macaxeira' + *ĵa 'caule', indicando para nós duas coisas:


1) A presença da palavra jó 'caule', cognata do PJS.


2) A transformação de /a/ > /ɔ/ (ó aberto) no Wakonã, mesma transformação das língua Kariri, confirmando de vez que o ramo Terejê transformou esse fonema igualmente com a família Kariri, possivelmente sendo este a causa da transformação da vogal.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



terça-feira, 16 de julho de 2024

REAPRENDENDO O PROCESSO DE DERIVAÇÃO ZERO TEREJÊ


Pt.:


 Como falantes de português, temos o costume de presumir que palavras devem seguir uma regragem rígida de afixos derivativos, se olho tem que ser verbo, este perde o sufixo de gênero masculino -o e ganha -ar, virando olhar, assim também é o caso vice-versa. É difícil compreender o sistema de uma língua que não foi descrita com grande exatidão de detalhes, mas com o desvendamento de suas raízes, como feito com mensô ‘pajé’ e sementia ‘menino(a)’, podemos recriar o sistema antigo da língua e replicá-lo fielmente.


 Primeiro, devemos entender que as raizes verbais das línguas Terejê são inflexiveis, isto é, não se conjugam de forma alguma, se eu digo a-çô ‘eu curo’ no Wakonã, também digo o-çô ‘tu curas’, sem modificar o verbo em si, apenas afixando qualquer modificador de forma independente. Igualmente digo çô para ‘curandeiro, médico’, havendo a possibilidade de um modificador que diga que estou falando de alguém com a profissão de curar, como jim çô, lit.: pessoa curar, também posso usar o prefixo genérico de terceira pessoa humana para criar a-çô ‘curandeiro, médico’, e posso usar a terceira pessoa genérica para criar i-çô ‘objeto que cura, medicina’, tudo sem modificar a raiz em si.


 O mais extremo, é claro, é o primeiro exemplo de derivação de agente que dei para o verbo çô ‘curar’, que é çô ‘curandeiro, médico’, tal pode ser aplicado livremente com outros verbos:


cram ‘comer’ > ‘comedor’


ex.: çú cram grigó Nhôcrê ‘Nhôcrê come mandioca’ ou ‘Nhôcrê é comedor de mandioca’


çô ‘ver, enxergar, estudar’ > ‘estudante, observador’


ex.: ta dô Marcu çô cí ‘Marco foi um ornitólogo’ (çô 'estudar' + cí 'ave, pássaro').




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



ETIMOLOGIA DE SEMENTIA ‘MENINO’ E A DESCOBERTA DA PALAVRA PARA MÃE


Pt.:


 Venho reanalisando algumas de minhas propostas etimológicas, decidi rever a palavra sementia ‘menino’ da língua Xokó, notei uma coisa enquanto lia o documento de 2013 de Vasconcelos, onde este analisa o Cayapó do Sul, o ancestral da atual língua Panará.


 A palavra semen-tia é na verdade composta de duas palavras, o verbo semen, que significa ‘acompanhar’, cognato do Xavante tsamarĩ ‘seguir, acompanhar’, enquanto tia é um caso semelhante ao adjetivo kinefa, que não possui cognato dentro das línguas Akuwẽ, mas é retido em outra ramificação das línguas Jê do Cerrado, que é o Panará. No ancestral do Panará, o Cayapó do Sul, existe a palavra tia, que significa ‘mãe’, explicando o significado da palavra semen-tia, que seria ‘aquele(a) que acompanha a mãe’:



Proto-Terejê *tsæmæ(rĩ)-tia ‘aquele(a) que acompanha a mãe, criança, menino, menina’


Xk.: sementya

Nt.: shementia

Wk.: cêmêntia.



Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quinta-feira, 11 de julho de 2024

O ADSTRATO SAPUYÁ-KAMURÚ


Pt.:



 Adstrato é uma palavra que define uma língua B que influencia uma língua A, da mesma forma que as línguas celtas e germânicas influenciaram o português, espanhol, francês e italiano, ou da mesma forma que o cantonês foi influenciado pela língua dos Baiyue do sul da China. O adstrato é sempre percebido como traços de um idioma secundário que afetam de graus variados a língua que elas influenciam.


 No caso do Terejê, vemos sua influência no Dzubukuá e no Kipeá, mas e no Sapuyá e no Kamurú ? O que vemos ? Minha teoria aqui se atrela ao conceito dos caraíbas, sábios nômades que viajaram do norte da América do Sul, isto fica claro em seu título, caraíba, que deriva da mesma palavra que caribe, nome daquele mesmo grupo linguístico que vive naquela região.


 A prova está na palavra que os Sapuyá-Kamurú (Klä) usam para definir seus anciões (Km.: uruno-yà e Sp.: ulané), ambas derivadas da palavra Manáo para ‘homem, humano’ (herenari, yrinály), indicando que um grupo de Manáo migrou da região do Rio Negro, do que hoje constitui a cidade de Manaus, para a Bahia. Note que outra palavra que comprova essa relação é nukibmu ‘cabeça’ do Sapuyá, que corresponde diretamente com o Manáo nu-kibucu ‘minha cabeça’


 É difícil dizer, com a paucidade de dados, mas julgando pela presença direta do pronome nu- da língua Manáo dentro do vocabulário Sapuyá, ao invés da adoção apenas da raiz nominal kibmu ‘cabeça’, talvez indique que os Sapuyá tivessem os pronomes da língua Manáo como um de suas declinações:


Sapuyá:


1ª declinação:


gi-sú ‘meu fogo’

a-sú ‘teu fogo’

e-sú ~ i-ssú ‘fogo dele(a)’ < confirmado por Martius em e-ssuh ‘fogo’ e i-cküh ‘pena’

gi-sú-të ‘nosso fogo (exclusivo)’

ku-sú ‘nosso fogo (inclusivo)’

a-su-á ‘vosso fogo’

e-su-á ~ i-ssu-á ‘fogo deles(as)’


2ª declinação


gi-y-atzá ‘minha pessoa, eu’

a-y-atzá ‘tua pessoa, tu’

y-atzá ‘pessoa dele(a), ele(a)’ < confirmado por Martius em y-atza-mmú ‘parente’

gi-y-atza-të ‘nossa pessoa, nós (exclusivo)’

k-atzá ~ k-atza-á ‘nossa pessoa, nós (inclusivo)’

a-y-atza-á ‘vossa pessoa, vós’

y-atza-á ‘pessoa deles(as), eles(as)’


3ª declinação


gi-tsch-ibayá ‘minha unha’

a-tsch-ibayá ‘tua unha’

tsch-ibayá ‘unha dele(a)’ < confirmado por Martius em tschibaja ‘unha’

gi-tsch-ibaya-të ‘nossa unha (exclusivo)’

k-ibayá ~ k-ibaya-á ‘nossa unha (inclusivo)’

a-tsch-ibaya-á ‘vossa unha’

tsch-ibaya-á ‘unha deles(as)’


4ª declinação


gi-sekó ‘eu urino’

a-sekó ‘tu urinas’

sin-sekó ‘ele(a) urina’ < confirmado por Martius em sinseccoh ‘ele(a) urina’

gi-seko-të ‘nós urinamos (exclusivo)’

ku-sekó ~ ku-seko-á ‘nós urinamos (inclusivo)’

a-sekó-á ‘vós urinais’

sin-seko-á ‘eles(as) urinam’


5ª declinação


tz-u-ká ‘eu amo’ < confirmado por Martius em zucailitoh ‘eu quero’

a-ká ‘tu amas’

s-u-ká ‘ele(a) ama’

tz-u-ka-të ‘nós amamos (exclusivo)’

k-u-ká ~ k-u-ka-á ‘nós amamos (inclusivo)’

a-ka-á ‘vós amais’

s-u-ka-á ‘eles(as) amam’


6ª declinação (Declinação do Manáo)


nu-kimu ‘minha cabeça’ < confirmado por Martius em nu-kibmu ‘minha cabeça’ e também por Martius em nukibucu ‘minha cabeça’ na lista do Manáo

pi-kimu ‘tua cabeça’

li-kimu ‘cabeça dele(a)’

wa-kimu ‘nossa cabeça’

ü-kimu ‘vossa cabeça’

pa-kimu ‘cabeça deles’


Pt.: 


 Outro aspecto que encontrei do Manáo foi o uso de seus sufixos, como na frase zucailitoh ‘eu quero’, onde -ili não deriva do Kariri, e sim do Manáo yry ‘de fato, em verdade’, portanto:


tz-u-ka ‘eu quero’ + -ili ‘é verdade’ (funcionalmente identico ao -idze do Dzubukuá e -idzã do Kipeá) + -tó ‘???’


 Conclui-se aqui que esses fatos levam à consideração de que uma porção dos Manáo do Rio Negro teria migrado para a Bahia e tornado-se parte de um grupo de caraíbas, que espalhavam seu conhecimento na região para os povos locais, explicando assim por que a palavra para ‘homem’ se tornou a palavra para ‘velho, ancião’ nessas duas línguas Kariri.



Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quarta-feira, 10 de julho de 2024

ETIMOLOGIA DE -SHIN DE TATUCHIM (TATUSHIN)


Pt.:


 A palavra tatuchim, desvendada do nome Opara Tatuchim Pôçô Midô¹, possui uma estrutura que é tecnicamente alienígena às estruturas comuns das línguas Macro-Jê, principalmente visto que é um circunfixo que imita perfeitamente a estrutura nominalizadora das línguas Caribe e Kariri, possui tanto essa característica dessas duas famílias, quanto um sufixo que vem dando dúvidas até o presente momento.


 -shin é um sufixo nominalizador, e seguindo a lógica fonética das línguas Wakonã, Xocó e Natú, este deriva do Natú, de um antigo sufixo -tshi(n), sendo o mais interessante a sua proximidade com seu cognato Wakonã -çá, no fato de que ambos derivam de uma consoante sonora que se tornou surda (*-dzé), enquanto o Xocó preserva a estrutura antiga em -dzé (sehoi-dzé ‘chegada’). Portanto é possível concluir que -shin é o sufixo nominalizador instrumental, isto é, o sufixo que cria substantivos relacionados a objetos e lugares:



EXEMPLOS:


n-atu ‘velho’

tatus’in ‘lugar velho, objeto velho’


ca ‘água’

ticas’in ‘lugar/objeto de água, corpo d’água’


cammara ‘cantar’

ticammaras’in ‘lugar/objeto de cantar’


Sugiro que esse sistema seja extendido, para criar novas formas de nominalização:



1) t(i)-...-su ~ t(i)-...-du ‘agentivo’


anêcuña ‘fazer assim’

tanêcuñasu, tanêcuñadu ‘que é assim que se faz’

ex.: wa s’e mê töc tanêcuñadu, anênu nelu ‘eu não vou dizer que é assim que se faz, mas pode ser.’ 


2) t(i)-...-min ‘particípio+gerúndio’


cuña ‘fazer, trabalhar’

ticuñamin ‘aquele(a) que está trabalhando’

ex.: Dzuwan ticuñamin icmö ‘João é quem está trabalhando nisso’


3) t(i)-...-ne ‘particípio-adjetivizador’


dzawi ‘amar, amor’

tidzawine ‘amado(a), querido(a)’

tö du tidzawine adï ‘ele(a) é meu/minha querido(a)’


4) t(i)-...dzä ‘particípio+futuro’


wï ‘ser’

tiwïdzä ‘o que será’

ex.: Tiwïdzä, hä wï… ‘O que será, será’


5) t(i)-...-rë ‘particípio+comitativo’


crï ‘casa, aldeia’

ticrïrë ‘que contém casas, que contém aldeias’




Fontes: 

1: https://kxnhenety.blogspot.com/2024/03/o-nome-indigena-de-porto-real-do-colegio.html



Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



domingo, 7 de julho de 2024

O FOGO DO SER HUMANO


Pt.:


 A palavra Xokó para 'fogo' é tsá, mas também pode ser atsá. Isso é interessante, por que o prefixo a- marca a classe superior, isto é, é o marcador genérico de humanidade, dando o sentido de a-tsá 'fogo do ser humano'. Como explicado graças a Nhenety, o fogo do ser humano é a alma, que resta como uma pequena tocha de fogo quando a pessoa morre, assim havendo essa distinção entre os dois usos de tsá 'fogo (genérico)' e atsá 'fogo do ser humano, alma'.


Fontes.:

Nhenety Kariri-Xocó

LOUKOTKA, Chestmir, Documents et vocabulaires inédits de langues et de dialectes sud-américains, 1963

LACHNITT, Georg, Romnhitsi'ubumro a'uwẽ mreme-waradzu mreme, DICIONÁRIO XAVANTE = PORTUGUÊS, 1987



Autor da matéria: Suã Ari Llusan e Nhenety Kariri-Xocó 



NOVA PALAVRA DO DZUBUKUÁ


 Pt.: 


 wiqui '(grande) jornada'

wi 'ir, viajar' + -qui 'comprido, até lá' = wi-qui 'jornada, grande jornada'


Fontes:

NANTES, Bernardo de, 1896, Katecismo Indico, p. 120.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



sábado, 6 de julho de 2024

A ETNIA KATEMBRI E SUA LÍNGUA


 Pt.:


 Loukotka nos fala sobre três etnias que estavam juntas na missão de Saco dos Morcegos, onde hoje é a aldeia de Mirandela: Masakará, Kariri e Katembri. No primeiro semestre, demonstrei minhas teorias sobre a primeira língua da lista, mas hoje retorno para um tópico que discuti nas minhas primeiras publicações, que é o substrato Katembri.


Dz.:


 Cummea no Loukotka mo witanedique dseho do do coho tiddhuli mo anrabuye Tupan Saco dos Morcegos, moande doihi anrabuye Mirandela: Masacara, Cariri, Catembri. Mo bihe clopatte, hitthocli hiñêmêttea mo bihe wolidze mo cleclebuyette, ibono doihi hitthequie hany wromarâ do himmecli mo bihe tipennea hiadse, do ittattho Catembri.


Pt.:


 Meu argumento na publicação que citei a língua substrato do Katembri, foi que ela era uma língua divergente do tronco Aruaque, tendo mudanças sonoras que tornam difíceis associá-la a qualquer ramo desse tronco, um exemplo é erin-tuca, que possívelmente corresponde ao Proto-Aruaque *li-taky ‘orelha dele’, notam-se nesse caso mudanças radicais da raiz taky ‘orelha’ para tuca ‘orelha’.


Dz.:


 Hiwroñêmê mo tipenne do himmêpemoedhaquicli ittattho Catembri, immoro do coho wolidze timanniccu bewanydzi Arawaqui, dadiwany pewibannahoyâ ticcaccua do pebule ippeandde cunna marâcliboe hendzi coho bewanydzi, bihe itthotte erin-tuca, do do immoronnutte queddeeeddhu ho Arawaquiyedde *li-taky ‘i-beñe’, ubbia mo marâ coho pewibannahoyâ mannibuyea bo immu taky ‘beñe’ ho tuca ‘beñe’.


Pt.:


 Volto novamente a argumentar que o grupo étnico Katembri e sua língua eram Arawak, com os seguintes vocábulos:


Dz.:


Hitthequiebahi wroñêmê do buiho dseho Catembri co wolidze hammuy Arawaqui immorobahi, iddeho cohobbuy immettea:



1) ‘mão’

Katembri: quifi vs Proto-Arawak *kʰapɨ


2) ‘cabelo’

Katembri: idiqui-quetipati vs Proto-Arawak *iti


3) ‘orelha’

Katembri: e-rin-tuca vs Proto-Arawak *(li-)taky


4) ‘teus lábios’

Katembri: bu-quiri vs Proto-Arawak *pɨ-kira


5) ‘tua língua’

Katembri: bu-niqui vs Proto-Arawak *pɨ-nika ‘tu comes’


6) ‘prefixo afirmativo, variante 1’

Katembri: QUI-ti-pati vs Proto-Arawak ka-


7) ‘cabeça 1’

Katembri: qui-TI-pati vs Proto-Bolívia *tʊ-ti


8) ‘cabeça 2’

Katembri: qui-ti-PATI vs Proto-Bolívia *-paki


Portanto: quitipati ‘é/tem cabeça’


9) ‘prefixo afirmativo, variante 2’

Katembri: CO-quibi vs Proto-Arawak *ka-


10) ‘lavar’

Katembri co-QUIBI vs Proto-Bolívia *kipa


Portanto coquibi ‘é (para) lavar’ (necessita de segunda averiguação, também pode ter relação com o Proto-Japurá-Colômbia *-iʔiwa, cujo também necessita explicar a presença do k- em quibi)


11) ‘teu ombro’

Katembri: pu-fixié vs Proto-Mamoré-Guaporé *pike ‘pescoço’


 A evolução de ‘pescoço’ para ‘ombro’ é facilmente explicada pela proximidade das duas partes do corpo. Comprovando aqui a origem de f em antigos *p, processos de palatalização, possivelmente causados por vogais altas e deafricação (ké > kié > txié > xié).


12) ‘floresta’

Katembri: sequieifi vs Proto-Mamoré-Guaporé *jɔkɨ-ki ‘madeira’


Apesar de eu ter escolhido a proto-língua do lado direito, eu creio que haja mais proximidade fonética com seus descendentes, como o Paunáka (jɨkɨ-ke), Paikonéka (tʃaki-se) e Bauré (jaki-se), as vogais desse explicariam o alçamento vocálico de a > e, enquanto a sílaba -ke no final explicaria o -fi do final, cujo será comprovado pelo próximo argumento.


13) ‘chuva, chover’

Katembri: ifó, in-hó vs Proto-Mamoré-Guaporé *ɨko


 Creio firmemente, graças às duas evidências da evolução dessa palavra, que o Katembri passou por dois processos fonéticos diferentes. O primeiro transformou k (possivelmente só intervocalicamente ?) em h, portanto yko > iko > iho (/ixɔ/). O segundo transformou o h em possível variação livre no fonema ɸ, um sopro que se assemelha ao f do português, mas que usa os lábios. Tal mudança é vista nas línguas japônicas e também na evolução da palavra rough do inglês, que ganhou um som de f onde havia o fonema /x/.


Fontes:

BANDEIRA, Maria de Lourdes, Os Kariris de Mirandela: Um Grupo Indígena Integrado, 1972

https://pt.wikipedia.org/wiki/Protoaruaque

https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADnguas_mamor%C3%A9-guapor%C3%A9#Reconstru%C3%A7%C3%A3o

https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADnguas_japur%C3%A1-col%C3%B4mbia#Reconstru%C3%A7%C3%A3o.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



CORREÇÃO DA ETIMOLOGIA DE AVÊL'A 'LÍNGUA' DO XOKÓ


Pt.:


 A palavra avêl’a, que significa ‘língua’ no idioma do povo Xokó, até o presente momento vem sido um problema, eu argumentei no passado que este deriva da mesma raiz que nos trouxe o bêlêtsiê ‘falar’ do Wakonã, prefixado com a- da classe superior da língua.



Xk.:


 Wêlêdzë awêlya, tipilyatsim ‘awêlya’ ma awêlya Tseocö, dö pri crihö tsina tsu câtsa, wa to ñêmêwê ma c’eñe dö wadö cahô bö widibba banaccö wammü bêlêtsiê ‘wêlêtsye’ bö Wakonam, ticradabawatsitsim tsu a- yaccömage bö awêlya.


Pt.:


 No entanto, por conta de minhas dúvidas passadas sobre a etimologia anterior, eu busquei novamente dentro dos dicionários das línguas primas do Terejê, o Xavante e o Xerente, e encontrei, no dicionário de Lachnitt, a palavra waré ‘fino e longo, solto, sem parar’, que descreve perfeitamente a língua, ainda mais com o prefixo de classe superior atrelado, dando o sentido de a-vêl’a ‘coisa humana fina e longa’, portanto concluo que esta é sua etimologia definitiva.


Xk.:


 Awabanna, dï we tsiwêlyam adï ma we tsimiwadö dï wêlêdzë, wa to ñoprëdë clö rowêlêñêmêdzë awêlya tsiwadi Têrêge, Tsawante cö Tserente, cö to widdë ma rowêlêñêmêdzë dï Lachnitt, wêlêdzë waré ‘c’inefa cö c’ipri, bawatsiccö, titodiccötsim, tiwêlêrobëtsim hay ma awêlya, cahôc’yöhö tsu cradabawatsi yaccömage tiñoprëtsim, mim sô pilya a-wêlya’ ‘gemarâ wêlya’, ibana wa to dzadzö dö tsimiwadö dï wêlêdzë accömannêlya tsu cahô.



Fontes:

LACHNITT, Georg, Romnhitsi'ubumro a'uwẽ mreme-waradzu mreme, DICIONÁRIO XAVANTE = PORTUGUÊS, 1987

LOUKOTKA, Chestmir, Documents et vocabulaires inédits de langues et de dialectes sud-américains, 1963.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



sexta-feira, 5 de julho de 2024

ETIMOLOGIA DA SERRA CARIRIS VELHOS E A SERRA DE BODOPITÁ


Pt.:


 Em acordo com o documento "Arqueologia no Médio Rio São Francisco" de Jacionira Coêlho Silva de 2003, a Serra Cariris Velhos possuía o nome de Bodopitapi, nome este diretamente comparável com a Serra de Bodopitá, ambas contendo a palavra Dzubukuá boeddo 'serra, monte' e pitta 'rede', com o primeiro nome contendo -pi que é o adjetivo Kariri para 'pequeno', assim diferenciado as duas como Bodopitapi 'Serra da Rede Pequena' e Bodopitá 'Serra da Rede'


Sp.:


 Tah iwiticañicanglilleh ittehoh “Arqueologia no Médio Rio São Francisco” tonraram poh Jacionira Coêlho Silva, 2003, Itzohoh Bontoh Cariris Velhos itzeh Bodopitapih sammüh, titzeh tiñêmwiticañilli ittehoh Bontoh Bodopitah, wam’ywiticañi succroh Tzupukuah simmelleh boeddo ‘bontoh’ coh pitta ‘pittah’, tatitzohoh ittehoh gëboh tzeh -pih tah immêppuh Tzogho ‘puppüh’ sam’y, immoroh tatipanna wacañi monoh Bodopitapi ‘Bontopittapüh’ coh Bodopitah ‘Bontopittah’



Legenda: 


Pt = Português

Sp = Sapuyá



Fontes: COÊLHO SILVA, Jacionira, Arqueologia no Médio Rio São Francisco, 2003.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



PADRONIZAÇÃO DAS PUBLICAÇÕES A PARTIR DE AGORA


Pt.:


 Hoje discutirei o modelo que irei usar para prosseguir adiante, para tornar mais consistente e coerente as minhas publicações, venho estudando isso lentamente e publicando alguns formatos diferentes, para encontrar um que me satisfaça, finalmente cheguei à uma conclusão que me satisfaz.


Dz.:


 Himme doihi bunnette di do hithu hany wi coibbe di, ñattemanhem dicclowanyli co dibboeli tipennea hiadse hany, doro dadinenewi coho do iwobuppitte co daditipenne marâppi bunnettea banahoyâ, widde bihè dipecangrili hiay, do icclutte hitthecli mo ilambuytte dipecangrili hiay.


Pt.:


 Primeiro irei escrever em português, já que somos majoritariamente falantes de português, mas para manter o engajamento das línguas indígenas, seguirei o modelo que chamo de A-B-A-B, onde A é a língua portuguêsa e, logo abaixo, B representa a língua indígena no qual desejo escrever naquele momento. Por ser minha língua nativa e a primeira que aprendi, optarei normalmente pelo Dzubukuá, mas farei grande esforço para variar o máximo possível com o passar do tempo. 


Dz.:


  Do ibihètte hiclecle mo wolidze caraí di, noli cadsea do iwiddotte dimmeli wolidze caraí, ibono, hany ne uccatte wolidzea dsehoa, hitthu bunnette diccali hiña A-B-A-B, moande A wolidze caraí co, bidzecro B wolidze dseho didanlanli clecle hany hiña mo cloiho coho. Noli wolidze danrali hiadse co bihè wolidze dimuyqueddeli hiña, hitayettaddi do icloyette bo Dzubucua, ibono hiñatteddi crodsebuye hany marâyebuwiddoiho iddeho iwi cloiho.


Pt.:


 Logo abaixo, caso necessário para o texto que estarei escrevendo, citarei a fonte ou fontes das quais usei para falar sobre o assunto ou que possam ajudar a compreender o assunto falado. O modelo também será mais sucinto, optarei por passar a informação de forma compreensível, mas também abreviada, para não criar um texto muito grande. Quando não houver essa opção, dividirei em partes menores. Também optarei pelo uso de imagens quando possível, para guiar o leitor.


Dz.:


 Mo icclo, no wecco no icleclette didadiclecleliddi hiña, himmettô hebbedzu boho, hebbedzua boho bo do ditthuli hiña hany me mo marâ boho, do wrihônedsonnu cunna marâ dimmeli. Buppiihoddi bunnette dehem, hitayettaddi bo pemanhem marânedso do inedsôñette, co dipebuppili daham, hany ñinhoquie icleclettebuyeiho. No wanyquie tayettatte coho, hidsatteddi mo wañubadsam-a buppi. Hitayettaddi bo itthu idzodzoa no moronnu daham, nanhe dinneli hany.



Fontes: 

QUEIROZ, 2012; Um Estudo Gramatical da Língua Dzubukuá, Família Karirí.

NANTES, 1709; Katecismo Indico da lingua Kariris.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



quarta-feira, 3 de julho de 2024

A TRANSIÇÃO PARA O KARIRI QUE CONHECEMOS


O Kariri que conhecemos é fruto da constante interação de um povo Macro-Caribe com povos Macro-Jê, formando a etnia atual.


 Existem estágios que caracterizam a migração do Maracaibo até o Nordeste, mas só temos conhecimento detalhado de um minúsculo espaço de tempo na linha histórica dessa nação. Podemos, no entanto, implicar que em algum momento da transição, houve um processo em que os Kariri assimilaram a regra de distinção binária entre consoantes nasais e orais, advinda do Macro-Jê.


 É a distinção que também é vista no Tupi, entre mb vs m, nd vs n e ng vs ŋ (g), onde o primeiro grupo surge perante vogais orais e o segundo grupo perante as nasais. Como podemos ver através das duas palavras radda 'terra' e be 'testa, borda, margem', que em algum momento, perderam sua qualidade nasal e se tornaram algo como *raⁿda e *ᵐbe, derivados de antigas formas ainda encontradas em seu estágio prévio nas línguas Carib, como *rono 'terra' e ame-py 'testa' .




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



A VERDADEIRA ETIMOLOGIA DE ELIDZE


 Queiroz presumiu que elidze significava 'estar escuro', mas não há evidência clara de que tal fosse seu significado. O problema aqui é elidze não possui nenhum uso fora do que vimos em uma marcação de tempo:


elidze-caya 'dali às três horas'


 Eu fui buscar nas línguas aparentadas da família Kariri, especificamente, o ramo central do tronco Carib, onde na língua de mesmo nome (Carib ou Galibi), tem-se a seguinte palavra:


arije 'fronteira, margem, limite', cujo também possui a forma erijety (forma possessiva)


 Assim, é possível traduzir elidzecaya como 'fronteira da noite', 'margem da noite', 'limite (antes) da noite'.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan 



segunda-feira, 1 de julho de 2024

DESCOBRI A ETIMOLOGIA DE 'CASA' DO KARIRI (ERÀ / ANRA)


 A palavra para casa do Kariri vem esquivando uma determinação etimológica por um tempo, pois ela não apresenta traços do Macro-Jê, visto que nada bate com as reconstruções mais recentes (NIKULIN, 2020), portanto eu já havia eliminado essa possibilidade e decidido buscar nas línguas Carib.


 Também, em 2022 e 2023, não tive sucesso em determinar sua etimologia, visto que nenhuma palavra para casa daquelas línguas correspondia, o problema aqui é que eu estava pesquisando seu significado sem levar em consideração o contexto em que o conceito 'casa' estava inserido.


 Veja que, nos contos mais antigos da nossa nação, os Kariri se originaram de um lago sagrado no norte (muito possivelmente o o lago Maracaibo), portanto logo na história de origem, vemos que o povo Kariri é um povo migratório, que andou do norte até o ponto mais leste das Américas. Se esse é o caso, não seria adequado que casa deixasse de ser, após décadas, possivelmente séculos de migração, um conceito de um objeto fixo, e sim virar um conceito de um objeto móvel ? O que argumento aqui é que 'casa' e 'acampamento' viraram o mesmo conceito na nação Kariri, portanto 'casa' deriva de um verbo cognato do Proto-Carib *arô 'tomar, levar, carregar', pois os assentamentos Kariri não eram permanentes durante o período dessa grande migração.




Autor da matéria: Suã Ari Llusan